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Criação | Livre Indirecto + Último passe + Criatividade

“Tinha um treinador que dava muitas indicações: “Ó Simões, faz isto assim e assado.” Mas eu não sabia fazer aquilo daquela maneira, então pegava na bola e fazia à minha maneira. E ele lá dizia: “Pronto, assim também está bem!” A criatividade é assim. Por isso é que digo que conheço muitos jogadores que em muito contribuíram para fazer treinadores, isso sim.”
António Simões, citado por (Cabral, 2016)

Bernardo Silva

“Eu era Sub17 quando começou a era do Barcelona de Guardiola. Ver jogadores como Messi, Iniesta e Xavi dava-me mais força para continuar. Porque eu estava sem jogar pois era mais pequeno que os outros. Assim, ver a melhor equipa do mundo nesse momento e ver que estavam ali três dos melhores do mundo e eram quase mais pequenos que eu…”
(Bernardo Silva, 2019)

A saída de jogo do Guarda-Redes. Curta ou longa, ou aberta ou fechada? E eventuais tendências evolutivas.

“O que ele terá sempre de fazer é ter calma, é não se precipitar. Porque se ele não está pressionado, então é como outro jogador qualquer noutra zona do campo. Calma, deixa-te estar. Porquê? Porque compete aos colegas movimentarem-se no sentido de proporcionarem um homem livre, uma solução de passe. Claro que nem sempre se decidiu bem, mas essas dinâmicas de movimentos permitem encontrar linhas de passe mais próximas, mais longe, mais à largura, mais dentro do adversário, mais às costas das defesas…”

(Miguel Cardoso, 2018)

As acções de jogo decorrentes da situação de saída de jogo do Guarda-Redes valorizam-se e vulgarizaram-se nos últimos anos. É certo que ao longo da história do jogo muitas equipas já faziam desse momento uma marca forte do seu jogar, no entanto parece-nos claro que o Barcelona de Guardiola, foi até hoje, a equipa da história do jogo que deu o maior impacto à acção. Isto porque tratou-se, naquele momento, de um fundamento importante no seu jogo uma vez que a “saída curta” permitia, entre outras coisas, desde logo, privilegiar o jogo curto e apoiado, manter a bola controlada, o bloco junto e uma consequente chegada, também junta, do mesmo à baliza adversária. O tal “viajar juntos” que Sampaoli descreveu. O autor (Amieiro, 2oo9) enalteceu na equipa “o modo como recusa cair na tentação do pontapé longo”. Por outro lado, na articulação de sentido que o jogo proporciona, esta coesão, trará reflexos aos momentos de jogo subsequentes. Na Transição Defensiva, a equipa irá desta forma garantir uma concentração defensiva que aumentará as probabilidades de sucesso numa eventual tentativa imediata de recuperação da bola. Ou então, no momento subsequente, perante a sua reorganização defensiva mais rápida e mais alta no campo, permitirá à equipa pressionar com todo o seu bloco, num posicionamento colectivo mais alto.

Noutra perspetiva, esta forma de resolver a saída de jogo do Guarda-Redes, transmitiu uma mensagem de coragem para dentro e para fora. Como um dia Matt Busby referiu, o Futebol tinha-se tornado “um jogo de medo”, e contribuições como a de Guardiola, do ponto de vista emocional, puxaram o jogo para outra dimensão e dessa forma, acabaram por influenciar terceiros. No entanto, analisar esta emocionalidade desligada de algumas razões organizativas descritas acima, estratégicas, ou mesmo de questões em torno do desgaste que o jogo, e que cada jogar, provocam… é um constante erro do pensamento cartesiano. Estamos perante a procura de uma eficiência… que é táctica… e que nessa perspectiva provocará reflexos que se manifestam do ponto de vista técnico, físico e psicológico. Tentar compreendê-la ou transmiti-la apenas do ponto de vista de uma destas dimensões, apresenta-se como perigosa para o Todo… Táctico. E essa foi talvez a principal razão para que esta acção de jogo, nomeadamente na sua expressão de “saída curta”, tenha sofrido más interpretações e deturpações nos últimos anos. Sendo assim, esta é também mais uma razão que nos leva a reflectir sobre o tema.

