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O quinto momento do jogo? Quantidade não significa qualidade. E ainda… o exemplo do Futsal.

“(…) não será o instante após os lances de bola parada o momento de maior desorganização e instabilidade táctica nos jogos?”

(Filipe de Sá, 2012)

Diferentes visões e formas de pensar levam a diferentes interpretações da realidade, e consequentemente… do jogo de Futebol. Nada de novo. Perfeitamente normal e saudável porque potencialmente são colocadas questões e o debate surge. No “final do dia”, uma das melhores formas de promover evolução.

Deste modo, diferentes formas de entender o jogo conceberam diferentes modelos e sistematizações do mesmo. Uma das questões emergentes surge sobre o enquadramento das situações de bola parada. Nos respectivos quatro Momentos do Jogo? Ou serão elas, por si só, um quinto momento?

Em 2017 publicámos uma proposta que as integravam nos quatro Momentos do Jogo. Não por mero gosto pessoal, mas por coerência com determinada linha de pensamento. Um livre ofensivo, por exemplo, pode ser marcado rapidamente ainda em Transição Ofensiva quando o adversário ainda não recuperou a sua Organização Defensiva possibilitando a equipa que dele beneficia, contra-atacar. Mas pode também ser executado em Organização Ofensiva, caso a equipa defensora tenha recuperado a sua Organização Defensiva. Aprofundando este caso, o mesmo pode ainda estar enquadrado num sub-momento de Construção caso a situação não permita um último passe ou cruzamento para outro atacante (com interessante potencial de sucesso), num sub-momento de Criação caso exista essa possibilidade, ou de Finalização quando a situação permita o remate à baliza. No entanto, este enquadramento parece não ser justificação suficiente para integrar as situações de bola parada nos quatro Momentos do Jogo. Pode-se argumentar , por exemplo, que um quinto momento também possa ser subdividido dessa forma. Torna a perspectiva mais confusa e complicada (não confundir com complexa), mas pode.

A grande justificação para as situações de bola parada fazerem parte dos quatro Momentos do Jogo está na realidade, essa sim… complexa, do jogo. Ora, se um dos princípios basilares do pensamento complexo passa por uma visão holística do objecto de estudo, e que ao invés, a sua separação em partes fá-lo perder propriedades, então, se as situações de bola parada são na mesma… jogo, separá-las do restante jogo levará a disfunções, desarticulações e potenciais erros por desenquadramento do jogar da equipa nas necessidades reais desses momentos. Maior quantidade de Momentos do Jogo não significa maior qualidade da ideia que dele se tem.

“À medida que você tem o domínio da “totalidade” das coisas, passam todas essas coisas a ser preocupação para si!”

Vítor Frade citado por (Xavier Tamarit, 2013)

Por diversas vezes trouxemos o Princípio da Articulação de Sentido que se manifesta de múltiplas perspectivas no jogo e no seu treino. Neste caso referimo-nos à articulação de sentido entre os diferentes Momentos do Jogo. Hoje é praticamente unânime entre treinadores a fundamental importância da articulação entre os momentos ofensivos e defensivos, ou seja, a importância de se preparar a perda da bola quando se está a atacar e preparar o ganho da mesma enquanto se defende. Então será que as situações de bola parada também não devem contemplar esse provável futuro imediato? Certamente que sim e hoje, praticamente todos os treinadores, têm essa preocupação.

Sendo assim, deverão fazer parte de um dos quatro Momentos do Jogo, porque por exemplo, no caso de perda ou ganho da bola, a equipa tem seguidamente outro momento diferente do jogo para resolver. Desse modo, pode e deve, começar a resolvê-lo durante a bola parada. Por exemplo, através de determinados posicionamentos de alguns jogadores. A visão do quinto momento, é no fundo outra visão segmentada, analítica e artificial do jogo que se distancia da natureza do todo que o mesmo contempla.

“E estes equilíbrios passam por quando nós estamos a atacar num lance de bola parada, deixamos um ou dois jogadores fora da área para tentar criar superioridade numérica em função dos jogadores que estão na frente, isto significa que a equipa quer estar equilibrada, não só dos jogadores que estão dentro mas também nos espaços a preencher, porque nós quando temos a bola e quando vamos marcar um canto, podem acontecer algumas coisas… Pode acontecer golo evidentemente, mas também podemos perder a posse de bola, e nós temos que estar preparados para essa perda da bola. E esses equilíbrios, neste caso no processo ofensivo e no equilíbrio de transição defensiva são fundamentais.”

Carlos Carvalhal citado por (Pedro Bessa, 2009)

O segundo golo da República da Coreia contra Portugal começa precisamente na falta de consciência para esta articulação entre um momento de Organização Ofensiva, especificamente um canto ofensivo, com o momento seguinte de Transição Defensiva. Não temos acesso à Ideia nem ao Plano de Jogo, especialmente às bolas paradas, portanto não podemos nem é nosso objectivo apurar responsabilidades, muito menos individuais. Mas sim reforçar a fundamental importância de uma visão macro e pensamento complexo sobre o jogo, neste caso, quer ao nível da articulação de princípios / comportamentos, mas por outro lado, também ao nível do seu detalhe.

Num momento inicial, havia na nossa opinião, um equilíbrio defensivo razoável para defender uma eventual perda ou segunda bola proveniente do cruzamento. Cancelo mais perto da bola, William ao meio e Dalot mais atrás junto ao grande círculo, podendo-se questionar o seu afastamento dos companheiros por não haver na sua zona nenhum coreano e por assim perder a relação de cobertura aos companheiros mais próximos da bola. E havia ainda Bernardo, do lado contrário também fora da grande-área. Todos para apenas dois coreanos, muito baixos até. Son perto da bola e Hwang Hee-chan, que viria a marcar o golo, perto da marca de grande penalidade. Mas como não nos cansamos de repetir, a quantidade não significa qualidade. Neste situação, qualidade comportamental, mais especificamente, posicional.

Equilíbrio defensivo no canto para Portugal.

O problema é que Cancelo deslocou-se para junto da bola para possibilitar a marcação de um canto curto e os companheiros não ajustaram o seu posicionamento para rectificarem o equilíbrio defensivo e garantirem não só cobertura ofensiva / defensiva à zona da bola, como ocupar o espaço fora da grande área onde uma segunda bola proveniente de uma intercepção dos defensores teria mais probabilidade de surgir dada a orientação corporal dos mesmos na defesa do pontapé de canto. William ter-se deslocado para a zona onde anteriormente se encontrava Cancelo seria a solução mais lógica, com Bernardo a aproximar-se mais do eixo central do campo. Arriscando mais, outra alternativa seria aproximar Dalot, ocupando o espaço deixado livre por Cancelo.

