“Uma pessoa pode fazer a diferença.”
O que é liderar?
“Pessoas que se consigam ultrapassar a si próprias e inspirar os outros.”
Slogan publicitário publicado no Financial Times pela firma de advogados White & Case, mostrando uma fotografia do lendário treinador do Liverpool Bill Shankly, citado por (Brady, et al., 2008)
De acordo com (Ferreira, 2008), “ser treinador exige uma diversidade de competências, que não se esgotam no domínio das habilidades da organização, planeamento e condução do treino e das competições, mas também com as relações que estabelece com os jogadores, os restantes membros da equipa técnica, com a direcção, com a comunicação social, com os adeptos, com os árbitros e com a sua forma de estar no que diz respeito à incessante busca do conhecimento relacionado com a modalidade (Oliveira, 2004)”. O mesmo autor descreve que a definição de liderança “apresentada por Barrow (1977), que entende a liderança como um processo comportamental que visa influenciar indivíduos ou grupos no sentido de alcançarem os objectivos definidos surge como a definição que parece reunir maior consenso entre teóricos e investigadores no domínio da Psicologia do Desporto”. No entanto, a (Wikipédia, 2012) vai mais longe e descreve que “a condução de um grupo de pessoas, transformando-o numa equipa que gera resultados é chamado de liderança. É a habilidade de motivar e influenciar os liderados, de forma ética e positiva, para que contribuam voluntariamente e com entusiasmo para alcançarem os objectivos da equipa e da organização. Assim, o líder diferencia-se do chefe, que é aquela pessoa encarregada por uma tarefa ou actividade de uma organização e que, para tal, comanda um grupo de pessoas, tendo autoridade de mandar e exigir obediência”. Neste sentido, (Almeida, 2015) descreve a Liderança como “um processo” e não como uma a relação hierárquica. Deste modo, Este sentido de Liderança, aplica-se então a qualquer relação humana. No Futebol, ela pode então contextualizar as diversas relações entre os diversos agentes nele envolvidos.
Dados os mais diversos relatos, o ex-jogador e treinador Mário Wilson foi um reconhecido líder. A alcunha “Capitão” subentende desde logo o reconhecimento da sua liderança. Diversos relatos transmitem que a mesma acompanhou-o de jogador a treinador. O ex-jogador e treinador Carlos Manuel em (SportTV, 2016) confirma esta qualidade ao explicar que Mário Wilson tinha “liderança em todos os sítios por onde passou. (…) A alcunha vem da Académica onde já o tratavam por capitão. (…) Ele era realmente uma pessoa extremamente afável e com uma liderança enorme. Era um líder nato”.
Porém, (Ferreira, 2008) identificou que “as investigações efectuadas no âmbito da liderança no desporto têm estado mais direccionadas para a identificação de estilos de liderança do que propriamente em identificar performances com sucesso e respostas positivas em termos psicológicos por parte dos jogadores (Horn, 2002)”. O autor explica que numa primeira fase do estudo da liderança, procurou-se identificar os Traços de Personalidade ou a “vulgarmente designada por Teoria do Grande Homem”, que se baseava no estudo das características pessoais dos líderes. Contudo, esta abordagem ignorou a eficácia da liderança exercida, assim como a influência do contexto na mesma. Posteriormente, procurando ultrapassar as limitações da anterior teoria, procurou-se identificar aspectos observáveis, logo, as “acções assumidas nas diferentes situações de trabalho (Leonard, 2003)”. Nesta lógica, ainda segundo Miguel Ferreira, o objecto de estudo serão os “comportamentos, acções ou atitudes que revelassem a eficácia ou ineficácia das pessoas que exerciam tarefas de liderança”. Esta abordagem esbarrou “devido à consistente descriminação da liderança eficaz da ineficaz, bem como à falta de generalização a diferentes contextos. A abordagem Comportamental não apresentava consistência na efectividade da liderança de uma pessoa em contextos diferentes, levando ao aparecimento de novas teorias que passaram a considerar a variedade de situações (Horn, 1992)”. Desta forma, surgiram novos modelos que justificassem a eficácia da liderança, como foi exemplo a Abordagem Situational. O autor (Ferreira, 2008) explica que “esta abordagem, segundo Gomes (2005), acrescentou um novo factor de ponderação no estudo da liderança: as exigências colocadas pelo contexto onde o líder exerce as funções. Gomes, refere ainda que ser líder não era apenas uma questão sobre “aquilo que é” ou sobre “aquilo que faz”, mas também é sobre que “tipo de pessoas” fazem parte do grupo; que “tipo de tarefas” devem ser efectuadas e “em que contexto” estão integrados todos os membros do grupo/organização. Nesta linha de pensamento surgiram, então, modelos que tentaram explicar este fenómeno: o Modelo Contingencial e o Modelo Situacional de Liderança”.
