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Atrair fora para criar dentro. Um exemplo.

A “passivo-agressividade”… táctica… de Bruno Fernandes

“(…) é importante que as equipas dos nossos dias dominem a acção de atrair como forma de poderem corresponder aos cada vez mais exigentes problemas que se deparam em jogo. Esta necessidade assume especial destaque quando as equipas adversárias têm um posicionamento defensivo irrepreensível, tornado escassas as opções de penetração em direcção à baliza que defendem, ou quando até evidenciam falhas de posicionamento, mas aglomeram praticamente todos os jogadores atrás da linha da bola, dificultando em alguns momentos a entrada na direcção da baliza que defendem. Em ambas as situações descritas anteriormente, torna-se evidente que a equipa com bola terá que conscientemente atrair os jogadores adversários para uma determinada zona do terreno de jogo com o objectivo de posteriormente tirar vantagem de outro local.”

(Paulo Correia, et al., 2014)

A situação decorreu no passado jogo de preparação Portugal x República da Irlanda. Em momento de Organização Ofensiva e sub-momento de Construção, Bruno Fernandes, fazendo jus à sua inteligência e qualidade de execução, perante um denso bloco médio baixo adversário imaginou e executou uma acção ofensiva que permitiu à equipa imediatamente saltar da Construção para a Criação.

É verdade que Cristiano Ronaldo, voluntária ou involuntariamente deu um contributo importante na interacção que estabeleceu com o adversário directo, contudo o irlandês em questão não foi o único iludido na situação. Dada a pouca profundidade que existia entre a última linha adversária e o seu Guarda-Redes, o passe directo em profundidade seria mais facilmente antecipado e interceptado caso tivesse sido realizado directamente e mostrando essa intenção. Assim, Bruno Fernandes com a ajuda de António Silva troca três passes de forma provocatória, concentrando aí a atenção da equipa irlandesa. A postura e linguagem corporal do jogador do Manchester United é passiva, escondendo até ao último momento a intenção ofensivamente agressiva de atacar a profundidade em passe longo. Mesmo a leitura que faz da potencial ruptura de Dalot é sempre subtil de forma a não evidenciar a intenção que criou na sua mente.

Será também importante referir que o entrosamento manifestado com Dalot pode provir da relação do Manchester United, no entanto, não será necessário treinar e jogar muitas vezes com Bruno Fernandes para, reconhecendo-lhe as qualidades que evidencia, antecipar intenções como esta. Sejam eles companheiros, sejam adversários. Porém… quem defende poderá estar sempre um passo atrasado se estiver em reação como foi o caso da selecção Irlandesa. E também não ajudou a forma como os Irlandeses mais próximos do corredor por onde Dalot se desmarcou colocaram os apoios e não se orientaram para o potencial espaço a explorar. Mas estes erros também terão tido mérito dos portugueses, em especial de Bruno Fernandes, porque num cenário aparentemente controlado a sua acção de provocação em passe atraiu a atenção do adversário, potenciando assim a desconcentração para outros espaços e comportamentos.

“Muito difícil foi dizer aos meus jogadores que em alguns momentos tinham era de estar quietos num determinado sítio. Espera, porque nós atraímos aqui para libertar aí. Estando aí, tu vais ser decisivo e a bola quando vier a ti não podes ficar com ela, é para tocar, porque atraíste para outros poderem entrar, para outras coisas poderem acontecer.”

(Miguel Cardoso, 2018)

Saber sobre o saber jogar de… Kevin De Bruyne

Kevin De Bruyne deu uma fantástica entrevista a Jamie Redknapp na antevisão do Manchester City x Arsenal. Ninguém melhor para falar do jogo do que aqueles que o vivenciam e que sobretudo revelam conhecimento sobre o mesmo através da suas decisões dentro do campo. É uma realidade que a qualidade de muitos deles restringe-se à esfera do “saber fazer”. Porém, De Bruyne mostra mais, uma consciência sobre o jogo, e portanto o tal “saber sobre o saber fazer”. Provavelmente muito fruto da inteligência táctica que manifesta, porém será também consequência da liderança e metodologia de Pep Guardiola. Urgem mais programas deste género e a abertura para o diálogo com esta frontalidade.

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“Se toda a gente na equipa “compra” o modelo tudo fica mais fácil.(…) Tem que haver muita confiança entre nós para que o modelo resulte.”