Nenhuma das soluções, ou outra, sucedeu para garantir o equilíbrio defensivo. Surgiu a tal segunda bola naquele espaço e Son teve a possibilidade de receber enquadrado e conduzir o contra-ataque. Ou seja, por erros posicionais, não tivemos comportamentos fundamentais do primeiro sub-momento da transição defensiva, como pressionar imediatamente a bola, garantir contenção ao adversário com bola e cobertura defensiva à eventual contenção.

Depois, e evitando ir ao plano do detalhe, após a Recuperação Defensiva, podemos analisar um terceiro momento da Transição Defensiva. A Defesa do Contra-Ataque adversário. Ainda na Recuperação Defensiva, com Son em condução numa situação de 1×1 contra Dalot, o português, bem, recuou em contenção e temporizou, possibilitando a recuperação defensiva de mais companheiros. E desta forma permitiria também assegurar a cobertura defensiva do seu Guarda-Redes. No geral, neste Sub-Momento, o objectivo passa por conquistar uma relação numérica mais confortável para posteriormente resolver a situação. E tal objectivo foi conseguido. O problema, novamente, é que a quantidade não significa qualidade. E se o entrosamento e as relações comportamentais no campo não estiverem bem claras, mais jogadores em determinada situação, podem mesmo significar menos qualidade dada a relação / interferência que as partes fazem entre si, nesse todo circunstancial. O todo não é sempre mais que a soma das partes. O todo, é sim, diferente da soma das partes.

No Sub-Momento da Defesa do Contra-Ataque, em que os defensores devem travar e obrigar o atacante com bola a uma decisão, gerou-se confusão. Dalot, Palhinha (que podia ter decidido falta táctica antes) e William procuram garantir a contenção e eventual desarme. Tal gerou indefinição entre os três permitindo espaço e consequente, tempo, para Son, no timing certo, realizar o último passe para Hwang, que, perseguido por Bernardo, entretanto se juntou ao contra-ataque garantindo uma solução de ruptura para beneficiar do espaço entre os defensores e o Guarda-Redes português. O qual, perante a condição de Son, a sua linguagem corporal e a eminência de desmarcação de ruptura de Hwang, parece-nos muito distante dos companheiros.

Situação de 2×4+GR bem resolvida pelos coreanos, mas evidentemente mal pelos portugueses. Dada a natureza de oposição / cooperação do jogo será sempre assim em todas as situações? Provavelmente. Porém, sempre em doses diferentes de responsabilidade entre atacantes e defensores, tendo em conta o conhecimento do jogo que detêm e o entrosamento que manifestam.

Em situações similares, aumentar a probabilidade de êxito defensivo seria manter o mesmo jogador em contenção para não permitir o tal espaço e tempo ao atacante com bola. E os restantes defensores que consigam recuperar defensivamente garantirem uma linha de cobertura ao companheiro. Neste caso, com a bola mais próxima do corredor lateral, Palhinha, William e posteriormente Bernardo deviam estar em linha de cobertura por dentro. Caso o adversário com bola se situasse mais perto do eixo central do campo, a linha de cobertura deveria garantir cobertura a ambos os lados do defensor em contenção. Outros comportamentos adicionais a assegurar passariam pela linha de cobertura / última linha travar na linha limite da grande-área com a contenção à sua frente para forçar a decisão do atacante com bola, e não no melhor timing para si. Por outro lado, o Guarda-Redes assegurando uma maior agressividade sobre o espaço à sua frente, garantiria assim uma segunda cobertura defensiva, neste caso à última linha, de forma a antecipar o potencial último passe adversário. E mesmo que não conseguisse a intercepção, reduziria em muito o espaço e tempo de decisão e finalização ao atacante em ruptura. No plano do detalhe poderíamos falar em apoios, distâncias, indicadores de pressão para desarme, etc., mas ficamo-nos pelo plano dos grandes princípios.

Naturalmente, este conhecimento e entrosamento é alcançado mais rapidamente com treino. Treino, que escasseia num contexto de Selecção Nacional. Mas perguntamos, generalizando… mesmo no contexto dos clubes treina-se o suficiente ou sequer se treinam estas situações? No Futsal são comportamentos que se treinam ao detalhe e até à “exaustão”. É factual que nesse jogo são situações que sucedem em muito maior volume do que no Futebol, porém, os resultados são também mais dilatados. É possível que no Futebol, uma equipa seja apenas submetida uma única vez ao Sub-Momento de Defesa do Contra-Ataque ao longo de um jogo inteiro, e sem qualquer previsão da relação numérica aí encontrada. Porém, se a conseguir resolver com sucesso, poderá fazer toda a diferença no resultado final como sucedeu no República da Coreia x Portugal. Uma vez mais… quantidade não significa qualidade.

“Defender com poucos é uma arte, implica treino, coordenação e princípios, mas fundamentalmente todos perceberem o que deve ser feito, de forma a que quem chega mais rápido, seja ou não “defesa”, saiba o que está a fazer e o posicionamento correto a ocupar, consoante a bola, o colega e o adversário!”

(Ricardo Galeiras, 2018)

O “Aursnes” de Schrödinger. Defender a atacar.

“(…) a consciência de que a expressão tática assume uma importância capital nos jogos desportivos, fez com que, a identificação de regularidades reveladas pelos jogadores e pelas equipas, no quadro das acções colectivas, tivesse despontado enquanto nova tendência de investigação (Gréhaigne, 1989; Lloret, 1994, citado por Garganta, 2001; Hernandez Mendo, 1996, citado por Garganta, 2001; Garganta, 1997). Neste sentido, a maioria dos analistas procuram detectar e interpretar a permanência e / ou ausência de traços comportamentais na variabilidade de acçoes de jogo (McGarry & Franks, 1996, citados por Garganta, 2001).”

(Gil, 2012)

Após o jogo contra o PSG, os elogios ao Benfica de Roger Schmidt foram alargados, em particular à sua estratégia para o jogo, nomeadamente a escolha de Fredrik Aursnes para a função de Médio-Esquerdo. Porém, muitos de nós temos a noção que se o Benfica perdesse, criticas haveriam surgido, porque teria existido medo dos franceses, porque o jogador não teria características para a função, que lhe faltariam argumentos ofensivos para o papel em causa e como tal não iria apresentar o rendimento necessário à função. No entanto, “jogar no Totobola à segunda-feira” é sempre fácil. O sucesso de Rúben Amorim na aposta em Antonio Adán para o jogo no Santa Clara após a infelicidade do espanhol no jogo em Marselha, e em contraposição a situação de Ricardo Esgaio após o jogo contra os franceses em Lisboa, podem ser outros exemplos.

Para quem está de fora do processo, perceber o impacto real que as decisões da equipa técnica terão no resultado de qualquer jogo será sempre um exercício inatingível, tal como o paradoxo do Gato de Schrödinger. Até o observador “abrir a caixa”, ou seja, até ao apito e resultado final, para o espectador o “gato pode estar vivo e morto”, ou seja, o sucesso de qualquer decisão pode ou não acontecer. Um fenómeno complexo e não determinístico como o Futebol trará sempre essa incerteza. Caso contrário não existiriam casas de apostas, e mais importante, as pessoas não sentiriam a atracção que sentem pelo jogo. Sublinhamos… jogo.

