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O treinador português: um “produto” de qualidade II

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“(…) tentámos reajustar mas o posicionamento deles era melhor, jogavam uns para os outros. O Benfica foi melhor em todos os setores e dói perceber isso. Individualmente temos tanta qualidade quanto o Benfica mas não como equipa”.
Jan Vertonghen, citado por (Bouças, 2014), sobre o Benfica de Jorge Jesus

http://www.sabersobreosabertreinar.pt/…/avaliacao-da-compe…/

O treinador português: um “produto” de qualidade

“Há sempre que estudar mais. Não compreendo o treinador de futuro sem estudo.”

Manuel Sérgio, 2017

Numa reportagem de Janeiro de 2017, um canal de desporto brasileiro procurava explicar a “moda” em que se tornou o treinador português.

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Num artigo de Fevereiro do mesmo ano, tocávamos na questão.

“(… ) é evidente a enorme a evolução que o jogo, o treino e a liderança das equipas registaram, resultado da qualidade que muitos treinadores portugueses hoje apresentam, colocando-os no top mundial. Simultaneamente, em todos os níveis do jogo muitos outros crescem, nas ideias e na experiência e preparam-se para mais uma vaga, quem sabe ainda melhor. Facto, valorizado ainda, pela menor dimensão do país, no número de praticantes e de equipas, comparativamente com muitos outros. Também não é assunto novo neste espaço, pois ainda noutro artigo recente, trazíamos o professor Silveira Ramos elogiando o treinador português, pelo seu conhecimento do jogo e pensamento estratégico. Hoje, em vários pontos do mundo o treinador português é visto como sinónimo de qualidade. Constitui-se como mais um “produto” português de enorme sucesso.”

A reportagem foca o processo formativo. Conhecendo o mesmo, reconhecemos a sua evolução e incontestável contributo para este sucesso. Mas este é um processo que não se reduz aos cursos de treinadores. Passa também pelo trabalho desenvolvido das Universidades nas últimas décadas, por diversas obras publicadas por inúmeros autores e actualmente pelos inúmeros espaços na internet que desenvolvem ideias, debatem e contribuem de forma decisiva para a exponenciação do conhecimento. Como grande exemplo, reconhecido por muitos treinadores, alguns deles até focados na reportagem, está o incontornável www.lateralesquerdo.com, online há quase uma década e percursor de centenas de outros espaços, de ideias e até linguagem que hoje se tornou convencional.

Porém, esta é só uma parcela da explicação. Desde logo, (Manuel Sérgio, 2012) descreve que “em Portugal não é a mesma coisa ser treinador de Futebol ou treinador de Basquetebol… as pressões são outras. O autor (Bouças, 2016) sustenta este pensamento com “os rótulos que os “carneiros” sempre colocam quando alguém que não entendem nem querem esforçar-se para entender foge da norma. Será sempre assim, até que a realidade lhes bata de frente. Por isso há quem vá à frente, afirme, defenda e prove. E há os que atrás se limitam a acenar concordando sempre com o que estará mais aceite e enraizado no pensamento global”. Sem dúvida que José Mourinho marcou uma nova era para o treinador português, indo com enorme coragem mais “à frente, afirmando-se, defendendo-se e provando”. Segundo o treinador (André David, 2017), “após Mourinho aparecer no nosso futebol, a imagem do treinador e da formação dos treinadores ganhou especial relevância e notoriedade, ao ponto de actualmente haver imensos jovens a quererem ser treinadores de futebol”.

Neste âmbito, é também fundamental sublinhar a base metodológica de José Mourinho. A Periodização Táctica idealizada por um homem que personifica todas as qualidades e genialidade do treinador Português. O ex-treinador e professor Vítor Frade. O treinador português (Jesus, 2010), defende que Portugal tem uma metodologia de treinos que está dez anos avançada em relação ao resto do Mundo. (…) No futuro vão aparecer mais Mourinhos”. O próprio (José Mourinho, 2001), explica que os dados actuais, indicam que a componente Táctico-técnica e cognitiva sejam as que direccionam todo o processo de treino e um projecto de jogo. Estão assim criados os pressupostos para que seja efectuada uma ruptura epistemológica na periodização e planeamento do processo de treino, e por conseguinte designarmos o novo processo de treino como Periodização Táctica”. De acordo com (Tamarit, 2007),a “Periodização Táctica” é uma Metodologia de Treino que surge há mais de trinta anos na cabeça do Professor Vítor Frade quando, através de experiências que lhe ocorreram, começa a questionar as Metodologias de Treino existentes até o momento”. O autor acrescenta que Frade exerceu, durante trinta e três anos, como professor na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto e foi treinador adjunto em várias equipas da primeira liga Portuguesa, nomeadamente no F. C. do Porto durante mais de vinte anos. Xavier Tamarit ressalva que, portanto, esta metodologia, “não surgiu de um dia para o outro, como por magia, nem é algo extraído de qualquer outra área e extrapolado para este fenómeno de massas chamado Futebol”. Finalmente Tamarit sublinha que “ele é o criador da metodologia de treino conhecida como Periodização Táctica, transgressora com a lógica que era aceite como verdade absoluta pelas teorias e metodologias de treino, assim como, possivelmente, pela totalidade dos desportos. Esta “nova” metodologia surgiu há aproximadamente trinta anos, porém começou a ser mais conhecida através dos êxitos conseguidos pelo treinador português, (…), José Mourinho, que junto da sua equipa técnica conseguiu levá-la à excelência ao nível prático.