Do ponto de vista táctico, o autor (Amado, 2016) aponta que “os benefícios de sair a jogar não se esgotam na possibilidade de ligar o jogo, de manter a posse de bola ou de preparar um ataque. Sair a jogar é também a maneira mais segura de uma equipa se precaver contra a incerteza das segundas bolas. (…) Aliviar quando se está a ser pressionado parece uma decisão sensata, na medida em que se evita o risco inerente à circulação numa zona defensiva. Mas, na verdade, aliviar envolve sempre a insensatez de deixar o destino do lance entregue ao acaso”. Reflectindo sobre as probabilidades de sucesso das acções, parece-nos claro que o passe curto terá maior probabilidade de sucesso do que o longo, mesmo nas tais zonas que muitas pessoas consideram de “risco”. Nesta linha de pensamento surge também (Lumueno, 2018), defendendo que “o passe longo é um passe de execução mais difícil que o passe curto, assim como também é de receção mais difícil. E a dificuldade é ainda maior no caso de existirem adversários por perto. Ou seja, tudo isso resulta numa maior possibilidade de o adversário recuperar a bola”. E neste sentido, (Correia et al., 2014) expõem que “as equipas de topo tentam sempre que possível sair a jogar curto e há aquelas ainda que o fazem mesmo que o contexto não seja o mais favorável. A questão fundamental é que, em condições normais, uma saída curta oferece mais garantias da equipa manter a posse de bola comparativamente às saídas longas”.

O treinador português (Vítor Pereira, 2014), acredita que “mesmo sob pressão há formas de sair a jogar. É preciso é entender como é que a pressão está a ser feita e preparar o antídoto”. Neste enquadramento, a prioridade deverá então passar pelo passe curto, logicamente se existirem condições mínimas. Os autores (Correia et al., 2014) sublinham esta ideia, referindo que “a primeira preocupação de toda a equipa num pontapé de baliza a seu favor será sair a jogar curto, desde que estejam reunidas as condições para tal. O posicionamento do adversário é aqui 0 principal fator a ter em conta na decisão a tomar“. Essas condições mínimas serão determinadas então pelo Modelo da equipa. Sejamos claros, pelo Modelo e não pela Ideia. Sendo o Modelo, a Ideia mais o Contexto, ele expõe portanto a interacção do que foi construído pelo treino, com as qualidades individuais dos jogadores, com o seu momento emocional, com a forma como absorveram a ideia, com a dimensão estratégica, ou seja, pelo conhecimento do que o adversário poderá ou não fazer e a influência que isso terá nos recursos disponíveis, entre um universo de outras coisas mais ou menos influentes.

Exemplificando o domínio estratégico, os autores (Correia et al., 2014) explicam que este “poderá ter também influência na forma de executar um pontapé de baliza, ou seja, questões relacionadas com as características do adversário com quem iremos jogar poderá influenciar na opção ou opções a tomar. Exemplos: explorar as zonas onde se encontram os jogadores menos fortes no jogo aéreo da equipa adversária, realizando para lá o pontapé de baliza; tentar a superioridade numérica no local previsto para a queda da bola após a reposição pelo guarda-redes, aumentando as hipóteses de êxito na disputa do lance“. Os autores tocam ainda num tema ao qual regressaremos no futuro. A relação tempo-espaço-número parece-nos hoje curta na tomada de decisão ou para avaliá-la. A qualidade, como quarta dimensão, parece-nos fundamental na busca de uma melhor compreensão da complexidade da acção, de uma maior aproximação à realidade do jogo, e consequentemente ao sucesso.

Assim, procurando esse sucesso, o treinador português (Villas-Boas, 2009) defende ser possível sair a jogar curto do Guarda-Redes “desde que o treines e acredites nisso… acho que sim… acho que é possível… obviamente que, se tiveres um central que tem dificuldade ou que tecnicamente é limitado não o vais querer fazer, não queres arriscar, se tiveres centrais que estão confortáveis com a bola… acho que sim, que podes arriscar… acho que é uma coisa que deves fazer”. Mas (Correia et al., 2014) descrevem que “muitos treinadores definem muito bem o posicionamento dos seus jogadores para que o pontapé de baliza seja executado, mas não preparam a equipa corretamente, através de exercícios de treino, para o conjunto dos comportamentos e ações que é imprescindível ter para que a manutenção da posse de bola esteja assegurada”. O treinador (Miguel Cardoso, 2018), relata, que em conversa com o seu Guarda-Redes, “também disse ao Cássio: “Não há problema nenhum se tu entenderes que a bola deve ser longa. Se entenderes que a equipa está num momento em que não quer sair curto, ou porque não te deu linhas de passe ou porque o adversário está numa fase muito pressionante…”