À partida e mesmo à posteriori, várias análises referiram o que eventualmente emergiria como mais evidente. Sendo a função original de Aursnes, Médio-Centro e um jogador com maior foco em princípios de cobertura, equilíbrio e concentração, seria expectável defender que ele viria aportar maior qualidade defensiva à equipa, por exemplo, no fecho dos espaços, na agressividade defensiva, no cumprimento das coberturas e compensações, na protecção ao colega de corredor e aos dois médios-centro. Porém, o próprio, em declarações no final do jogo, acrescentou outra perspectiva ao seu papel no jogo. Que o mesmo teria o objectivo de ter um peso ofensivo fundamental, principalmente pela forma como poderia gerir a bola e dar critério à posse do Benfica. Não só como forma de atacar, mas também de defender.

O pensamento reflecte um princípio fundamental da realidade, e como tal, extensível ao jogo de Futebol. O princípio que Vítor Frade denominou como Inteireza Inquebrantável”. Neste caso a inquebrantável relação do todo – jogo de futebol – traduzida nos seus respectivos momentos e sub-momentos. Tal relação deverá ter por base uma visão complexa do jogo de forma a que este seja pensado com uma articulação de sentido, como o próprio Frade e também Jorge Castelo sustentam. Para (Jorge Castelo, 1996) “deriva da concordância organizativa entre o método ofensivo e defensivo e aplicado pela própria equipa. Com efeito, é necessário que os pressupostos fundamentais de um dos métodos não ponha em risco de forma irredutível a aplicação dos pressupostos de eficácia do outro. Neste sentido, a equipa deverá jogar num bloco homogéneo e compacto não só na aplicação isolada de cada um dos métodos pré-estabelecidos, mas também na transição de um para o outro método por forma que não haja quebra na continuidade do processo ofensivo ou defensivo”. Na mesma linha de pensamento surge (Julian Tobar, 2013) sustentando que a articulação de sentido torna-se “um imperativo para o sucesso de uma equipa, visto que se perdermos de vista o “todo” (leia-se o jogar) que se pretende, desarticulando uma “parte” das demais, certamente isso refletir-se-á no jogar da equipa. Portanto o treinador ao modelar o seu jogar deverá ter em conta justamente isso, a interligação e a congruência de tudo para o “todo””. Ainda Tobar, estabelecendo uma comparação e citando “Conde (2010), seria possível dizer que a organização defensiva, a organização ofensiva e as transições são como as rodas de um carro: devem rodar simultaneamente”.

Deste modo, perante uma equipa com jogadores incríveis com bola, retirar-lhes a mesma, seria potencialmente de facto uma boa estratégia para os defender. Para mais quando muitas vezes essa equipa defende com apenas GR+8 e até GR+7 atrás da linha da bola, com uma última linha de 5 jogadores dificultando a pressão e recuperação da bola à segunda linha de apenas 2 médios e ainda quando os que ficam à frente da linha da bola têm pouca disponibilidade para o momento defensivo, nem mesmo para o fecho das coberturas ofensivas do adversário, o que consequentemente permitirá que este circule a bola por trás conseguindo assim tirar com alguma facilidade a bola de zonas de pressão. Juntando-se a não imperativa necessidade do Benfica em vencer o jogo e podendo assim dar maior critério à sua posse no sentido de a manter, arriscando menos a progressão e nos sub-momentos de criação, a escolha de Aursnes, foi deste ponto de vista, uma ideia de facto interessante.

Importará dizer que nem a equipa técnica conseguirá pré-determinar se o “gato está vivo ou morto no interior da caixa”, ou seja, se a opção tomada irá ou não resultar até o jogo de facto se consumar. No entanto, tendo em conta o seu conhecimento e experiência, nomeadamente a específica relativa à equipa, aos jogadores, às suas características, à sua mentalidade, ao seu momento, à forma como treinam, como estarão as suas vidas pessoais, etc., será com certeza a mesma, quem estará mais perto de se aproximar da predição do resultado da “experiência”. Contando que, surgirão sempre imponderáveis, e irão errar e tomar opções que não irão resultar. Pois recordamos que… estamos perante um acontecimento não determinístico.

Finalizando, o interessante para nós não foi se o “gato viveu ou morreu”, mas sim a lógica da intencionalidade de Roger Schmidt e o que de facto Aursnes provocou ao jogo do Benfica, e em contraposição ao jogo do PSG. Claro que se o jogo se voltasse a repetir, as condições iniciais seriam irrepetíveis e o resultado (do desempenho) individual de Aursnes e colectivo, poderiam ser drásticamente diferentes. Mas interessando-nos encontrar lógicas, e se possível padrões, podemos então ganhar experiência para problemas similares no futuro, tendo sempre a consciência, como sublinhado, que nada se repetirá integralmente. Tendo por base esta consciência, por outro lado encontrar padrões e reforçar a sua bagagem ao nível do Conhecimento do Jogo deverá ser o papel do treinador e dos que queiram analisar o jogo e o desempenho das equipas de forma séria e honesta.

“No nosso entendimento, o jogo de Futebol é fluído na passagem do processo ofensivo para o defensivo e vice-versa, requisitando uma organização de jogo unitária, articulada em função do «todo» que se deseja, pelo que se possa afirmar que “… não há nada mais construído que o jogar. O jogar não é um fenómeno natural, mas construído” (Frade, 2002, in Amieiro, 2004:115). Para uma análise do jogo sem que lhe seja destruída a sua organização dinâmica indissociável, consideramos necessário que se entenda que apesar de serem antagónicos, processo ofensivo e defensivo estão em íntima relação, já que, tal como a luz e a sombra, o preto e o branco, também esses dois processos só podem ser conhecidos um em função do outro (Teodorescu, 1984; Bayer, 1994; Queiroz, 1986; Castelo, 1994; Garganta, 1996).”

(José Laranjeira, 2009)

A saída de jogo do Guarda-Redes. Curta ou longa, ou aberta ou fechada? E eventuais tendências evolutivas. III

Noutra perspetiva, esta forma de resolver a saída de jogo do Guarda-Redes, transmitiu uma mensagem de coragem para dentro e para fora. Como um dia Matt Busby referiu, o Futebol tinha-se tornado “um jogo de medo”, e contribuições como a de Guardiola, do ponto de vista emocional, puxaram o jogo para outra dimensão e dessa forma, acabaram por influenciar terceiros. No entanto, analisar esta emocionalidade desligada de algumas razões organizativas descritas acima, estratégicas, ou mesmo de questões em torno do desgaste que o jogo, e que cada jogar, provocam… é um constante erro do pensamento cartesiano. Estamos perante a procura de uma eficiência… que é táctica… e que nessa perspectiva provocará reflexos que se manifestam do ponto de vista técnico, físico e psicológico. Tentar compreendê-la ou transmiti-la apenas do ponto de vista de uma destas dimensões, apresenta-se como perigosa para o Todo… Táctico. E essa foi talvez a principal razão para que esta acção de jogo, nomeadamente na sua expressão de “saída curta”, tenha sofrido más interpretações e deturpações nos últimos anos. Sendo assim, esta é também mais uma razão que nos leva a reflectir sobre o tema.

