Qualidade de jogo II

Na passada semana demos destaque ao Shakhtar Donetsk e ao trabalho desenvolvido por Paulo Fonseca e a sua equipa técnica. Pelo apuramento para os oitavos de final da Liga dos Campeões, mas principalmente pela qualidade de jogo apresentada. Ainda por cima quando disputava esse apuramento contra duas das actuais melhores equipas da Europa. É notória e notável a qualidade ofensiva da equipa Ucraniana, que esteve em grande destaque no derradeiro jogo contra o Manchester City. Porém, como sublinhámos nas palavras de Vítor Frade, no futebol actual, é fundamental a preocupação por um equilíbrio entre os vários momentos do jogo. Apenas dessa forma uma equipa consegue ser consistente e apresentar qualidade de forma regular.

Jorge Maciel, em 2011, referia um aspecto muito importante, “que passa pela coerência e pelo respeito pela inteireza inquebrantável que o jogar deve manifestar de modo a que se expresse de forma fluída, dinâmica, ou seja que revele ao nível da matriz conceptual articulação de sentido com um determinado sentido”. Desde modo, Maciel defendia que uma sua equipa “deve evidenciar um padrão zonal pressionante, capaz de provocar erros nos adversários forçando desse modo a perda da posse de bola. Não nos devemos acomodar à ideia da necessidade de defender, de um modo “extremista”, a equipa deve ter aversão a defender, ou seja deve ter repulsa relativamente à necessidade de defender, mas simultaneamente e paradoxalmente tem de se sentir confortável quando o tem que fazer. Para isso tem de defender com qualidade para que os momentos em que se vê obrigada a defender sejam curtos, porque induzimos o adversário a errar, mas claro sempre com critério e organização colectiva, respeitando uma organização posicional que melhor nos permita atacar e estar compactos quando temos de defender, o que passa por um escalonamento em várias linhas tanto em profundidade como em largura. Além disso, a equipa tem de reconhecer indicadores de pressão saber atrair e direccionar os adversários para pressionar com êxito, reduzir o campo sabendo nessa intenção jogar com o fora-de-jogo, o que é diferente de jogar em fora-de-jogo. Fundamentalmente, queremos “mandar sempre”, mesmo quando não temos bola.”

Se tal já sucedia no Braga de Paulo Fonseca, também no Shakhtar os momentos defensivos são de grande qualidade e estão ao nível dos ofensivos. Tanto, que o realizador do jogo focou a “dança” da última linha dos ucranianos em determinado momento da partida.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1896219290407329/

Em 2014, Matías Manna, a propósito do Bayern de Munique de Guardiola, explicava que este assumia “riscos como ninguém. Boateng mantém a linha, sempre atento ao brasileiro. Na arte da defesa em linha, as equipas de futebol, que são corajosas em todos os momentos do jogo, também podem dar um bom espectáculo. Quando uma equipa adversária faz um passe para trás, Guardiola gesticula para a sua equipa subir. Quando o adversário que tem a bola e está pressionado pelos Avançados e Médios do Bayern, a Defesa sobe. Quando o adversário procura jogar longo, os Defesas-Centrais esperam, aguardam, e passam para a frente dos Avançados adversários, deixando-os fora-de-jogo. Não há espaço. Gestão do espaço é um conceito de Cruyff. Outro conceito para os Alemães que decidiram sempre fazer outra coisa na Defesa. Contra-cultural ou contra-natural. Guardiola decidiu extremar comportamentos para não dar espaço aos seus adversários. Tudo sob o olhar temeroso de Beckenbauer, acostumado a outros hábitos (…)”. O autor (Bouças, 2017) reforça que “encurtar o espaço entre sectores, aumentando o espaço que fica nas costas da última linha requer uma concentração mental permanente, e um jogo de orientação corporal eficiente, para que se possa baixar rapidamente sem perder metros para os avançados que se movem para receber entre defesas e guarda redes.”

“É isto que faz a diferença. É perceber o momento em que a bola está sem pressão e está em condições de entrar na profundidade. Esse é que é o momento de controlar a profundidade. Porque antes disso tem de ser de redução da profundidade, tem de ser de ganho da bola, tem que ser de ataque à zona da bola para ganhar.”

Vítor Pereira, 2016

Qualidade de jogo

É uma discussão permanente definir o que é qualidade de jogo no Futebol. Isto porque o conceito é muitas vezes associado à dimensão estética do jogo, e essa é naturalmente subjectiva e consequência das experiências, cultura, valores e sentimentos pessoais. Contudo se estamos perante uma actividade que exige rendimento, qualquer estética não sobrevive sozinha. Vítor Frade, 2013, descreve que “só se pode estar a Top estando sistematicamente preocupado com a objectividade, com a eficácia, com a eficiência. Agora tendo em conta o que é o futebol, eu tenho que estar permanentemente perturbado, estando preocupado com isso, e também estando permanen­temente preocupado com a estética do jogo. E a estética é a coisa mais nuanciável para que a objectividade seja objectividade. Se eu exagero na perda da estética vou perder aí, se eu exagero no aumento da estética vou perder ali, e isso é que não é para qualquer um. (…) sou um obcecado pela eficácia porque só se está no alto rendimento se se for eficaz, se se ganhar, mas eficácia é o resultado da eficiência, e a eficiência é o aparecimento regular de urna forma de fazer aparecer as coisas! E essa eficiência, e por isso eu disse, ser um angustiado e perturbado permanentemente pela estética. Portanto, a eficiência tem a ver com a estética, mas têm que se pesar as duas coisas!