René Meulensteen, em (Brackley, 2011), explica que Alex Ferguson “sempre teve a capacidade para tomar decisões difíceis quando necessárias. Sempre por uma razão: o bem do Clube”. Por outro lado, (Cid, 2006) citando (Murray, 1991), refere que ao contrário de algumas visões redutoras, “a liderança deve ser percepcionada como uma espécie de contrato psicológico que é estabelecido entre os líderes (treinadores) e os seguidores (atletas), onde os primeiros são autorizados, quer no plano formal ou informal, a decidir pelos segundos, sendo reconhecido o direito que eles têm em decidir por eles e dizer o que tem de fazer”. Neste contexto, (Morais, 2014) sustenta que o “líder que é líder está virado para os outros”. Para o técnico português, o líder é uma “pessoa simples numa função complexa, na qual tem de conduzir as pessoas para o destino pretendido, ajudando a encontrar soluções de forma a atingir os objectivos individuais e colectivos”. Para o treinador português (Jesus, 2013), “a Liderança é o conhecimento. É o princípio de tudo para liderares os teus jogadores”. Ainda (Morais, 2014) acrecenta que “a Liderança não tem receitas. Liderança é saber aplicar os conhecimentos – recursos humanos, gestão do tempo, recursos materiais, recursos financeiros”. O treinador português refere que “ser treinador requer conhecimento e carácter. Para além de termos que ganhar aos adversários temos que ganhar a nossa equipa, todos os dias”. Tomaz Morais acrescenta que “o melhor treinador prepara os jogadores o melhor que pode no menor tempo possível. O melhor líder é o que consegue fazer melhor, com menos recursos disponíveis”. Deste modo o treinador português, refere que se tivesse que resumir a liderança da forma mais simples possível, diria que:
COMPORTAMENTO + CONHECIMENTO = LIDERANÇA
(Morais, 2014)
A importância da liderança
“A minha liderança toda a gente a sente, mas ninguém a vê.”
(José Mourinho, 2003) citado por (Cid, 2006)
A propósito do trabalho de Tomaz Morais, o antigo responsável pelas Selecções Nacionais de Rugby Portuguesas, Pedro Lynce, citado por (Carlos Filipe Mendonça, 2006), declara que “do ponto de visto técnico, pode haver muita gente igual ou melhor que o Tomaz. Hoje em dia, os atletas de alta competição são autênticas máquinas e, apesar de haver sempre alguma coisa nova a descobrir, os modelos teóricos são sobejamente conhecidos. Então eu pergunto: o que é que faz este homem ser melhor dos que os outros e ter conseguido coisas que mais ninguém conseguiu?”
O autor (Cid, 2006) descreve que “de acordo com Murray (1991) e Dosil (2004) a liderança é um dos aspectos mais estudados no âmbito da Psicologia do Desporto, sendo um tema de grande interesse pelas implicações que tem, tanto nos desportos colectivos como nos individuais, uma vez que as relações que se estabelecem entre o treinador e atleta(s) ou no seio de um grupo-equipa são fundamentais na obtenção do rendimento desportivo (Serpa, 1990). Entre outros aspectos, Alves (2000), realça a importância deste processo como elemento fundamental para o desenvolvimento de um bom clima organizacional, que por sua vez é determinante no grau de satisfação das relações interpessoais e na eficácia do desempenho das suas tarefas”. Para (Morais, 2014), “o líder é acima de tudo um gestor de oportunidades e de expectativas”.