A saída de jogo do Guarda-Redes. Curta ou longa, ou aberta ou fechada? E eventuais tendências evolutivas.

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A saída de jogo do Guarda-Redes. Curta ou longa, ou aberta ou fechada? E eventuais tendências evolutivas.

“O que ele terá sempre de fazer é ter calma, é não se precipitar. Porque se ele não está pressionado, então é como outro jogador qualquer noutra zona do campo. Calma, deixa-te estar. Porquê? Porque compete aos colegas movimentarem-se no sentido de proporcionarem um homem livre, uma solução de passe. Claro que nem sempre se decidiu bem, mas essas dinâmicas de movimentos permitem encontrar linhas de passe mais próximas, mais longe, mais à largura, mais dentro do adversário, mais às costas das defesas…”

(Miguel Cardoso, 2018)

As acções de jogo decorrentes da situação de saída de jogo do Guarda-Redes valorizam-se e vulgarizaram-se nos últimos anos. É certo que ao longo da história do jogo muitas equipas já faziam desse momento uma marca forte do seu jogar, no entanto parece-nos claro que o Barcelona de Guardiola, foi até hoje, a equipa da história do jogo que deu o maior impacto à acção. Isto porque tratou-se, naquele momento, de um fundamento importante no seu jogo uma vez que a “saída curta” permitia, entre outras coisas, desde logo, privilegiar o jogo curto e apoiado, manter a bola controlada, o bloco junto e uma consequente chegada, também junta, do mesmo à baliza adversária. O tal “viajar juntos” que Sampaoli descreveu. O autor (Amieiro, 2oo9) enalteceu na equipa “o modo como recusa cair na tentação do pontapé longo”. Por outro lado, na articulação de sentido que o jogo proporciona, esta coesão, trará reflexos aos momentos de jogo subsequentes. Na Transição Defensiva, a equipa irá desta forma garantir uma concentração defensiva que aumentará as probabilidades de sucesso numa eventual tentativa imediata de recuperação da bola. Ou então, no momento subsequente, perante a sua reorganização defensiva mais rápida e mais alta no campo, permitirá à equipa pressionar com todo o seu bloco, num posicionamento colectivo mais alto.

Noutra perspetiva, esta forma de resolver a saída de jogo do Guarda-Redes, transmitiu uma mensagem de coragem para dentro e para fora. Como um dia Matt Busby referiu, o Futebol tinha-se tornado “um jogo de medo”, e contribuições como a de Guardiola, do ponto de vista emocional, puxaram o jogo para outra dimensão e dessa forma, acabaram por influenciar terceiros. No entanto, analisar esta emocionalidade desligada de algumas razões organizativas descritas acima, estratégicas, ou mesmo de questões em torno do desgaste que o jogo, e que cada jogar, provocam… é um constante erro do pensamento cartesiano. Estamos perante a procura de uma eficiência… que é táctica… e que nessa perspectiva provocará reflexos que se manifestam do ponto de vista técnico, físico e psicológico. Tentar compreendê-la ou transmiti-la apenas do ponto de vista de uma destas dimensões, apresenta-se como perigosa para o Todo… Táctico. E essa foi talvez a principal razão para que esta acção de jogo, nomeadamente na sua expressão de “saída curta”, tenha sofrido más interpretações e deturpações nos últimos anos. Sendo assim, esta é também mais uma razão que nos leva a reflectir sobre o tema.

Do ponto de vista táctico, o autor (Amado, 2016) aponta que “os benefícios de sair a jogar não se esgotam na possibilidade de ligar o jogo, de manter a posse de bola ou de preparar um ataque. Sair a jogar é também a maneira mais segura de uma equipa se precaver contra a incerteza das segundas bolas. (…) Aliviar quando se está a ser pressionado parece uma decisão sensata, na medida em que se evita o risco inerente à circulação numa zona defensiva. Mas, na verdade, aliviar envolve sempre a insensatez de deixar o destino do lance entregue ao acaso”. Reflectindo sobre as probabilidades de sucesso das acções, parece-nos claro que o passe curto terá maior probabilidade de sucesso do que o longo, mesmo nas tais zonas que muitas pessoas consideram de “risco”. Nesta linha de pensamento surge também (Lumueno, 2018), defendendo que “o passe longo é um passe de execução mais difícil que o passe curto, assim como também é de receção mais difícil. E a dificuldade é ainda maior no caso de existirem adversários por perto. Ou seja, tudo isso resulta numa maior possibilidade de o adversário recuperar a bola”. E neste sentido, (Correia et al., 2014) expõem que “as equipas de topo tentam sempre que possível sair a jogar curto e há aquelas ainda que o fazem mesmo que o contexto não seja o mais favorável. A questão fundamental é que, em condições normais, uma saída curta oferece mais garantias da equipa manter a posse de bola comparativamente às saídas longas”.

O treinador português (Vítor Pereira, 2014), acredita que “mesmo sob pressão há formas de sair a jogar. É preciso é entender como é que a pressão está a ser feita e preparar o antídoto”. Neste enquadramento, a prioridade deverá então passar pelo passe curto, logicamente se existirem condições mínimas. Os autores (Correia et al., 2014) sublinham esta ideia, referindo que “a primeira preocupação de toda a equipa num pontapé de baliza a seu favor será sair a jogar curto, desde que estejam reunidas as condições para tal. O posicionamento do adversário é aqui 0 principal fator a ter em conta na decisão a tomar“. Essas condições mínimas serão determinadas então pelo Modelo da equipa. Sejamos claros, pelo Modelo e não pela Ideia. Sendo o Modelo, a Ideia mais o Contexto, ele expõe portanto a interacção do que foi construído pelo treino, com as qualidades individuais dos jogadores, com o seu momento emocional, com a forma como absorveram a ideia, com a dimensão estratégica, ou seja, pelo conhecimento do que o adversário poderá ou não fazer e a influência que isso terá nos recursos disponíveis, entre um universo de outras coisas mais ou menos influentes.

Exemplificando o domínio estratégico, os autores (Correia et al., 2014) explicam que este “poderá ter também influência na forma de executar um pontapé de baliza, ou seja, questões relacionadas com as características do adversário com quem iremos jogar poderá influenciar na opção ou opções a tomar. Exemplos: explorar as zonas onde se encontram os jogadores menos fortes no jogo aéreo da equipa adversária, realizando para lá o pontapé de baliza; tentar a superioridade numérica no local previsto para a queda da bola após a reposição pelo guarda-redes, aumentando as hipóteses de êxito na disputa do lance“. Os autores tocam ainda num tema ao qual regressaremos no futuro. A relação tempo-espaço-número parece-nos hoje curta na tomada de decisão ou para avaliá-la. A qualidade, como quarta dimensão, parece-nos fundamental na busca de uma melhor compreensão da complexidade da acção, de uma maior aproximação à realidade do jogo, e consequentemente ao sucesso.