“O que nós dizemos é: “Tens aqui, tens ali, tens acolá e acolá. Escolhe. O que tu escolheres para mim está bem feito”. Agora, ele teve foi a coragem, muitas vezes, de encontrar soluções que permitiram ter mais certeza, por regularidade, por tendência. Em 20 vezes, ele encontrou 18 soluções que teoricamente para quem vê de fora são de risco, mas para nós não eram risco, porque eram o que nós fazíamos. E tu perguntas assim: mas treinavam assim? Assim e pior: treinávamos com dez contra onze. Agora tiro um médio, tiro o Pelé. Agora tiro o Tarantini. Agora tiro o Geraldes. Agora tiro um ala. Agora tiro um lateral. Agora o Guedes. E fazia isto 20 vezes seguidas. E contra a equipa B, por exemplo, em que dizia: agora vocês pressionam o guarda-redes, agora não pressionam o guarda-redes, agora fazem parede ao guarda-redes daquele lado, agora ficam à espera. Isto é dar soluções em contextos de dificuldade acrescida e incorporar permanentemente o guarda-redes nos exercícios de treino. E depois há uma coisa fundamental: o que é que é tão importante assim que faz a diferença toda quando se quer jogar desta forma? Não se pode receber bolas de costas. É preciso estar de apoios abertos. É preciso o próprio Cássio permanentemente estar preparado para receber a bola, seja para o lado contrário ou para o mesmo lado, é preciso que os colegas se movimentem para que o guarda-redes tenha soluções.”

(Miguel Cardoso, 2018)

Forçar então a Ideia sem que o Modelo apresente condições de sucesso, parece-nos um erro, que actualmente se vê repetido por imensas equipas, nos mais diferentes níveis de jogo. Porque se procura passar uma coragem abstracta… e não uma coragem táctica. Portanto, perante diferentes ideais / soluções / recursos para este momento do jogo, e tendo então também em conta o Modelo, na maioria das situações as probabilidade de sucesso deverão levar a prioridades na decisão. Mas talvez… não sempre. Não será que uma acção de probabilidade de sucesso inferior, mas que o seu sucesso colocará um atacante em situação de Criação, ou mesmo de Finalização deva ser pontualmente, a decisão? Ou mesmo uma solução que não estava na Ideia inicial? Não representa também isto… criatividade, a qual tantas vezes é solicitada e declarada como fundamental no jogo?

Por outro lado, o tal “aliviar” é diferente de passar longo, mesmo que este passe encontre oposição na disputa da recepção dessa bola. Porque há uma intencionalidade nessa acção e é isso o que para nós representa um passe. Uma forma de comunicação específica do jogo de futebol. A sua eficácia, pode depois ser avaliada, mas não deixa de ser uma intenção de passe. E para que a eficácia global da acção aumente, o Modelo não tem apenas que oferecer a solução de passe longo e recepção, como deve precaver uma provável disputa e a forma de ganhar uma eventual segunda bola. E concordando novamente com Amado, o “alívio” não é para nós uma opção aceitável. No máximo é um último recurso, mas que pode ser interpretado como a ausência de soluções de uma equipa perante determinada situação de jogo, e sendo assim, um assumir de incompetência. Deste modo, se a situação de jogo assim o “pedir”, diferentes soluções de passe longo deverão constituir-se como recursos, logo, deverão também estar presentes no Modelo de Jogo da equipa. Neste sentido, o autor (Lumueno, 2018) defende que “a saída de bola longa tem como grande vantagem em caso de perda a equipa estar toda mais ou menos organizada, e mais longe da baliza que defende. Se a equipa trabalhar para essas ações de jogo, em caso de perda, os jogadores estarão mais próximos uns dos outros e por isso com menos espaço para o adversário penetrar por entre as suas linhas”.