Para (Morais, 2014) “o líder é-o em todos os momentos. Não termina a sua função, por exemplo, no final do jogo ou do treino”. Deste modo, a liderança do treinador está presente em todas as relações humanas que o treinador estabelece com os agentes envolventes à equipa e que influenciam o seu rendimento, mas fundamentalmente, com a sua equipa técnica e jogadores em intervenções gerais, grupais ou individualizadas. O treinador português José Mourinho citado por (Urbea, et al., 2012) descreve o papel do treinador “não se trata apenas de treinar bem, jogar bem, decidir e ganhar. É muito mais: temos que nos ocupar da gestão dos egos, das emoções; tudo isto torna agora o nosso trabalho muito mais complexo, muito bonito, mas também muito difícil”. Também o ex-seleccionador português de Rugby (Morais, 2014) defende que “muitas vezes não é não é no conhecimento técnico, não é no conhecimento táctico, não é na forma como se prepara os treinos, não é nos vídeos que se mostram, é na forma como ele gere estas relações humana que ele faz a diferença, nomeadamente quando estamos a falar ao nível mais alto do Futebol e do profissionalismo”. O treinador português Fernando Valente, em entrevista a (Lumueno, 2015), reforça que “não querendo desvalorizar as questões do treino e do jogo, penso que o caminho que pode marcar a diferença no sucesso das equipas, são as questões da Liderança e da Comunicação, ao mesmo tempo a orientação dos jogadores e das equipas na criação de objetivos (coaching), desenvolvendo ferramentas que os ajudem a desenvolver estados emocionais equilibrados e focados no seu desenvolvimento pessoal, aumentando assim a sua auto-estima e os seus índices de confiança na procura de melhores resultados…técnicas que já utilizo e que irei aprofundar tirando brevemente uma certificação em PNL (programação neuro – linguística)”. Para o técnico italiano (Ancelotti, 2013), “na qualidade de líder da sua equipa, o treinador deve converter-se no seu centro de unidade e coesão, ao mesmo tempo que assume todas as responsabilidades. O treinador pensa sempre na equipa; o futebolista quase sempre em si mesmo”.
Segundo (Brandão, et al., 2009) o, “no desporto e no exercício a definição de liderança engloba várias dimensões do comportamento do treinador, como, por exemplo, o seu processo de tomada de decisão, o tipo e a frequência com que fornece o estímulo aos seus atletas, o seu desempenho, as técnicas de motivação utilizadas e a forma de relação que estabelece com seus atletas (Buceta, 2009; Horn, 1992)”. Esta interacção passa no contacto directo pelos treinos, pelo «balneário», pelos jogos, pelo acompanhamento social dos jogadores, e passa ainda no contacto indirecto, pelas conferências de impressa, pela comunicação social, pela relação com os adeptos, com os árbitros, com os dirigentes e com os adversários. Todas estas relações têm o objectivo, segundo (Nunes, 2003), de “conduzir um grupo de pessoas, construir com elas uma ideia, empregar uma metodologia de trabalho na qual se sintam bem, dentro de parâmetros de disciplina que permitam a todos a necessária liberdade, encaminhando os seus desejos numa perspectiva colectiva”. No mesmo plano, a comunicação, sob todas as suas potenciais formas, é sem sombra de dúvida o grande veículo de intervenção do treinador, que poderá ter na motivação, coesão e disciplina as «ferramentas» que efectivam a sua Liderança.
Segundo (Morais, 2014), a liderança no contexto desportivo pode ocorrer a três níveis ou graus:
- Estratégico – Este nível ocorre principalmente pela Direcção do Clube, que formula novas visões do futuro para a organização e mobiliza as pessoas para os processos de mudança necessários a longo prazo;
- Táctico – Ao nível do treinador treinador;
- Operacional – Efectua-se pelo treinador e jogadores, durante o jogo. Por exemplo, os capitães tomam decisões dentro campo. Nesta lógica faz sentido que a equipa tenha um capitão por sector.
Uma competência inata ou adquirida?
“Ser líder é um caminho, é uma aquisição é fruto da experiência.”
(Jorge Araújo, 2009)
Na opinião da empresa de desenvolvimento de líderes (Linkage, 2016), “um dos grandes erros reside na crença de que “nascemos” líderes, quando na verdade, todos nós temos a habilidade de sê-lo. A liderança desenvolve-se: não é um dom que possuem poucos privilegiados. E os melhores líderes são aqueles que fazem da avaliação e do desenvolvimento de suas próprias capacidades, uma escolha permanente.”