“É posse com sentido. Guardiola odeia a palavra posse. É um jogo de passes para muitas vezes descobrir-me a mim e ao David Silva para que possamos criar. Ele não gosta da posse pela posse, a não ser para controlar o final dos jogos.”

“É esta confiança… (no início da construção) toda a gente tem de estar na sua posição para criarmos os espaços necessários.”

“O sistema varia todos os jogos um pouco. Naquele jogo ele disse para o Leroy e Raheem ficarem abertos até termos a bola no último terço e aí fariam o que quisessem. No início a intenção era fazer com que o Azpilicueta e o Alonso ficassem o mais baixos possível e assim ficávamos com superioridade numérica numa estrutura 3:4:3 com o Kyle Walker e o Fabian Delph a virem para dentro e o David Silva a jogar como número 10. Portanto depende sempre de como a outra equipa se organiza.”

“(Em construção) há muitas situações a 1 e a 2 toques, o jogo flui e toda a gente se movimenta em conjunto. (Em criação) nós podemos fazer o que quisermos. Não há uma restrição. Podemos ir para dentro, para fora, finalizar ou criar alguma coisa.”

“(já perto da área adversária, quando recebo um passe atrasado vindo do corredor lateral), primeiro olho para o lado contrário para perceber o que está a acontecer. Jogamos muito de um lado e toda a gente do lado contrário está a fazer um movimento. E depois sinto que se rematar eles vão bloquear o remate e sei que o David, Raheem ou Leroy vão também fazer o movimento e então é um pouco como saber e tentar ver se estão a fazê-lo e… confiar na equipa. Se não é um passe ridículo. Mas toda a gente estava com o mesmo pensamento, a mesma ideia e aqui foi muito bom.”

“Gosto mais de assistir do que de marcar. Dá-me outro sentimento. Marcar é sempre um grande sentimento, mas assistir é também algo especial para mim. Acho que se dá pouco crédito à assistência.”

“(quando alguém se está a desmarcar em ruptura) eu vejo-o. Não o vejo claramente, mas vejo-o a correr e já sei antes o que vai acontecer.”

“Assistir é um instinto que temos que ter no jogo. Leva tempo a perceber o que eles preferem. Joguei com um jogador, Bas Dost, ele era muito forte na área e eu só tinha que cruzar todo o tempo porque ele ia lá estar. Mas com o Sergio Agüero é diferente, com o Gabriel Jesus é diferente, então preciso de saber o que eles gostam. Se gostam mais no pé, Raheem ou Leroy gostam mais no espaço. O caminho é aprender o que eles gostam e como serão favorecidos perante as suas qualidades.”

“É uma questão de tomar decisões. Eu gosto de ver a NBA, sou um grande fã. Muitos jogadores jogam no físico, mas eu sou um grande fã do Lebron James, que pode fazer o que quiser, mas ele tenta sempre tomar a melhor decisão para a equipa. É o que eu gosto de fazer.”

“(nos livres directos) é algo que o staff técnico sempre nos transmitem. Se a barreira tem a tendência de saltar ou não.”

“acho o David Silva muito subvalorizado. Ele é classe. Jogou mais de cem jogos pela Espanha e ganhou tudo por eles. Ele dá-me o equilíbrio perfeito. Aprendi muito com ele a conservar a bola. Quando cheguei era um jogador de maior risco, de aproveitar e criar oportunidades, mas também perdia a bola mais vezes.”

“(a propósito da quantidade de passes bem sucedidos) nós fazemos sempre muitos meinhos. É estranho veres um treinador fazer meinhos como estes. Para ele isto é a “masterpiece” do futebol. Se fores bom a fazê-lo vais jogar bem no jogo. Normalmente fazêmo-lo no aquecimento. Não são permitidos toques da calcanhar e são sempre passes simples. Ele quer que os que estão no meio corram. Se fizermos 60 passes eles vão correr.”

“Nós agora jogamos com o Kyle Walker que é muito ofensivo. Às vezes temos que estar na posição dele. Podemos trocar, Kyle avança, os alas aparecem mais como médios-ofensivos e eu não fico como Defesa-Direito, mas fico num espaço intermédio. Funciona para manter a posse e parar os contra-ataques adversários.”

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