Assim, procurando esse sucesso, o treinador português (Villas-Boas, 2009) defende ser possível sair a jogar curto do Guarda-Redes “desde que o treines e acredites nisso… acho que sim… acho que é possível… obviamente que, se tiveres um central que tem dificuldade ou que tecnicamente é limitado não o vais querer fazer, não queres arriscar, se tiveres centrais que estão confortáveis com a bola… acho que sim, que podes arriscar… acho que é uma coisa que deves fazer”. Mas (Correia et al., 2014) descrevem que “muitos treinadores definem muito bem o posicionamento dos seus jogadores para que o pontapé de baliza seja executado, mas não preparam a equipa corretamente, através de exercícios de treino, para o conjunto dos comportamentos e ações que é imprescindível ter para que a manutenção da posse de bola esteja assegurada”. O treinador (Miguel Cardoso, 2018), relata, que em conversa com o seu Guarda-Redes, “também disse ao Cássio: “Não há problema nenhum se tu entenderes que a bola deve ser longa. Se entenderes que a equipa está num momento em que não quer sair curto, ou porque não te deu linhas de passe ou porque o adversário está numa fase muito pressionante…”

“O que nós dizemos é: “Tens aqui, tens ali, tens acolá e acolá. Escolhe. O que tu escolheres para mim está bem feito”. Agora, ele teve foi a coragem, muitas vezes, de encontrar soluções que permitiram ter mais certeza, por regularidade, por tendência. Em 20 vezes, ele encontrou 18 soluções que teoricamente para quem vê de fora são de risco, mas para nós não eram risco, porque eram o que nós fazíamos. E tu perguntas assim: mas treinavam assim? Assim e pior: treinávamos com dez contra onze. Agora tiro um médio, tiro o Pelé. Agora tiro o Tarantini. Agora tiro o Geraldes. Agora tiro um ala. Agora tiro um lateral. Agora o Guedes. E fazia isto 20 vezes seguidas. E contra a equipa B, por exemplo, em que dizia: agora vocês pressionam o guarda-redes, agora não pressionam o guarda-redes, agora fazem parede ao guarda-redes daquele lado, agora ficam à espera. Isto é dar soluções em contextos de dificuldade acrescida e incorporar permanentemente o guarda-redes nos exercícios de treino. E depois há uma coisa fundamental: o que é que é tão importante assim que faz a diferença toda quando se quer jogar desta forma? Não se pode receber bolas de costas. É preciso estar de apoios abertos. É preciso o próprio Cássio permanentemente estar preparado para receber a bola, seja para o lado contrário ou para o mesmo lado, é preciso que os colegas se movimentem para que o guarda-redes tenha soluções.”

(Miguel Cardoso, 2018)

Forçar então a Ideia sem que o Modelo apresente condições de sucesso, parece-nos um erro, que actualmente se vê repetido por imensas equipas, nos mais diferentes níveis de jogo. Porque se procura passar uma coragem abstracta… e não uma coragem táctica. Portanto, perante diferentes ideais / soluções / recursos para este momento do jogo, e tendo então também em conta o Modelo, na maioria das situações as probabilidade de sucesso deverão levar a prioridades na decisão. Mas talvez… não sempre. Não será que uma acção de probabilidade de sucesso inferior, mas que o seu sucesso colocará um atacante em situação de Criação, ou mesmo de Finalização deva ser pontualmente, a decisão? Ou mesmo uma solução que não estava na Ideia inicial? Não representa também isto… criatividade, a qual tantas vezes é solicitada e declarada como fundamental no jogo?

Por outro lado, o tal “aliviar” é diferente de passar longo, mesmo que este passe encontre oposição na disputa da recepção dessa bola. Porque há uma intencionalidade nessa acção e é isso o que para nós representa um passe. Uma forma de comunicação específica do jogo de futebol. A sua eficácia, pode depois ser avaliada, mas não deixa de ser uma intenção de passe. E para que a eficácia global da acção aumente, o Modelo não tem apenas que oferecer a solução de passe longo e recepção, como deve precaver uma provável disputa e a forma de ganhar uma eventual segunda bola. E concordando novamente com Amado, o “alívio” não é para nós uma opção aceitável. No máximo é um último recurso, mas que pode ser interpretado como a ausência de soluções de uma equipa perante determinada situação de jogo, e sendo assim, um assumir de incompetência. Deste modo, se a situação de jogo assim o “pedir”, diferentes soluções de passe longo deverão constituir-se como recursos, logo, deverão também estar presentes no Modelo de Jogo da equipa. Neste sentido, o autor (Lumueno, 2018) defende que “a saída de bola longa tem como grande vantagem em caso de perda a equipa estar toda mais ou menos organizada, e mais longe da baliza que defende. Se a equipa trabalhar para essas ações de jogo, em caso de perda, os jogadores estarão mais próximos uns dos outros e por isso com menos espaço para o adversário penetrar por entre as suas linhas”.

Nesta fase, torna-se fundamental, esclarecer o que é para nós, a saída de jogo do Guarda-Redes. Para muitos, a mesma diz respeito exclusivamente a situação de bola parada, pontapé de baliza. Contudo, a reposição do Guarda-Redes, ou seja, o primeiro passe após este ter recolhido a bola e estar na sua posse com o jogo a decorrer, quer a bola seja proveniente de uma intercepção, quer de uma recepção de um passe de um colega, dada a sua semelhança, também entra para nós neste Princípio de Jogo. Naturalmente temos que ter em conta as diferenças que existem entre ambos, e equacionar possíveis ajustes. Até agora, grandes diferenças passavam pelo menor tempo de decisão e execução, fruto da possível imediata pressão do adversário na reposição do Guarda-Redes, portanto na situação em que a bola está jogável, e também pela influência da regra da não invasão da grande-área dos jogadores que atacam no pontapé de baliza, e ao invés, essa possibilidade na reposição do Guarda-Redes. Com a recente alteração da regra, as diferenças reduziram-se ainda mais.

Atrás, abordámos um termo que se vulgarizou: a saída de jogo do Guarda-Redes curta. A reflexão e a experiência que o jogo e o treino nos trouxe, mostram-nos que o termo está desajustado. Ou melhor, está incompleto. Isto porque muitas equipas posicionam-se para essa saída curta, e normalmente devido à oposição adversária, optam depois por um passe longo do Guarda-Redes, normalmente aéreo, por exemplo, na opção que tem sido mais comum, para os seus Defesas-Laterais. Mas nas mesmas circunstâncias já assistimos a um passe longo, aéreo ou rasteiro, do Guarda-Redes no corredor central, para um companheiro que se encontra livre, resultado da pressão alta adversária e do garantir profundidade da equipa atacante pelo(s) seus Avançado(s), atraindo desse modo a última linha adversária para perto de do(s) mesmo(s) e criando assim mais espaço entre-linhas.