Vítor Frade descreve ainda que “depois já iríamos para o lado estético do Jogo, nas dimensões colectiva e individual! Portanto, isto tem a ver, o que estou a evidenciar, com a eficiência e eficácia mas depois… isto é importante e sem isso não vale a pena pensar as coisas, porque eu penso o treino e jogo para ganhar, e por isso digo que estou permanentemente preocupado com a eficácia e a eficiência, mas continuadamente preocupado também, e até perturbado com o problema estético! Eu revejo agora o Brasil de 80, de 82 e dos anos 70, e deleito-me a ver aquilo. Mas aquilo não é absolutamente transferível para os dias de hoje? Em termos de ataque é, agora eu tenho é que ter preocupações com os equilíbrios da equipa, que eles não tinham naquela altura, porque não era preciso, para continuar a ganhar.

Na presente edição da Liga dos Campeões, três das equipas que reconhecidamente, actualmente apresentam melhor qualidade de jogo tendo em conta o trinómio Estética-Eficácia-Eficiência competiram no mesmo grupo. Assistimos, muito provavelmente ao futebol que aí vem. O tal que Vítor Frade aponta “para continuar a ganhar”. Um dos comandantes por trás deste sucesso é português, com naturalidade para nós dada a consciência que temos para o quanto os portugueses contribuíram nos últimos anos para a evolução do treino e do jogo. Contudo a coragem que sempre manifestou, não é para todos.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1882724075090184/

Para fazermos uma equipa funcionar, para fazermos uma verdadeira equipa, nós temos que ter os onze jogadores com a coragem de ter iniciativa, terem a coragem de quererem a bola, a coragem de quererem assumir o jogo”.

Paulo Fonseca, no programa ReporTV, “O Jogo”, 2016

Drible Túnel

Organização Ofensiva | Acções individuais ofensivas | Drible + Túnel | Neymar 2017

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1867139283315330/

Saber sobre o saber jogar de… Kevin De Bruyne

Kevin De Bruyne deu uma fantástica entrevista a Jamie Redknapp na antevisão do Manchester City x Arsenal. Ninguém melhor para falar do jogo do que aqueles que o vivenciam e que sobretudo revelam conhecimento sobre o mesmo através da suas decisões dentro do campo. É uma realidade que a qualidade de muitos deles restringe-se à esfera do “saber fazer”. Porém, De Bruyne mostra mais, uma consciência sobre o jogo, e portanto o tal “saber sobre o saber fazer”. Provavelmente muito fruto da inteligência táctica que manifesta, porém será também consequência da liderança e metodologia de Pep Guardiola. Urgem mais programas deste género e a abertura para o diálogo com esta frontalidade.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1848230981872827/

“Se toda a gente na equipa “compra” o modelo tudo fica mais fácil.(…) Tem que haver muita confiança entre nós para que o modelo resulte.”

“É posse com sentido. Guardiola odeia a palavra posse. É um jogo de passes para muitas vezes descobrir-me a mim e ao David Silva para que possamos criar. Ele não gosta da posse pela posse, a não ser para controlar o final dos jogos.”

“É esta confiança… (no início da construção) toda a gente tem de estar na sua posição para criarmos os espaços necessários.”

“O sistema varia todos os jogos um pouco. Naquele jogo ele disse para o Leroy e Raheem ficarem abertos até termos a bola no último terço e aí fariam o que quisessem. No início a intenção era fazer com que o Azpilicueta e o Alonso ficassem o mais baixos possível e assim ficávamos com superioridade numérica numa estrutura 3:4:3 com o Kyle Walker e o Fabian Delph a virem para dentro e o David Silva a jogar como número 10. Portanto depende sempre de como a outra equipa se organiza.”

“(Em construção) há muitas situações a 1 e a 2 toques, o jogo flui e toda a gente se movimenta em conjunto. (Em criação) nós podemos fazer o que quisermos. Não há uma restrição. Podemos ir para dentro, para fora, finalizar ou criar alguma coisa.”

“(já perto da área adversária, quando recebo um passe atrasado vindo do corredor lateral), primeiro olho para o lado contrário para perceber o que está a acontecer. Jogamos muito de um lado e toda a gente do lado contrário está a fazer um movimento. E depois sinto que se rematar eles vão bloquear o remate e sei que o David, Raheem ou Leroy vão também fazer o movimento e então é um pouco como saber e tentar ver se estão a fazê-lo e… confiar na equipa. Se não é um passe ridículo. Mas toda a gente estava com o mesmo pensamento, a mesma ideia e aqui foi muito bom.”