Também para (Cid, 2006), uma das discussões centrais sobre a liderança prende-se com a “determinação se esta capacidade é uma característica inata ou adquirida (Dosil, 2004). Se uns defendem que ser líder faz parte da personalidade do sujeito, outros sustentam que é o contexto e a aprendizagem que converte o indivíduo. Estes pontos de vista deram origem a 3 perspectivas (Serpa, 1990, Murray, 1991, Weinberg e Gould, 1995, Cruz e Gomes, 1996 e Dosil, 2004):
- Traço / Característica – “Centra-se no estudo das características da personalidade dos líderes, na tentativa de encontrar os aspectos comuns que relacionem a liderança com qualquer situação, ou seja, esta abordagem considera a capacidade de liderança uma característica inata. Apesar de não existirem traços identificáveis da personalidade relativos à capacidade de liderança e à eficácia da mesma em todas as situações, uma vez que o sujeito pode variar a sua conduta de uma situação para a outra, ou, manter a mesma postura independente da situação, Stogdill (1974), citado por Murray (1991) e Weinberg e Gould (1995), conseguiu enumerar algumas tendências de comportamento: dominância, alta auto-estima, assertividade, elevado ambição, iniciativa, segurança, boa comunicação, competência, sentido de humor, etc.”
- Conduta / Comportamento – “Centra-se no estudo das condutas e comportamentos dos líderes e na sua influência sobre os grupos, sendo a liderança uma habilidade adquirida e produto de uma aprendizagem. Dois tipos de líder podem ser equacionados (Noce, 2002 e Mendo e Ortiz, 2003):
- Autocrático – toma todas as iniciativas e decisões sobre a organização, os objectivos e as tarefas do grupo. Ou segundo Martens (1987) e Weinberg e Gould (1995), estilo de comando, centrado na vitória e orientado para a tarefa.
- Democrático – estimula a discussão e a participação do grupo nas decisões a tomar. Ou segundo Martens (1987) e Weinberg e Gould (1995), estilo cooperativo, centrado no atleta e orientado para o sujeito.
Murray (1991) e Mendo e Ortiz (2003) fazem ainda referência a outro tipo de líder:
-
- Laissez Fair (“Deixa Fazer”) – adopta um papel passivo e deposita toda a capacidade de decisão nos membros do grupo.
Segundo Samulski (1995), o tipo autocrático pode ser mais eficaz em situações estruturadas e com objectivos bem definidos. Apesar de oferecer mais segurança aos atletas em momentos de tensão, provoca um clima sócio-afectivo negativo e alguma agressividade interna que pode conduzir a uma fraca coesão do grupo. Por outro lado, o tipo democrático parece ser mais eficaz em situações moderadamente estruturadas e com objectivos pouco claros. O incentivo à participação estimula a satisfação e promove uma elevada coesão do grupo. No entanto, ao repartir as responsabilidades pode aumentar os níveis de ansiedade de alguns membros do grupo.
- Interacional / Situacional – Esta abordagem parte do princípio de que existe uma interacção entre o sujeito e o contexto situacional, colocando uma atenção especial nos factores da situação que segundo Murray (1991) e Dosil (2004) podem ser a estrutura organizativa, as exigências especificas e a flexibilidade dos estilo de liderança. De acordo com os trabalhos de Fiedler (1967), citados por Weinberg e Gould (1995), Mendo e Ortiz (2003) e Dosil (2004), podemos definir dois tipos de orientação:
- Líder orientado para o sujeito (relação) – incide a sua actuação nos aspectos comunicativos do grupo, nas relações entre os seus membros e na procura do equilíbrio no seio do grupo (cada um deve sentir-se bem com o papel que desempenha);
- Líder orientado para a tarefa – centra-se no cumprimento dos objectivos propostos e no máximo rendimento, deixando para segundo plano as relações interpessoais entre os membros do grupo.
Em termos práticos, ambas as orientações tem vantagens e desvantagens (Noce, 2002). A orientação para a relação é mais eficaz quando estamos numa situação moderadamente favorável. Por outro lado, a orientação para a tarefa é mais apropriada quando a situação é muito favorável ou muito desfavorável (Weinberg e Gould, 1995)”.
Desafios à liderança
“O treinador deve saber de tudo e saber de todos.”