Nos últimos anos, assistimos ainda, a uma tentativa de último passe do Guarda-Redes, neste caso, apenas na situação de pontapé de baliza dada a ausência da regra de fora-de-jogo nesse momento. A mesma já foi protagonizada com sucesso, num atacante que se posiciona no espaço entre a última linha adversária e o Guarda-Redes adversário, procurando dessa forma saltar do sub-momento de construção, imediatamente para o sub-momento de criação. Aqui trata-se de um passe longo aéreo realizado com a equipa aberta de forma a criar incerteza ao adversário, nos últimos anos celebrizado pelo Guarda-Redes Ederson, constando até que terá sido essa uma das razões que levou Guardiola a optar pela sua contratação. No fundo, como refere o autor (Bouças, 2017), a questão sobre o passe longo estará em “perceber como pressionam… Se vêm apertar com todos homem a homem, trazes médios todos para baixo também, e aumentas-lhes o espaço entre médios e defesas, para então colocares lá a bola. Já dizia o Pep, “é uma bola que se a ganhas, é muito boa”. Ou seja, nessa situação, sem dúvida que não só te estás a proteger, como até estás já a preparar ferir o oponente, quando colocas a bola por cima da pressão”.

E logo aqui… o próprio Guardiola, o tal que celebrizou a saída de jogo do Guarda-Redes curta, mostra-se à frente da maioria, procurando novas soluções e mais recursos para o seu jogo, demonstrando que se as equipas ficarem presas a uma saída de jogo, expressam outra forma de reducionismo. Mesmo que aumentar os recursos, seja “simplesmente” para aumentar a imprevisibilidade do seu Modelo, continuando no entanto, a dar preferência, ou prioridade, à saída de jogo do Guarda-Redes curta, pela convicção de que a natureza desse primeiro passe, conduzirá o jogar da equipa a uma maior eficácia. Por outro lado, a necessidade de sucesso nessa situação específica do jogo, não se esgota na própria situação. De acordo com os autores (Correia et al., 2014), “uma equipa que tenha problemas na reposição de bola em jogo a partir desta situação, poderá tornar-se numa equipa insegura”. A ideia encaixa de forma perfeita na visão do todo complexo que é o jogar.

Deste modo, já identificámos diferentes possibilidades na saída de jogo do Guarda-Redes. Se ela pode ser realizada com a equipa aberta, quer dizer que também pode ser realizada com a equipa fechada (e neste artigo nem procuraremos ir mais longe e equacionar um posicionamento misto, ou seja parcialmente fechado e aberto). Numa segunda variável, independentemente se a equipa se apresenta aberta ou fechada, o passe do Guarda-Redes pode ser curto ou longo. E finalmente pode ainda ser realizado em trajectória rasteira, ou aérea. Portanto podemos identificar:

Saída de Jogo do Guarda-Redes

Aberta

Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Curto Rasteiro
Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Curto Aéreo
Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Longo Rasteiro
Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Longo Aéreo

Saída de Jogo do Guarda-Redes

Fechada

Saída de Jogo do Guarda-Redes Fechada em Passe Curto Rasteiro
Saída de Jogo do Guarda-Redes Fechada em Passe Longo Aéreo

Assim, uma vez que a saída de jogo aberta, também pode ser realizada em passe longo, e sendo que neste âmbito, a decisão que causa maior impacto no tempo de reorganização da equipa, passará por estruturar um posicionamento inicial aberto ou fechado, sentimos que esse deverá ser o primeiro critério a ter em conta na sua definição e classificação. A partir daí, podemos encontrar as possíveis variações das mesmas e eventualmente novas soluções futuras.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/2472653552753527/

Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Curto Rasteiro

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/2123177647972575/

Saída de Jogo do GR Aberta em Passe Longo Rasteiro

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/331721524168705/

Saída de Jogo do GR Aberta em Passe Longo Aéreo

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/708977022855106/

Saída de Jogo do GR fechada em passe curto rasteiro + Saída de Jogo do GR Aberta em Passe Curto Aéreo

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Saída de Jogo do GR fechada em passe Longo Aéreo

Para além das soluções identificadas no quadro e nos vídeos acima, outras possíveis conjugações teóricas, não nos parecem ter grande viabilidade no jogo. Porém, ressalvamos que com a alteração da regra do pontapé de baliza, podendo esta também influenciar a reposição do Guarda-Redes, poderão surgir novas soluções, por exemplo importadas do Futsal, entre as quais, mais situações de saídas de jogo do Guarda-Redes abertas em passe curto aéreo, uma vez que estas são raras no momento actual. Contudo, ilustrámos um exemplo deste, na dupla saída de Manuel Neuer e da Alemanha. E continuando nas possíveis alterações provocadas pela nova regra, poderemos ainda assistir à introdução de um quarto critério para caracterizar este princípio de jogo. A mobilidade. Sendo verdade que a mesma já se encontra parcialmente presente nalgumas soluções de saídas de jogo, não nos parece expressiva essas situações, tendo como comparação o que se faz no Futsal. Isto porque no Futsal, essa mobilidade na saída de jogo, realiza-se com a totalidade ou quase a totalidade dos jogadores de campo. No Futebol isso não fará sentido, mas o princípio de jogo talvez possa evoluir para soluções do género com a totalidade ou quase a totalidade dos atacantes que garantem as linhas de passe mais próximas do Guarda-Redes. O exemplo que trazemos não é o mais feliz equacionando o transfere que terá do Futsal para o Futebol, mas é apenas um exemplo que utiliza a mobilidade.

Finalmente… deixamos um último vídeo como forma de “provocação” e de sentirmos que, por muito completa e complexa que seja uma sistematização ou representação teórica, ela nunca reproduzirá de forma perfeita a totalidade da realidade. Neste contexto, a totalidade da realidade do jogo. É o problema do pensamento analítico e da matemática. Muitas vezes a mesma ignora o detalhe, a ligação, a evolução e o tal todo que é mais que a soma das partes. Se todas as situações anteriores, que representam quase a totalidade deste género de acções encaixam perfeitamente no momento de Organização Ofensiva, a que publicamos a fechar este artigo, pertencerá para nós, ao momento de Transição Ofensiva. O que é perfeitamente equacionável na nossa sistematização do jogo, porém distingue-se então de todas as outras. Relembramos a Transição Ofensiva que propomos:

“Se a equipa conseguiu sair com eficácia e rapidamente da zona de pressão, poderá encontrar espaço e / ou uma relação numérica com o adversário interessante para optar pelo contra-ataque.”