Por outro lado, Paulo Sousa, citado por (Ferreira, 2014), justifica a qualidade dos treinadores portugueses com múltiplas presenças nos níveis competitivos mais elevados. O técnico português sustenta que “é extraordinário e isso só confirma o que disse, que temos qualidade e estamos preparados. Claro que há factores que determinarão os resultados que cada um deles irá obter mas isso não porá em dúvida a competência de todos eles que, com o tempo, irá sendo cada vez maior”.

Assim, segundo Jorge Jesus, citado por (Braz, 2009) e abordando os melhores, “os treinadores portugueses são dos melhores do mundo, ao nível dos holandeses e dos italianos”. O treinador português (Jorge Jesus, 2013), reforça esta ideia, colocando os treinadores “à frente dos outros, mas que estão a frente é garantido. Todos querem aprender connosco”. Ainda (Jorge Jesus, 2015), vai mais longe e opina que os treinadores portugueses, são actualmente os melhores treinadores do mundo, são os que têm mais conhecimento em todas as áreas que definem o crescimento de uma equipa de Futebol, e portanto se tiveres a possibilidade de trabalhar numa equipa que tem condições financeiras para teres isto tudo, eles têm muito mais facilidade de ganhar esses títulos que qualquer outro treinador do mundo. Tirando o Pep Guardiola porque também penso que é um pouco parecido com os treinadores portugueses”.

Para (Silveira Ramos, 2015), o treinador português encontra-se à frente de colegas de outros países, pois para o treinador e autor, há décadas que o treinador português perspectiva o treino de uma forma mais global, mais holística, contrariando o pensamento analítico e a divisão das dimensões do rendimento protagonizada pela maioria das outras culturas futebolísticas. Porém, para tal, o autor defende que foi preciso errar, foi preciso “trilhar o caminho”, foi necessário inovar, e também aí o treinador português foi corajoso e pioneiro. Qualidades conjugadas com a inteligência. Segundo o treinador português (Nuno Manta, 2017), “o treinador português é super inteligente. Sabe trabalhar o músculo principal, que é o cérebro, e põe o jogador a pensar, português ou não. Independentemente da nacionalidade, os jogadores vêm para cá e normalmente crescem aqui, antes de dar o salto para a Europa”.

Neste enquadramento, novamente (Silveira Ramos, 2017) descreve que “há algo que herdamos da chamada velha guarda dos treinadores portugueses: a estratégia. Portugal foi pioneiro nessa capacidade de aliar a vertente estratégica às metodologias de treino de vanguarda. Isso produziu alguns dos melhores treinadores do mundo. Não percamos isso, não nos agarremos a preconceitos. Identidade não é jogar sempre com os nossos argumentos expostos. Nenhum grande general faria isso… Estratégia é utilizar o que temos de melhor. Uma frase mais para a tal simbiose entre velha guarda e os tempos modernos. Os treinadores portugueses eram aqueles bons malandros, no bom sentido do termo. Eram atrevidos e essas características espero que nunca se percam porque é a nossa natureza e também a explicação para a afirmação de muitos deles no estrangeiro“.

O treinador português (Leonardo Jardim, 2017) acha que o treinador português é um treinador muito bem visto em toda a Europa e todo o mundo pelo seu conhecimento e pela sua capacidade de adaptação. Nós portugueses temos esta capacidade. Nós temos famílias de emigrantes e temos capacidade de nos adaptar. Mesmo em cenários de alguma dificuldade nós conseguimo-nos adaptar e ultrapassar essas dificuldades e fazer aquilo que mais gostamos que é o nosso trabalho, e apresentar resultados. Ao contrário do que no passado podíamos pensar, a adaptação é uma mais valia.

O autor (Luís Freitas Lobo, 2010), parece subscrever esta ideia ao defender que “tacticamente, o treinador português é dos mais inteligentes do mundo. Domina o treino e a leitura de jogo. É multicultural, sem complexos de ouvir outras escolas mas, ao mesmo tempo, tem um orgulho pessoal que não o deixa converter-se, pelo que, no fim, impõe a sua filosofia”. Lobo, acrescenta que o treinador português, “prova, como diz Capello que “o melhor treinador é o maior dos ladrões”. Aprende em todos os sítios e com todos os outros técnicos, mas, no fim, aproveitando tudo, mete a suas ideias e cria uma filosofia própria global. O Futebol português, não duvidem, sempre esteve cheio de grandes “ladrões””. O autor (Pinheiro, 2013) destaca três pontos que fortes no treinador português:

  • Trabalho realizado em ambiente de adversidade. O autor refere que “treinador português está acostumado a trabalhar com poucos recursos, tanto ao nível humano quanto ao material. Vejamos o exemplo de algumas equipas fantásticas que se alicerçam em jogadores “aparentemente” normais, mas que com grande rigor e organização conseguem resultados fantásticos”;
  • Formação académica. Para Valter Pinheiro, “o advento de técnicos com formação em Educação Física trouxe ao futebol maior rigor e cientificidade”;
  • Capacidade de adaptação. Finalmente o autor sublinha “a capacidade “camaleónica” do treinador português, capaz de se adaptar a contextos difíceis e muitas vezes hostis. Já se tornou normal ver equipas com muitos meses de salários em atraso que em campo revelam uma motivação feroz. Em muitas destas situações o treinador assume-se como a pedra angular que congrega a união da equipa”.

Portanto, no fundo o que faz a diferença no treinador português é o conhecimento que este conquistou, fruto da sua ambição, coragem, inteligência, criatividade, experiências e ideias produzidas, num contexto tão competitivo e adverso como o Futebol Português.

“Sempre fui muito autocrítico e nunca me chega aquilo que faço. Quero sempre mais porque sei que consigo mais. É como o nosso cérebro: nós só exploramos uma parte muito pequena do nosso cérebro. E eu sinto que bem estimulado e motivado sou capaz de virar uma equipa de pernas para o ar.”

Vítor Pereira, 2017