(Toni, 2010)
O autor (Rodrigues, 2016), descreve que “se questionarmos os treinadores sobre “Qual é a maior dificuldade no momento de treinar?”, surgem respostas como:
- Questões sociais, falta de reconhecimento familiar da actividade desportiva;
- Conseguir manter a motivação em todos os jogos;
- Ao treinar equipas amadoras há falta de compromisso de alguns jogadores;
- A falta de capacidade de trabalho dos jogadores;
- A falta de responsabilidade;
- A dificuldade em conseguir um bom ambiente de trabalho e solucionar os problemas do grupo;
- Em momentos de exames ou exigências laborais diminuem a presença nos treinos;
- Apesar de lutarem não têm confiança nas suas possibilidades futuras;
- Problemas na transmissão de alguns conceitos técnicos ou tácticos;
- Falta de formação anterior de qualidade;
- Falta de resiliência;
- Etc.”
Ainda, (Rodrigues, 2016), destaca que o que ressalta “em todas estas respostas é que tocam em aspectos psicológicos e sociais (liderança, inteligência emocional, comunicação, gestão de conflitos, etc.)“. Assim, o autor sustenta que “na actualidade, a grande importância dos aspectos psicológicos e de relação grupal (comunicação, confiança, liderança, motivação, entre outros) está consciente em muitos treinadores, que consideram a formação um elemento chave para o desenvolvimento de um colectivo, quer seja profissional, quer seja amador. Também o desenvolvimento orientado para o individual (treinador/jogador) deve ser alvo de investimento constante em formação”.
Adequação da liderança ao contexto
“Quanto maior poder, maior responsabilidade.”
(Parker, 2002)
O autor acrescenta que “segundo Alves (2000), os líderes excelentes, para atingir as sua metas e optimizar o rendimento do grupo, utilizam estilos de actuação próprios que se designam por estilos de liderança. Em função das características da situação e dos liderados, o mesmo sujeito pode utilizar distintos estilos de liderança (Mendo e Ortiz, 2003)”.
Neste enquadramento, (Ferreira, 2008) estudando o trabalho de Weinberg e Gould (1995), aponta “principais implicações, das abordagens interaccionais mais recentes, para a liderança no desporto:
- Nenhum conjunto de características pessoais ou traços da personalidade assegura, por si só, uma liderança eficaz e bem sucedida (tais características não são suficientes para predizer um líder eficaz);
- Uma liderança eficaz adapta-se às situações específicas (e.g. um treinador despedido de um clube que começa a ter sucesso num novo clube, provavelmente não mudou subitamente os seus comportamentos e estilo de liderança, mas, pelo contrário, o seu estilo de treino adaptou- se melhor ao novo clube e aos seus elementos);
- Os estilos de liderança podem ser mudados, de forma a poderem adaptar-se às exigências da situação.”
Segundo (Ferreira, 2008), “actualmente um dos modelos mais aceites neste domínio foi proposto por Chelladurai (1984, 1990, 1993) – Modelo Multidimensional da Liderança – e reúne todo um conjunto de dados gerais do estudo da liderança num modelo adaptado ao desporto. Assim, no Modelo Multidimensional de Liderança, a performance do grupo e a satisfação dos membros são considerados em função da congruência entre os três estados do comportamento do líder: exigidos, preferidos e actuais (Chelladurai, 1990).”
Segundo (Cid, 2006), “como se pode constatar, através do modelo de multidimensional de Chelladurai de 1978, o objectivo principal da liderança eficaz é possibilitar o rendimento e a satisfação de cada um dos membros da organização desportiva. No entanto, importa saber que para atingir esse objectivo devemos ter em linha de conta que esses factores resultam dos comportamentos do líder (treinador) que são influenciados, não só pelas suas próprias características, mas também pelas características da situação e dos liderados (atletas)”.