“Gosto mais de assistir do que de marcar. Dá-me outro sentimento. Marcar é sempre um grande sentimento, mas assistir é também algo especial para mim. Acho que se dá pouco crédito à assistência.”

“(quando alguém se está a desmarcar em ruptura) eu vejo-o. Não o vejo claramente, mas vejo-o a correr e já sei antes o que vai acontecer.”

“Assistir é um instinto que temos que ter no jogo. Leva tempo a perceber o que eles preferem. Joguei com um jogador, Bas Dost, ele era muito forte na área e eu só tinha que cruzar todo o tempo porque ele ia lá estar. Mas com o Sergio Agüero é diferente, com o Gabriel Jesus é diferente, então preciso de saber o que eles gostam. Se gostam mais no pé, Raheem ou Leroy gostam mais no espaço. O caminho é aprender o que eles gostam e como serão favorecidos perante as suas qualidades.”

“É uma questão de tomar decisões. Eu gosto de ver a NBA, sou um grande fã. Muitos jogadores jogam no físico, mas eu sou um grande fã do Lebron James, que pode fazer o que quiser, mas ele tenta sempre tomar a melhor decisão para a equipa. É o que eu gosto de fazer.”

“(nos livres directos) é algo que o staff técnico sempre nos transmitem. Se a barreira tem a tendência de saltar ou não.”

“acho o David Silva muito subvalorizado. Ele é classe. Jogou mais de cem jogos pela Espanha e ganhou tudo por eles. Ele dá-me o equilíbrio perfeito. Aprendi muito com ele a conservar a bola. Quando cheguei era um jogador de maior risco, de aproveitar e criar oportunidades, mas também perdia a bola mais vezes.”

“(a propósito da quantidade de passes bem sucedidos) nós fazemos sempre muitos meinhos. É estranho veres um treinador fazer meinhos como estes. Para ele isto é a “masterpiece” do futebol. Se fores bom a fazê-lo vais jogar bem no jogo. Normalmente fazêmo-lo no aquecimento. Não são permitidos toques da calcanhar e são sempre passes simples. Ele quer que os que estão no meio corram. Se fizermos 60 passes eles vão correr.”

“Nós agora jogamos com o Kyle Walker que é muito ofensivo. Às vezes temos que estar na posição dele. Podemos trocar, Kyle avança, os alas aparecem mais como médios-ofensivos e eu não fico como Defesa-Direito, mas fico num espaço intermédio. Funciona para manter a posse e parar os contra-ataques adversários.”

“Fisicamente mais forte”

Quantas vezes ouvimos e lemos a expressão… “o jogador x é fisicamente mais forte”. Mas o que isso significa exactamente no jogo de futebol? A qualificação atribui-se à morfologia? Às qualidades físicas? Ou à influência que a “imagem” morfológica, misturada com a agressividade, terá na mente dos adversários?

Se falamos de morfologia, face às leis do jogo, nas quais o único contacto físico permitido será no ombro a ombro, diga-se, acção rara ao longo do jogo, então a mesma torna-se pouco importante. A excepção é o jogo aéreo, onde ser-se mais alto pode ser relevante. Mas mesmo nesse caso, nem sempre. Antecipar o local onde a bola vai cair, calcular o tempo de salto ideal, garantir a melhor impulsão, ser corajoso para disputar uma bola, muitas vezes, no meio de um aglomerado de jogadores, e a técnica de cabeceamento, são exemplos de qualidades que serão bem mais decisivas na disputa do jogo aéreo do que apenas ser-se mais alto.

Quanto às qualidades físicas, sendo obviamente relevantes, desligadas de boas decisões em jogo, tornam-se no futebol, também obsoletas. Neste sentido, (Sampaio, 2013) defende que “no futebol, ao contrário de muitos desportos, não há um estereótipo de “atleta”. Como exemplo, na prova de 100 metros do atletismo, é normal vermos atletas altos e musculados; na maratona é normal os atletas serem muito magros; no futebol não é assim, o jogador de futebol não é um atleta, simplesmente é jogador de futebol. Alguém pode dizer que Pirlo, Xavi, Aimar, Messi, David Silva, etc., são atletas? Eu não acho que sejam, simplesmente são jogadores de futebol”.

Por outro lado, a influência da dimensão física na dimensão psicológica reflecte, não só a complexidade do jogo, mas no fundo a complexidade humana e o “erro de Descartes” que “segundo Damásio, terá sido a não apreciação de que o cérebro não foi apenas criado por cima do corpo, mas também a partir dele e junto com ele”, (Wikipédia, 2016). Nesta perspectiva, no futebol, o jogador ser fisicamente mais forte, não é relevante. O que será relevante é ser-se complexamente mais forte. E se assumirmos que a dimensão táctica, como Vítor Frade postulou, “não é psicológica, não é física, não é técnica, mas necessita de todas elas para se manifestar”, então, ser-se mais forte neste jogo significa ser-se mais forte tacticamente, que surge da interacção da morfologia com as qualidades físicas, com a mentalidade, com o conhecimento do jogo, o domínio da execução, etc. Conclui-se então que o aspecto ou o desempenho estritamente físico… garante pouco para este jogo.