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/408416776555028/

Transição Ofensiva | Recação ao ganho + Contra-ataque | Saída de Jogo do GR fechada em passe Longo Aéreo

“Se nós formos fazer um estudo da quantidade de golos que ocorrem nos últimos 2 anos em Portugal, com a quantidade de bolas que saíram do Guarda-Redes para os Defesas-Centrais, se calhar é… 3000% a mais do que era nos anos anteriores. Porque agora identidade é toda a gente querer sair com os Guarda-Redes a jogar com os Defesas-Centrais, e às vezes não há condições para isso.”

(Silveira Ramos, 2019)

Exercício 138 [Subscrição Anual]

Publicamos o exercício 138, denominado como Meinho em duplas com baliza e Guarda-Redes. Este exercício encontra-se no nosso arquivo e estará disponível para subscritores.

A identificação meinho, pode sugerir que estamos na presença de um exercício de dimensão mais lúdica, ou de um exercício de complexidade reduzida, no qual no momento da recuperação da bola, o mesmo é interrompido para que os jogadores troquem de função. Não é o caso. Utilizamos a palavra meinho como forma mais fácil e prática de explicar a generalidade do exercício. No fundo trata-se de um exercício de posse de bola que se inicia e se joga em condições muito específicas e que traz características interessantes, não só do jogo, como também do ponto de vista da especificidade de uma determinada ideia de jogo. Aqui destacamos também a oportunidade para uma possível adaptação às novas regras do Pontapé de Baliza.

Dada a sua estrutura mais micro, quer em número, quer em espaço, será apropriado como um exercício introdutório ou complementar durante a Sessão de Treino. Dada a continuidade do jogo, garante ainda a Articulação de Sentido do ponto de vista dos momentos do jogo, pois para quem ataca vivencia, pelo menos, Organização Ofensiva e Transição Defensiva, e quem defende, pelo menos, Organização Defensiva e Transição Ofensiva.

Neste domínio, o exercício também apresenta no seu contra-exercício um estímulo de qualidade, ou seja, para a equipa que se encontra em oposição aos objectivos prioritários, nomeadamente no seu momento de recuperação da bola e consequente decisão sobre o Contra-ataque ou a Valorização da posse de bola. Desta forma, do ponto de vista do planeamento, o exercício poderá então, também servir esses propósitos opostos.

Exercício 138 | Meinho em duplas com baliza e Guarda-Redes

Qualidade de jogo II

Na passada semana demos destaque ao Shakhtar Donetsk e ao trabalho desenvolvido por Paulo Fonseca e a sua equipa técnica. Pelo apuramento para os oitavos de final da Liga dos Campeões, mas principalmente pela qualidade de jogo apresentada. Ainda por cima quando disputava esse apuramento contra duas das actuais melhores equipas da Europa. É notória e notável a qualidade ofensiva da equipa Ucraniana, que esteve em grande destaque no derradeiro jogo contra o Manchester City. Porém, como sublinhámos nas palavras de Vítor Frade, no futebol actual, é fundamental a preocupação por um equilíbrio entre os vários momentos do jogo. Apenas dessa forma uma equipa consegue ser consistente e apresentar qualidade de forma regular.

Jorge Maciel, em 2011, referia um aspecto muito importante, “que passa pela coerência e pelo respeito pela inteireza inquebrantável que o jogar deve manifestar de modo a que se expresse de forma fluída, dinâmica, ou seja que revele ao nível da matriz conceptual articulação de sentido com um determinado sentido”. Desde modo, Maciel defendia que uma sua equipa “deve evidenciar um padrão zonal pressionante, capaz de provocar erros nos adversários forçando desse modo a perda da posse de bola. Não nos devemos acomodar à ideia da necessidade de defender, de um modo “extremista”, a equipa deve ter aversão a defender, ou seja deve ter repulsa relativamente à necessidade de defender, mas simultaneamente e paradoxalmente tem de se sentir confortável quando o tem que fazer. Para isso tem de defender com qualidade para que os momentos em que se vê obrigada a defender sejam curtos, porque induzimos o adversário a errar, mas claro sempre com critério e organização colectiva, respeitando uma organização posicional que melhor nos permita atacar e estar compactos quando temos de defender, o que passa por um escalonamento em várias linhas tanto em profundidade como em largura. Além disso, a equipa tem de reconhecer indicadores de pressão saber atrair e direccionar os adversários para pressionar com êxito, reduzir o campo sabendo nessa intenção jogar com o fora-de-jogo, o que é diferente de jogar em fora-de-jogo. Fundamentalmente, queremos “mandar sempre”, mesmo quando não temos bola.”

Se tal já sucedia no Braga de Paulo Fonseca, também no Shakhtar os momentos defensivos são de grande qualidade e estão ao nível dos ofensivos. Tanto, que o realizador do jogo focou a “dança” da última linha dos ucranianos em determinado momento da partida.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1896219290407329/

Em 2014, Matías Manna, a propósito do Bayern de Munique de Guardiola, explicava que este assumia “riscos como ninguém. Boateng mantém a linha, sempre atento ao brasileiro. Na arte da defesa em linha, as equipas de futebol, que são corajosas em todos os momentos do jogo, também podem dar um bom espectáculo. Quando uma equipa adversária faz um passe para trás, Guardiola gesticula para a sua equipa subir. Quando o adversário que tem a bola e está pressionado pelos Avançados e Médios do Bayern, a Defesa sobe. Quando o adversário procura jogar longo, os Defesas-Centrais esperam, aguardam, e passam para a frente dos Avançados adversários, deixando-os fora-de-jogo. Não há espaço. Gestão do espaço é um conceito de Cruyff. Outro conceito para os Alemães que decidiram sempre fazer outra coisa na Defesa. Contra-cultural ou contra-natural. Guardiola decidiu extremar comportamentos para não dar espaço aos seus adversários. Tudo sob o olhar temeroso de Beckenbauer, acostumado a outros hábitos (…)”. O autor (Bouças, 2017) reforça que “encurtar o espaço entre sectores, aumentando o espaço que fica nas costas da última linha requer uma concentração mental permanente, e um jogo de orientação corporal eficiente, para que se possa baixar rapidamente sem perder metros para os avançados que se movem para receber entre defesas e guarda redes.”

“É isto que faz a diferença. É perceber o momento em que a bola está sem pressão e está em condições de entrar na profundidade. Esse é que é o momento de controlar a profundidade. Porque antes disso tem de ser de redução da profundidade, tem de ser de ganho da bola, tem que ser de ataque à zona da bola para ganhar.”

Vítor Pereira, 2016

Exercício gratuito

Publicamos um novo exercício gratuito: “Perda em construção na primeira linha“.