A propósito do Modelo Multidimensional de liderança, para (Cid, 2006), e “de acordo com Serpa (1990), Leitão, Serpa e Bártolo (1995), Weinberg e Gould (1995), Samulski (1995), Cruz e Gomes (1996), Alves (2000), Noce (2002) e Dosil (2004), neste modelo a performance e a satisfação do atleta, resultam dos comportamentos do treinador, aqueles que são exigidos pela situação, aqueles que são os preferidos pelos atletas e os comportamentos reais do treinador (adaptativos ou reactivos – conforme a adaptação comportamental do líder às condições do sistema organizacional e as reacções deste às necessidades, desejos e pressões dos atletas). Por sua vez, estes comportamentos podem ser influenciados ou condicionados pelas características do próprio treinador (formação desportiva, capacidade intelectual e instrumental, personalidade, experiência, etc.), pelas características dos atletas (nível de maturidade biológica e psicológica, motivações, idade, sexo, etc.) e pelas características da situação (estrutura formal da organização, objectivos a alcançar, normas e valores em vigor, factores da tarefa ou modalidade, etc.). Em suma, no modelo multidimensional o desempenho e a satisfação dos atletas/grupo são a consequência de uma harmonia entre três estados de comportamento do treinador (líder), que são influenciados pelas suas próprias características, da situação e da dos membros (Chelladurai, 1990). Segundo Alves (2000), a ideia fundamental que sobressai é que quanto maior for a congruência entre o que é pedido ao treinador (tanto pelos atletas, como pela situação) e as suas características, maior será a probabilidade de se obter um clima favorável ao rendimento e à satisfação dos membros do grupo”. O autor (Ferreira, 2008) concorda com esta leitura referindo que “Cruz e Gomes (1996) reforçam que neste modelo, a liderança é encarada e entendida como um processo interaccional, no sentido de que a eficácia do líder tem de ter em consideração características situacionais não só do líder, mas também dos membros do grupo. Assim, a eficácia da liderança pode variar em função das características dos jogadores e das limitações e exigências impostas pela situação ou meio desportivo. Estes autores referem ainda que o Modelo Multidimensional de Liderança de Chelladurai defende que, para além do comportamento do líder, os seus antecedentes e as suas consequências, constituem os elementos principais deste modelo de liderança no desporto”.
Ainda (Ferreira, 2008) explica que “a necessidade de validação do modelo levou a que Chelladurai e Saleh (1978, 1980) desenvolvessem a “Leadership Scale for Sports” (Escala de Liderança no Desporto). Esta escala avalia cinco dimensões dos comportamentos do treinador (líder): comportamento de treino e instrução, comportamento democrático, comportamento autocrático, comportamento de apoio social e comportamento recompensador (“feedback positivo”). No Quadro 1 descreve-se de uma forma mais detalhada, cada uma destas cinco dimensões:”
A eficácia da liderança
“Estar no poder é como ser uma senhora. Se tem de dizê-lo às pessoas, é porque não é verdade”.
Margaret Tatcher, citada por Isabel Vaz em (Lourenço, 2010)
Perante o desenvolvimento da compreensão da liderança e constatação da sua complexidade, torna-se então fulcral identificar a sua eficácia. A empresa de desenvolvimento de líderes (Linkage, 2016) propõe um estrutura de avaliação genérica que pode ser aplicada a qualquer líder de uma organização.
Já no contexto desportivo, de acordo com (Ferreira, 2008), “Feltz, Chase, Moritz e Sullivan (1999) definem eficácia de liderança com base na ideia de que os treinadores acreditam possuir capacidades para influenciar a aprendizagem e a performance dos seus jogadores, englobando na performance as capacidades psicológicas, de atitude e de trabalho de equipa dos jogadores. A eficácia de liderança, para além da preocupação com a aprendizagem dos seus jogadores, foca, também, a importância da sua influência na performance dos seus jogadores em competição.”
O autor (Ferreira, 2008), a propósito da Escala de Liderança no Desporto, acrescenta que “Feltz e colaboradores (1999) consideram que estas dimensões da eficácia de liderança são influenciadas pela experiência e a performance precedente do treinador (e.g., experiência do treinador, preparação do treinador, sucessos antecedentes do treinador), da compreensão das capacidades de cada um dos seus jogadores bem como do apoio social (e.g., escola, comunidade e apoio familiar). Feltz e colaboradores (1999) referem ainda que a eficácia de liderança tem influência no comportamento do treinador, na satisfação do jogador com o seu treinador, na performance dos jogadores, no comportamento e na atitude do jogador bem como no nível de eficácia do jogador.”