Lionel Messi, Xavier Hernández, Andrés Iniesta, Andrea Pirlo, Pablo Aimar, Luka Modric e tantos outros, comprovaram tudo isto jogo após jogo, sendo mais fortes que os seus adversários. Aqui, Modric, não necessitou do ombro a ombro para recuperar a bola.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1828831890479403/

“O indivíduo todo, inteiro

emerge da cultura táctica

que sustenta o bom jogo, primeiro

no jogar o jogo como prática!”

(Frade, 2014)

Uma reacção ao ganho da bola… intensa

Em vez de bater a bola longa no corredor lateral, como a maioria dos jogadores fariam, e que provavelmente o levaria à perda da bola, Luka Modrić faz diferente e não só mantém a posse de bola como permite a opção pelo contra-ataque à equipa.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1807625819266677/

Intensidade… no futebol… não é fazer muito ou depressa. É fazer bem no tempo certo.

Momentos e Sub-Momentos do jogo… uma proposta

Como prometido no passado, publicamos a nossa interpretação do jogo de futebol e proposta para a sua sistematização.

Em primeiro lugar poder-se-á questionar a relevância de sistematizar o jogo de e interpretá-lo teoricamente. Apesar do próprio jogo mostrar caminhos e promover a auto-aprendizagem, potenciar essa aprendizagem com outras ferramentas, é para nós fundamental, nomeadamente no papel de treinador. Neste sentido, um modelo simples que explique os momentos do jogo e a sua ligação, garantirá uma enorme ajuda à compreensão do jogo e ao seu ensino aos jogadores.

Isto, independentemente da idade e nível de jogo em que trabalhamos, uma vez que vão surgindo diversos exemplos de alto e baixo conhecimento do jogo em todos os escalões etários e níveis competitivos. Porém, o jogador não se constitui como o único destinatário deste trabalho. Todos os que gostam do jogo, e desejam compreender um pouco mais a sua complexidade e dinâmica, acreditamos que vão encontrar nesta sistematização um caminho acessível.

Para o próprio treinador, não só permite, a partir daqui, uma organização mais complexa das suas ideias de jogo (princípios, comportamentos, acções, etc.) dentro de cada sub-momento do jogo, como também lhe permite categorizar exercícios de treino face à interpretação da sua dominância. Consequentemente, esta proposta, possibilita ainda ao treinador ou ao analista catalogar videos de acções de jogo da sua equipa ou de terceiras de forma acessível. Este tem sido um trabalho que temos desenvolvido, o qual já nos possibilitou uma biblioteca que ultrapassou o milhar de vídeos, e que entre outros objectivos, servirá para ilustrar os comportamentos de jogo defendidos no tema do nosso projecto, a publicar futuramente – Ideia de Jogo.

A sistematização do jogo de Futebol já leva uma considerável história. Desde o momento em que outras modalidades contribuíram para o desenvolvimento da teorização do jogo, destacando-se os trabalhos de Friedrich Mahlo,  Leon Teodorescu e Jean-Grancis Grehaigne, passando pelo contributo fundamental em Portugal de Carlos Queiroz e Jesualdo Ferreira, quando em 1983 apresentaram uma proposta de sistematização do jogo de Futebol, à actual visão do jogo sob quatro momentos fundamentais: Organização Ofensiva, Transição Defensiva, Organização Defensiva e Transição Ofensiva, que entretanto se generalizou.

Momentos do jogo

A nossa proposta surge, não só de uma necessidade de desconstruir os momentos de organização para que sejam mais facilmente entendidos e treinados, como principalmente explicar os momentos de transição, os quais, apesar de actualmente aceites e reconhecidos pela sua importância capital no jogo, geram no entanto, ainda muitas dúvidas e por vezes interpretações erradas.

Explicando-a concretamente, a partir dos quatro grandes momentos de jogo, criámos três sub-momentos para cada um deles. Nos momentos de Organização, sentimos que a proposta de Queiroz e Jesualdo continua a garantir resposta para as necessidade desses momentos do jogo. No entanto, necessitámos de distingui-los de forma mais objectiva, uma vez que nos fomos apercebendo de visões muito díspares do que seriam a construção, criação, finalização e em oposição, o impedir a construção, impedir a criação e impedir a finalização.

Assim, no momento de Organização Ofensiva, identificado pela cor verde, entendemos os três sub-momentos:

  1. Construção: quando ambas as equipas se encontram dentro da sua organização para atacar e defender e quando a bola se encontra fora do bloco da equipa que defende.
  2. Criação: quando a equipa que ataca consegue penetrar no bloco da equipa que defende e surge perante a última linha adversária ou a última linha e mais um médio em contenção. A excepção é quando a equipa que ataca procura um jogo mais directo, de ataque à profundidade, ou seja, de passe directo para o espaço entre a última linha de quem defende e o seu Guarda-Redes, o que acaba por se configurar como uma situação de último passe, independentemente do grau de dificuldade superior da acção. Neste sub-momento, integram-se também todas as situações de bola parada ofensivas que poderão permitir um último passe ou cruzamento e finalização. Devemos referir que compreendemos as opiniões que distinguem as situações de bola parada como um quinto momento do jogo, porém a nossa interpretação é que, independentemente do jogo estar parado ou em movimento, se uma equipa está organizada para defender essas situações e a outra para atacar, então estarão dentro da sua Organização Defensiva e Organização Ofensiva, respectivamente.
  3. Finalização: todas as acções que visam o momento final de ataque à baliza adversária, portanto, a acção individual ofensiva de remate, independentemente da superfície corporal envolvida. Aqui também se integram as situações de bola parada ofensivas que poderão permitir um remate directo à baliza. Importa ainda referir que a finalização pode até surgir quando a equipa que ataca tem pela frente todo o bloco adversário ou parte do mesmo. Contudo, se quem ataca conseguiu chegar ao remate, esses momentos de organização defensiva adversários falharam de alguma forma.

Em oposição o momento de Organização Defensiva, identificado pela cor vermelha, sub-divide-se em três sub-momentos que irão procurar garantir oposição aos anteriores comportamentos ofensivos:

  1. Impedir a construção: os momentos em que a equipa que defende procura não permitir a entrada da bola no interior do seu bloco. Os comportamentos de pressing, quer seja alto, médio ou baixo, são um bom exemplo para este sub-momento defensivo.
  2. Impedir a criação: quando a equipa que defende não consegue impedir que a bola entre no interior do seu bloco e a sua última linha é a penúltima barreira entre si e a sua baliza. Ou então as acções que visem impedir ou interceptar um passe longo e directo para o espaço entre a última linha da equipa e o seu Guarda-Redes.
  3. Impedir a finalização: quando toda a equipa, menos o Guarda-Redes, foi ultrapassada. Portanto, contrapondo ao sub-momento ofensivo de Finalização, aqui, a última barreira é o Guarda-Redes e os seus comportamentos de defesa da baliza.

Esta proposta de distinção entre os momentos de construção e criação, parece-nos altamente pertinente. Durante muito tempo apercebemo-nos que muitos autores e treinadores identificavam estes sub-momentos / fases pelo espaço do campo onde as equipas atacavam e defendiam. Essa interpretação parece-nos errada, uma vez que uma equipa pode estar em construção junto à sua área ou perto da área adversária, pois nos dois casos, perante por exemplo adversários que respectivamente defendam com o seu bloco, posicionado alto ou baixo no campo, poderá estar com todos os jogadores adversários ainda por bater. Por outro lado, uma equipa que posicione a sua última linha alta no campo, um momento de ruptura ou último passe de quem ataca pode surgir ainda no meio-campo de quem ataca. Deste modo, a correlação dos sub-momentos ofensivos e defensivos com espaços no campo está para nós desfasada da realidade que é o jogo. Então, a relação entre as duas equipas, e se quem defende ainda está usar toda a sua organização defensiva ou apenas parte da equipa, e se ao contrário, quem ataca ainda tem duas / três linhas adversárias para ultrapassar ou apenas uma, parece-nos uma visão mais aproximada da interacção e realidade dinâmica que o jogo promove, e assim um melhor caminho para distinguir esses sub-momentos ofensivos e defensivos do jogo.

Mas será nos momentos de transição que a nossa proposta pretende ir mais longe. Independentemente da interpretação dos sub-momentos / fases, da Organização Ofensiva e Defensiva, já Carlos Queiroz e Jesualdo Ferreira procuraram sistematizar essas estruturas complexas do jogo. Há cerca de 15 anos atrás, com a difusão e aceitação dos momentos de transição, surgiram então mais dois momentos do jogo para compreender. Neste âmbito tem surgido alguma confusão de conceitos, e simultaneamente sentimos a necessidade de interpretar a Transição Defensiva e a Transição Ofensiva de forma a encaixar-lhes comportamentos e acções, para posteriormente explicar a sua lógica aos jogadores e trabalhá-los pelo Modelo de Jogo que cada treinador idealiza. Neste sentido, sentimos ainda a necessidade de lhes atribuirmos uma lógica sequencial teórica, tal como sucede nos dois momentos de Organização.

Desta forma, para o momento de Transição Defensiva, para nós representado pela cor amarela, propomos os três sub-momentos:

  1. Reacção à perda da bola: os instantes, ainda no centro de jogo, imediatos à perda da bola. Os comportamentos defensivos a adoptar nessa situação. Para a maioria dos treinadores, o objectivo fundamental será não só tentar de imediato a recuperação da bola, mas não permitir ao adversário a possibilidade de contra-atacar. Portanto, impossibiltá-lo ou atrasá-lo em sair com a bola dessa zona de pressão e procurar espaços para desenvolver o contra-ataque.
  2. Recuperação defensiva: na tal lógica sequencial, se o adversário conseguiu sair da zona de pressão, independentemente dos jogadores fora do centro de jogo (primeira zona de pressão) já deverem está a fechar a equipa e a recuperar o seu posicionamento defensivo, neste sub-momento, torna-se ainda mais importante a recuperação do máximo número de jogadores, contemplados pela organização defensiva da equipa, para trás da linha da bola. Alguns poderão até estar a compensar companheiros, mas a urgência é não permitir espaço nem número vantajoso ao adversário para desenvolver situações de contra-ataque. A própria falta táctica pode ser contemplada neste sub-momento do jogo.
  3. Defesa do contra-ataque: se ambos os sub-momentos anteriores da transição defensiva falharam, então, antes das acções de defesa da baliza do Guarda-Redes, a equipa tem ainda a possibilidade de defender o contra-ataque adversário. Perante relações numéricas diferentes, poderão ser adoptados comportamentos que poderão reduzir as possibilidades de sucesso de quem ataca. Tal como, em oposição, o contra-ataque, estas são situações muito trabalhadas no Futsal, dada a quantidade de situações deste género que surgem nesse jogo. Porém, se no Futebol elas não só surgem, como são decisivas nos desfechos dos jogos, porque não devem também ser alvo de treino?