O exercício que trazemos reforça a importância da articulação de sentido, desta vez predominantemente no Modelo de Jogo Idealizado, mais precisamente na articulação entre os diferentes momentos do jogo. Segundo (Frade, 1998), citado por (Amieiro, 2009), a propósito da articulação de sentido entre exercícios, “os «exercícios», em si mesmos, têm pouco valor. Têm unicamente informação potencial. A ênfase que eu coloco nisto e naquilo enquanto o «exercício» acontece, o modo como eu ligo isto com aquilo e a articulação entre «exercícios», são os aspectos mais importantes e os mais difíceis de dominar. E dependem exclusivamente do treinador. Por isso é que eu digo que os «exercícios» nunca são novos. Têm de estar sempre relacionados uns com os outros”.

Sendo que neste caso, o próprio grande objectivo deste exercício é preparar a equipa para um momento perigoso de perda da bola, quando a mesma está no sub-momento de construção, pela sua primeira linha. Independentemente de ninguém querer a perda da bola nesta situação, a consciência que mais tarde ou mais cedo isso irá suceder será sintoma de inteligência e a antecipação de um futuro inevitável. Conter, recuperar a organização possível e saber defender o contra-ataque tornam-se aqui decisivos, portanto, alvo necessário do treino.

Nesta lógica estamos perante um reduzir sem empobrecer, porque, segundo Edgar Morin, “o todo está nas partes que estão no todo”. Ainda (Frade, 2012) explica que reduzir sem empobrecer, é estar “consciente de que o que está a suceder com cada jogador é aquilo que em termos de intermitência sucede na sua função durante a partida, quando treinamos em espaços reduzidos, por exemplo”. Também de acordo com (Batista, 2006), “aos exercícios de treino está implícito, um carácter fractal, porque na perspectiva evidenciada anteriormente deverão contemplar a singularidade do todo. Através dele treina-se um princípio ou sub-princípio do Modelo de jogo, ou seja, os padrões fractais do comportamento (Oliveira, 2004; Frade, 2004)”. Ainda Pedro Baptista conclui que “no processo de treino podemos e devemos treinar “pedacinhos” do nosso jogo, isto é, treinar este ou aquele princípio de jogo deste ou daquele momento, mas cada pedacinho deve ter a matriz do todo, subentenda-se todo, como o “jogar” que queremos para a nossa equipa, no fundo devemos respeitar o todo que está na(s) parte (s) que está (ão) no todo (Frade, 2004)”.

“Não atender à fractalidade do Jogo e de um «jogar», torna-se uma fatalidade”.

(Maciel, 2008)

Exercício gratuito

Publicamos mais um exercício gratuito: Saída de jogo do Guarda-Redes em “quem perde sai”

Desta vez trazemos um exercício cujo objectivo principal é o sub-momento de construção do momento ofensivo do jogo, especificamente a Saída de jogo do Guarda-Redes, a Construção pela primeira linha e a penetração da primeira linha de pressão adversária. Contudo, tem também uma preocupação com a articulação de sentido para o momento da Transição Defensiva e defesa da baliza após a perda da bola. O exercício aproxima-se de uma fase de consolidação, uma vez que tem um carácter competitivo muito acentuado, o que pode desfocalizar a aquisição destes comportamentos numa primeira fase de trabalho.

O exercício garante propensão aos comportamentos identificados, porém não condiciona para uma forma de jogar específica e sua consequente estrutura. É assim aberto ao modelo idealizado por cada treinador, permitindo diferentes formas de saída do Guarda-Redes, através de passe curto e médio, garantindo também espaço para diferentes ideias para ultrapassar a primeira linha de pressão e nesse seguimento chegar ao interior do bloco adversário, neste caso, a finalização nas balizas sobre o meio-campo. Por outro lado, no contra-exercício, a equipa que inicia o exercício a defender, pode, por sua iniciativa ou por determinação estratégica do treinador, posicionar-se num bloco médio junto ao meio-campo ou num bloco mais alto procurando desde logo condicionar o primeiro passe do Guarda-Redes. Desta forma, o exercício pode ser invertido nos seus objectivos, caso a preocupação seja o momento defensivo do jogo e o condicionamento da construção adversária, caso a mesma seja curta.

De acordo com (Manna, 2009), “sair jogando é dar prioridade ao passe desde o início da construção de jogo. O pontapé de baliza ou a participação dos defesas na construção ofensiva torna-se fundamental. Uma perda de bola na zona dos defesas centrais pode ser terrível. Todos evitam realizar o que Pep dá prioridade. Riscos que permitem, facilitar o ciclo de jogo, no qual Pep irá sempre tentar construir desde a sua baliza”. Guardiola sublinha que saindo a jogar bem, podemos chegar ao alvo jogando bem, ao contrário de um mau início de construção que torna tudo mais difícil e aleatório. E lembra que se o primeiro passe é bom, tudo é mais fácil a seguir.

“É de estética vazia

e o Futebol assim jaz…

Jogo directo nada cria

correm, correm, mas nenhum sabe o que faz.”

(Frade, 2014)

Exercício gratuito

Publicamos mais um exercício gratuito: Construção em bloco médio e defesa de duas balizas

Trata-se de um exercício que procura dar propensão à organização ofensiva, especificamente num momento de construção mais perto do meio-campo adversário e perante uma equipa que se posiciona, no seu momento defensivo, num espaço médio ou baixo. A propensão ao objectivo é garantida não só pela forma como o exercício é reiniciado, como também pela ausência de pontapés de baliza ou cantos. Anular os lançamentos laterais garantirá uma ainda maior propensão. Por outro lado, ter que defender duas balizas sem Guarda-Redes, isto na progressão máxima do exercício, conduzirá a que a equipa que inicia o exercício em construção, dê maior segurança à sua posse e circulação de bola, de forma a evitar a sua perda e difícil defesa das duas balizas. Porém, quando isso suceder, a equipa terá que reagir colectivamente, com qualidade e determinação à perda da bola, evitando uma imediata finalização do adversário.

Deste modo, ao articular no objectivo dois momentos de jogo diferentes, o exercício cumpre o princípio metodológico da Periodização Táctica – a Articulação de Sentido.

Segundo (Maciel, 2011), a Articulação de Sentido, “trata-se de um conceito que vai precisamente ao encontro do cerne do pensamento sistémico. A ênfase no pensamento sistémico é colocada nas relações, o segredo está nas conexões. Ou seja, o sucesso do processo de treino tem a ver com isto, depende muito do modo como eu articulo as coisas, isto é, como as relaciono e partir daí teço a minha teia dinâmica. A Articulação de Sentido tem precisamente isto subjacente e tem a ver com a conexão coerente que se faz entre as partes implicadas no processo, e vale a nível da operacionalização dos Princípios Metodológicos e a nível da manifestação e vivenciação dos princípios de jogo. Portanto, a matriz conceptual para manifestar fluidez na sua concretização deve revelar internamente uma determinada articulação de sentido, que sendo coerente permite o emergir de uma realidade consistente, um Sentido, o nosso jogar, ou o sentido que queremos dar ao nosso jogar.”