De acordo com (Brandão, et al., 2009), “pesquisadores da Universidade de Ohio utilizaram o questionário de Descrição de Comportamento de Liderança para descrever como líderes se comportavam em organizações comerciais, militares, educacionais e governamentais. Verificaram que, a maior parte do que os líderes fazem se enquadrar em duas categorias: consideração e estrutura inicial. Consideração refere-se à amizade, confiança mútua, respeito e afectividade entre o líder e os subordinados e, estrutura inicial a comportamentos como estabelecer regras e regulamentos, canais de comunicação, métodos de procedimento e padrões bem-definidos de organização para atingir metas e objetivos. Portanto, verificaram que líderes bem-sucedidos tendem a ter valores altos tanto em consideração quanto em estrutura inicial”. Os mesmos autores referem ainda que “para que o líder desportivo consiga que os membros da sua equipa desempenhem, com o máximo esforço, a busca dos objectivos é fundamental que ele possua certas características de personalidade listadas a seguir (Brandão & Valdés, 2005):
- Entusiasmo: treinadores com alto grau de entusiasmo tendem a influenciar positivamente os seus desportistas;
- Integridade: os desportistas necessitam confiar que seu líder está comprometido com o trabalho que desenvolve, é honesto e fala sempre a verdade;
- Sentido de propósito e direcção: um bom líder de grupo precisa ter domínio do treino e conhecimento da modalidade que trabalha;
- Disposição: para poder suportar a demanda física e psíquica o treinador precisa ter muita disposição e uma alta capacidade para trabalhar com os estímulos requeridos;
- Coragem: um treinador necessita ter determinação para tomar decisões e seleccionar, entre várias possibilidades, as acções mais adequadas para o momento.”
Segundo (Ferreira, 2014), “de acordo com o Psicólogo Pedro Almeida (SL Benfica), três das grandes valências/qualidades/competências essenciais do Treinador para liderar uma equipa são:
- Comunicação;
- Preocupação com os Outros;
- Compromisso Emocional”.
Neste contexto, (Cid, 2006) refere que “dois factores são fundamentais, para ter êxito como treinador/líder é necessário ser bom comunicador e ter uma boa coesão de grupo (Dosil, 2004). Martens (1987) também reforça este ponto, treinar as competências de comunicação e melhorar as relações interpessoais são as pedras basilares para o sucesso da liderança no desporto”.
O mesmo autor descreve que “para além desses factores, Murray (1991), Cruz e Gomes (1996) e Noce (2002), sugerem algumas linhas de orientação prática que se baseiam em 3 estratégias principais:
- Nova Concepção de Sucesso – dado que um dos poucos factores que os atletas podem controlar é o seu esforço e empenho, podemos fazer equivaler o conceito de sucesso à ideia de “dar o máximo de esforço“;
- Abordagem Positiva face ao Treino – a utilização do reforço positivo pelo esforço, pelo desempenho e pelo encorajamento após o erro motiva melhor o sujeito face às suas dificuldades, cria um clima muito mais agradável e diminui a ansiedade e o stress;
- Percepção mais Realista dos Comportamentos – só com uma percepção realista e correcta das suas condutas é que o treinador pode melhorar e modificar os seus padrões de comportamento, no sentido de ir ao encontro das preferências dos seus atletas;”
Para (Cid, 2006), “como se pode verificar, não é tarefa fácil o desenvolvimento da liderança no desporto, uma vez que as variáveis envolvidas neste processo são inúmeras. No entanto, num aspecto concordamos com Dosil (2004, pp. 229), a conjugação destas variáveis pode ser “a chave do êxito ou fracasso de uma equipa ou desportista”. Porém, seja o contexto mais ou menos caótico, é função do Líder, estabelecer uma ordem. Por exemplo, uma forma de alcançar este objectivo passará por antecipar e forçar determinados comportamentos de forma a estabelecer regras e traçar fronteiras para o futuro.
Ainda (Cid, 2006) citando (Alves, 2000, pp.133) “a liderança eficaz passa por uma grande flexibilidade na adopção do estilo adequado a cada situação e pelo desenvolvimento de uma cultura própria do grupo que una todos os seus membros à volta dos mesmos objectivos”.
O treinador (Mourinho, 2010), defende que a liderança deverá ter duas vertentes, pois deverá ser “uma liderança humana, no sentido em que lidero um grupo de homens todos diferentes – idades diferentes, QI diferentes, diferentes a todos os níveis… E, nesse sentido, tenho de me adaptar a todos eles. Por outro lado, a minha liderança é intransigente nos seus objectivos. Lidero um grupo que quer vencer, e sem liderar não se vence. Tento em todos os meus actos de liderança ser humano, mas ao mesmo tempo intransigente”.