Em oposição ao momento de Transição Defensiva, surge então o momento de Transição Ofensiva, para nós representado pela cor azul, e ao qual propomos três sub-momentos:

  1. Reacção ao ganho da bola: em oposição à reacção à perda da bola, surgem neste sub-momento os comportamentos e acções de quem recuperou a bola, e a procura de sair da primeira zona de pressão adversária. Seja ela realizada por um jogador ou por mais. Se possível, alcançá-la no sentido da baliza adversária, porém, em muitos momentos, esses espaços encontram-se fechados e portanto será necessário garantir outras soluções e uma boa decisão do jogador com bola. A eficácia na reação ao ganho da bola e na saída da zona de pressão influenciará os sub-momentos seguintes da transição ofensiva, que aqui, provavelmente, já não surgem numa lógica sequencial, mas sim como alternativas de decisão.
  2. Contra-ataque: se a equipa conseguiu sair com eficácia e rapidamente da zona de pressão, poderá encontrar espaço e / ou uma relação numérica com o adversário interessante para optar pelo contra-ataque. Nesse caso, é nosso entender que deverá explorá-lo na larga maioria das situações, procurando as suas vantagens, pois parece-nos mais difícil ultrapassar uma boa organização defensiva adversária. As excepções irão surgir por influência da dimensão estratégica. Neste caso, por exemplo, quando uma equipa se encontra com uma vantagem mínima no resultado ou numa eliminatória, está a poucos minutos do final do jogo, e não lhe interessa explorar uma situação de contra-ataque, que em caso de insucesso irá, provavelmente, lhe retirar na resposta do adversário alguns jogadores da sua organização defensiva, e mais importante, porque privilegiando a posse de bola, não só poderá descansará com bola, como retirará a possibilidade de atacar ao adversário.
  3. Valorização da posse de bola: se após a saída da zona de pressão a equipa não encontrar espaço e / ou uma relação numérica interessante para atacar a baliza adversária, deverá evitar a decisão de contra-atacar numa situação desvantajosa e possivelmente perder a bola. Ao invés, deve assim garantir a sua posse, ganhando tempo para se reorganizar para atacar, procurando esse momento seguinte do jogo para criar desequilíbrios na organização adversária.

Pelas ideias apresentadas, propomos a seguinte representação gráfica dos momentos e sub-momentos do jogo:

Momentos e Sub-Momentos do jogo.

Interpretando o jogo desta forma, para nós não faz sentido catalogar uma equipa como “uma equipa de contra-ataque” ou uma “equipa de ataque organizado“. Todas as equipas têm de saber jogar em todos os momentos e sub-momentos, para que possam responder às necessidades circunstanciais que o jogo lhes vai apresentando. Contudo, partindo deste modelo, cada treinador, acreditando nas suas ideias, procurando uma adaptação à qualidade, cultura e características individuais dos jogadores com quem irá trabalhar, poderá desenvolver o jogo idealizado, de forma a responder a estes momentos e sub-momentos, o que consequentemente potenciará o seu jogo para mais ou menos tempo nalguns destes momentos e sub-momentos. Assim, procurando ir aos extremos, acreditando num jogo curto e apoiado ou longo e directo, na defesa zona ou na defesa individual, todas as ideias podem ser concebidas a partir deste modelo.

Sentimos ainda que a nossa proposta não se esgota no jogo de Futebol e que poderá ter transfer para outros desportos colectivos, nomeadamente os com características de invasão do meio-campo adversário.

Deixamos ainda um video que procura ilustrar diferentes comportamentos, identificando os momentos e sub-momentos do jogo propostos:

 

“O risco é não arriscar”

 

“Há um género de pessoas que, em dívida para com uma tradição que os ensinou a respeitar certas leis caducas, não conseguiram nunca perceber, não obstante as lições catalãs e bávaras dos últimos anos, as verdadeiras vantagens que há em procurar sair a jogar desde trás. As mesmas pessoas podem até acreditar que sair a jogar compensa de facto o risco quando os defesas conseguem suplantar a primeira zona de pressão adversária, e podem até reconhecer que a equipa que a isso se propõe acaba por beneficiar desse risco depois de superar esse obstáculo inicial. Não obstante, parece-lhes sempre demasiado arriscado. Na opinião dessas pessoas, o risco de sair a jogar sob pressão é sempre mais elevado do que os eventuais benefícios disso, pelo que, em tais casos, é sempre mais prudente aliviar a bola do que insistir em circulá-la até que estejam criadas as condições para ligar o jogo. Aquilo que não percebem é que os benefícios de sair a jogar não se esgotam na possibilidade de ligar o jogo, de manter a posse de bola ou de preparar um ataque. Sair a jogar é também a maneira mais segura de uma equipa se precaver contra a incerteza das segundas bolas. (…) Aliviar quando se está a ser pressionado parece uma decisão sensata, na medida em que se evita o risco inerente à circulação numa zona defensiva. Mas, na verdade, aliviar envolve sempre a insensatez de deixar o destino do lance entregue ao acaso.”

Nuno Amado, 2016

 

“O maior risco é não arriscar.”

Mark Zuckerberg

Exercício gratuito

Publicamos um novo exercício gratuito: “Impedir o último passe para diferentes objectivos“.

Desta vez trazemos uma adaptação de um exercício de um conhecido treinador português. O exercício original mostrou-se desde logo extremamente rico em comportamentos, porém, sentimos a necessidade de torná-lo mais específico a determinados objectivos e momentos de jogo.

Interpretando-lhe, dadas as suas condicionantes, uma grande propensão para o ataque à profundidade através do passe de ruptura para as costas da última linha da equipa que defende, foi nossa opção dirigi-lo principalmente para os momentos de Organização Defensiva, nomeadamente para a pressão permanente no portador da bolaposicionamento e alinhamento das linhas, concentração defensiva controlo da profundidade. Contudo, uma vez que o exercício reinicia-se com uma bola aleatória, procurando a articulação de sentido entre momentos de jogo, focamos também, para a equipa que não ganha essa primeira bola, a sua Transição Defensiva, particularmente o sub-momento de reacção à perda, no qual emergem os comportamentos de pressão imediata na bola fechar os espaços vitais à progressão adversária.

“É isto que faz a diferença. É perceber o momento em que a bola está sem pressão e está em condições de entrar na profundidade. Esse é que é o momento de controlar a profundidade. Porque antes disso tem de ser de redução da profundidade, tem de ser de ganho da bola, tem que ser de ataque à zona da bola para ganhar.”

Vítor Pereira (2016)

Acrescentamos que sendo um exercício rico em comportamentos, principalmente pela sua estrutura colectiva, é-lhe consequentemente conferido um nível de complexidade elevado, portanto será aconselhado no único dia do Morfociclo que poderá contemplar uma sessão de máxima exigência: a Quinta-Feira num ciclo competitivo de Domingo a Domingo. A este propósito, (Tamarit, 2013) esclarece que “trata-se de compreender que só existe uma sessão de treino de máxima exigência – Quinta-Feira, no Morfociclo Padrão do jogo de Domingo a Domingo, e que consequentemente deverá contemplar a aquisição num plano mais Macro. Nos outros dias chamados aquisitivos – Quarta-Feira e Sexta-Feira, dever-se-á contemplar a recuperação. Estes deverão incidir na melhoria individual, assim num plano mais Micro.”

” (…) aquilo que acontece é que a tua exigência baseia-se na concentração na perspectiva da organização e do grande princípio onde a complexidade solicitada ao jogador é muito maior como o número de comportamentos exigidos é superior. É onde tu, no fundo, procuras expressar a tua complexidade em termos de jogo. A complexidade total, digamos. É no fundo o dia onde fazes os treinos de grandes princípios.”

Rui Faria citado por (Sousa, 2007)

“Vocês como não treinam é tudo muito fácil”

a vida de treinador, é ser constantemente ajuizado por quem não sabe o que se passa, não sabe o que é que o treinador pensa, como pensa e que constrangimentos enfrenta na operacionalização da sua ideia de jogo, na maior parte até podemos arriscar dizer que são completos analfabetos quanto ao jogo e ao treino… Mas a opinião coletiva desta massa tão importante para o fenómeno, condiciona e guia as decisões de quem decide rumos.”

(Antunes, 2014) em comentário a (Lumueno, 2014)

Jogar com o “físico”

Excluindo as acções de jogo aéreo, a situação mostra uma vez mais que a morfologia, no que respeita ao tamanho ou à “largura” do corpo, tem pouco significado no Futebol. Se uma das razões é o seu regulamento, que permite um contacto muito reduzido entre opositores, outra não menos importante, é a inteligência, que neste jogo se manifesta através da dimensão táctica, e que vai superando constantemente argumentos puramente físico-energéticos.