Segundo (Casarin, et al., 2010), o treinador deve implementar “aquilo a que chamamos uma “Ditadura democrática”, ou seja, sermos capazes de seguir o nosso plano de trabalho e as suas linhas orientadoras de forma rigorosa mas sempre dando a ideia de que todos são parte fundamental no desenrolar do mesmo”. Para os autores, referenciando (Goleman et al., 2002), “o objectivo central da liderança consiste em gerar e compartilhar sentimentos positivos entre todos. Assim, o líder deve estar em sintonia com os seus liderados, influenciando-os e motivando-os em todos os âmbitos do treinar / jogar”. Assim, segundo os autores, o líder, “deve ter a capacidade de fazer com que as suas decisões pessoais sejam encaradas ou compreendidas pelos jogadores como uma decisão de todos e conduzi-los na direcção que mais convém, para tal é fundamental demonstrar competência técnica e ser uma parte sempre activa no desenrolar das aquisições vivenciadas dos princípios de jogo”.
Segundo Patrick Barclay em (Mourinho, 2012), “ser tecnicamente um bom treinador é uma coisa. Mas o que dá o efeito extra se os jogadores te amam? E amor não é uma palavra demasiado forte.” Nesta lógica, perante o momento em que José Mourinho abraça Marco Materazzi após o último jogo do treinador português no Inter de Milão, Desmond Morris em (Mourinho, 2012), descreve que “vê um homem que não está mais a encenar. Eu sei que ele sabe está ali uma câmara, mas á algo nisto que é verdadeiramente genuíno. A sua ligação aos jogadores é extraordinariamente emocional e funciona nos dois sentidos. Eles sentem amor por ele que nunca ouvi expressar por qualquer outro treinador”.
Na opinião de (Sérgio, 2012), “no Futebol tudo depende do líder e tudo depende do jogador. Ser líder, fazer-se admirar, saber comunicar, eu julgo que há qualidades inerentes… eu tenho uma frase, costumo dizer que: é o homem que se é que triunfa no treinador que se pode ser”.
O autor, (Neto, 2012) destaca que “pouco ou nada educativo é um desporto se este se exprimir exclusivamente nas suas componentes física, táctica, técnica e normativa. Um desporto confinado à sua lógica performativa, sem atender à complexidade que resulta da interacção entre diferentes sujeitos, entre estes e o meio – familiar, clubista e outros – à complexidade que é inerente à própria singularidade dramática de cada um dos praticantes (…)”.
O treinador escocês Alex Ferguson, em (Brackley, 2011), defende que o treinador nunca deve desistir daquilo em que acredita, “não mudes essa crença, porque se o fizeres estás-te a arruinar a ti. Eu nunca faria isso, sempre fiz aquilo em que acreditava estar certo”.
Sub-dimensões da liderança eficaz
Segundo (Lança, 2016), “a liderança de equipas, pela complexidade e ambiguidade em que é exercida, continua a apaixonar muitos de nós, bem como a liderança do treinador, que é um dos campos de análise e discussão mais fascinantes num ambiente altamente competitivo. É difícil descrever todos os desafios e funções de um treinador. Construir uma relação e influenciar o desenvolvimento psicológico do atleta, passar confiança, conseguir compromisso, possuir o domínio das competências técnicas, táticas, interpessoais como a inteligência emocional, motivar e inspirar, gerir conflitos e alinhar a equipa no objetivo comum, manter a sinergia e um sentimento de pertença”.
Propomos a seguinte representação da liderança eficaz, adaptada do autor (Martens, 1987), citado por (Cid, 2006):
Na opinião do autor (Cid, 2006) “nenhuma das quatros componentes atrás mencionadas pode ser entendida isoladamente, todas fornecem um contributo importante para a compreensão do que pode ser um processo de liderança eficaz (Weinberg e Gould, 1995)”. Estando de acordo com esta perspectiva, e da mesma forma que entendemos que as dimensões da intervenção do treinador (liderança, metodologia de treino e modelo de jogo) estão em permanente interacção exaltando-se dessa interacção a competência do treinador, como por outro lado, também no rendimento do jogador, no qual a táctica também aí se torna a expressão da interacção das restantes dimensões (técnica, psicológico, físico e dimensões complementares), na especificidade da liderança entendemos que a lógica, subjacente a um pensamento complexo, deve ser a mesma. Deste modo, de uma interacção de qualidade destas quatro dimensões apontadas por Martens, resultará uma liderança eficaz.
Perante estas sub-dimensões, parece-nos interessante dividir o tema liderança na lógica desta perspectiva, sendo no entanto, apenas uma forma possível de organizar estas ideias.
“Liderar é servir.”
Isabel Vaz em (Lourenço, 2010)