Modrić percebendo o risco do passe atrasado de Carvajal para Sergio Ramos dada a presença próxima de Thiago Alcântara, ajusta a sua posição, colocando-se no espaço certo para atrapalhar a pressão de Thiago e atrasar a acção do opositor. Uma fracção de segundo que foi suficiente para garantir outra qualidade à acção de Sergio Ramos. No fundo Modrić, usando a inteligência, joga com o físico, o qual não precisou de ser volumoso para ser útil ao jogo da equipa. O autor (Sampaio, 2013), defende que ““no futebol, ao contrário de muitos desportos, não há um estereótipo de “atleta”. Como exemplo, na prova de 100 metros do atletismo, é normal vermos atletas altos e musculados; na maratona é normal os atletas serem muito magros; no futebol não é assim, o jogador de futebol não é um atleta, simplesmente é jogador de futebol. Alguém pode dizer que Pirlo, Xavi, Aimar, Messi, David Silva, etc., são atletas? Eu não acho que sejam, simplesmente são jogadores de futebol. Como diz Klopp, a característica mais importante é mesmo a qualidade técnica e logo a seguir vem a inteligência de jogo”.

“O talento é o aspecto-chave no Futebol moderno. A habilidade natural e o talento são mais valiosos que a força física. Podem colocar em campo 11 jogadores fortes fisicamente, mas isso não será suficiente para vencer. Tem sido sempre assim ao longo dos anos.”

Xavi Hernández

Exercício gratuito

Publicamos um novo exercício gratuito: “Posse por zonas“.

O exercício surgiu num caderno de exercícios que José Mourinho terá colocado à disposição do Chelsea F. C. na sua primeira passagem pelo clube.

Na articulação de sentido entre momentos e princípios de jogo, dados os objectivos e características do exercício, o foco deverá estar no momento de transição ofensiva, respectivo sub-momento “Reacção ao ganho da bola”, mas principalmente no momento de organização ofensiva e respectivo sub-momento “Construção”, mas especificamente, na “Posse e circulação de bola”.

Será um trabalho que comportará algum risco de descontextualização pela ausência de alvos, portanto deverá surgir numa fase inicial da sessão de treino e deverá ser seguido de progressão de forma a enquadrar a Posse e os princípios aí treinados numa organização estrutural e noutras fases de construção que tragam o direcionamento do ataque e a procura da baliza adversária. O exercício apresenta-se muito propenso a progressões e adaptações, em função das necessidades de cada equipa.

Do exercício emerge uma necessidade dos atacantes sem bola garantirem várias soluções ao portador da bola, levando-os, entre outros comportamentos, ao Ajuste. O Ajuste, configura-se para nós como um deslocamento / desmarcação mais curto do atacante sem bola, de forma a que lhe garanta continuar a ser opção ao companheiro com bola. Os autores (Correia, et al., 2014), descrevem “o ajustar como a acção em que um jogador se movimenta e / ou orienta no sentido de se posicionar melhor para ser solução de passe. Desde já fica a noção de que os jogadores deverão estar sistematicamente a analisar tudo o que os envolve para que, desta forma, se possam ajustar o melhor possível. Por isso, ter jogadores permanentemente concentrados é absolutamente fundamental. Durante um jogo de futebol, é possível observar várias situações que dizem respeito à questão do ajustar, sendo que nem sempre o contexto é o melhor para a obtenção de sucesso. Por exemplo, há momentos do jogo em que um mau ajustamento por parte de um médio, o obriga a receber a bola de costas para a baliza do adversário, na ligação do sector defensivo com o intermédio, ficando sob pressão. Outra situação onde o ajustar ganha importância refere-se àqueles momentos em que o bloco defensivo adversário acompanha o movimento de circulação de bola. Nestes casos, alguns jogadores da equipa que se encontra de posse de bola estão “escondidos” por detrás de adversários, não podendo ser solução de passe por não se terem ajustado convenientemente”.

“O que faço é procurar espaços. A toda a hora. Estou sempre à procura. (…) Na actualidade, é quem não tem a bola que tem a missão de procurar espaços, de oferecer opções ao portador da bola, para que a equipa vá progredindo no campo. há tantas opções de passe. Às vezes, até penso para comigo: o não-sei-quem vai ficar aborrecido porque fiz três passes e ainda não lhe dei a bola. É melhor dá-la ao Dani Alves, porque ele já subiu pela ala três vezes. Quando o Messi não está envolvido, é como se ficasse aborrecido… e então o próximo passe é para ele.”

Xavi Hernández, 2010

O ajuste, portanto, o “Garantir permanentes apoios ao portador da bola” deve suceder, mesmo que a decisão posterior do companheiro com bola não seja o passe para o jogador que se movimenta sem bola, isto porque aumentará as possibilidades atacantes da equipa, tornando o seu jogo mais imprevisível. A compreensão disto pelos jogadores é fundamental, mas difícil, pois um jogador que realize consecutivos movimentos de desmarcação, e que por alguma razão não foi alvo de nenhum passe, tem alguma tendência a desvalorizar o que fez e a reduzir esses comportamentos. A bola é naturalmente o centro do jogo e a maior fonte de motivação de quem o joga, contudo, compreender a importância do jogo sem ela, quer nos momentos defensivos quer nos ofensivos, torna-se cada vez mais decisivo.

“As melhores equipas são as que conseguem envolver todos os jogadores neste jogo de apoios, de linhas de passe permanentes (sempre à direita, à esquerda, à frente e atrás do portador da bola). Quanto mais opções o portador da bola tiver, maior imprevisibilidade terá o jogo da sua equipa.”

(Bouças, 2011)