Nesta fase, torna-se fundamental, esclarecer o que é para nós, a saída de jogo do Guarda-Redes. Para muitos, a mesma diz respeito exclusivamente a situação de bola parada, pontapé de baliza. Contudo, a reposição do Guarda-Redes, ou seja, o primeiro passe após este ter recolhido a bola e estar na sua posse com o jogo a decorrer, quer a bola seja proveniente de uma intercepção, quer de uma recepção de um passe de um colega, dada a sua semelhança, também entra para nós neste Princípio de Jogo. Naturalmente temos que ter em conta as diferenças que existem entre ambos, e equacionar possíveis ajustes. Até agora, grandes diferenças passavam pelo menor tempo de decisão e execução, fruto da possível imediata pressão do adversário na reposição do Guarda-Redes, portanto na situação em que a bola está jogável, e também pela influência da regra da não invasão da grande-área dos jogadores que atacam no pontapé de baliza, e ao invés, essa possibilidade na reposição do Guarda-Redes. Com a recente alteração da regra, as diferenças reduziram-se ainda mais.

Atrás, abordámos um termo que se vulgarizou: a saída de jogo do Guarda-Redes curta. A reflexão e a experiência que o jogo e o treino nos trouxe, mostram-nos que o termo está desajustado. Ou melhor, está incompleto. Isto porque muitas equipas posicionam-se para essa saída curta, e normalmente devido à oposição adversária, optam depois por um passe longo do Guarda-Redes, normalmente aéreo, por exemplo, na opção que tem sido mais comum, para os seus Defesas-Laterais. Mas nas mesmas circunstâncias já assistimos a um passe longo, aéreo ou rasteiro, do Guarda-Redes no corredor central, para um companheiro que se encontra livre, resultado da pressão alta adversária e do garantir profundidade da equipa atacante pelo(s) seus Avançado(s), atraindo desse modo a última linha adversária para perto de do(s) mesmo(s) e criando assim mais espaço entre-linhas.

Nos últimos anos, assistimos ainda, a uma tentativa de último passe do Guarda-Redes, neste caso, apenas na situação de pontapé de baliza dada a ausência da regra de fora-de-jogo nesse momento. A mesma já foi protagonizada com sucesso, num atacante que se posiciona no espaço entre a última linha adversária e o Guarda-Redes adversário, procurando dessa forma saltar do sub-momento de construção, imediatamente para o sub-momento de criação. Aqui trata-se de um passe longo aéreo realizado com a equipa aberta de forma a criar incerteza ao adversário, nos últimos anos celebrizado pelo Guarda-Redes Ederson, constando até que terá sido essa uma das razões que levou Guardiola a optar pela sua contratação. No fundo, como refere o autor (Bouças, 2017), a questão sobre o passe longo estará em “perceber como pressionam… Se vêm apertar com todos homem a homem, trazes médios todos para baixo também, e aumentas-lhes o espaço entre médios e defesas, para então colocares lá a bola. Já dizia o Pep, “é uma bola que se a ganhas, é muito boa”. Ou seja, nessa situação, sem dúvida que não só te estás a proteger, como até estás já a preparar ferir o oponente, quando colocas a bola por cima da pressão”.

E logo aqui… o próprio Guardiola, o tal que celebrizou a saída de jogo do Guarda-Redes curta, mostra-se à frente da maioria, procurando novas soluções e mais recursos para o seu jogo, demonstrando que se as equipas ficarem presas a uma saída de jogo, expressam outra forma de reducionismo. Mesmo que aumentar os recursos, seja “simplesmente” para aumentar a imprevisibilidade do seu Modelo, continuando no entanto, a dar preferência, ou prioridade, à saída de jogo do Guarda-Redes curta, pela convicção de que a natureza desse primeiro passe, conduzirá o jogar da equipa a uma maior eficácia. Por outro lado, a necessidade de sucesso nessa situação específica do jogo, não se esgota na própria situação. De acordo com os autores (Correia et al., 2014), “uma equipa que tenha problemas na reposição de bola em jogo a partir desta situação, poderá tornar-se numa equipa insegura”. A ideia encaixa de forma perfeita na visão do todo complexo que é o jogar.

Deste modo, já identificámos diferentes possibilidades na saída de jogo do Guarda-Redes. Se ela pode ser realizada com a equipa aberta, quer dizer que também pode ser realizada com a equipa fechada (e neste artigo nem procuraremos ir mais longe e equacionar um posicionamento misto, ou seja parcialmente fechado e aberto). Numa segunda variável, independentemente se a equipa se apresenta aberta ou fechada, o passe do Guarda-Redes pode ser curto ou longo. E finalmente pode ainda ser realizado em trajectória rasteira, ou aérea. Portanto podemos identificar:

Saída de Jogo do Guarda-Redes

Aberta

Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Curto Rasteiro
Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Curto Aéreo
Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Longo Rasteiro
Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Longo Aéreo

Saída de Jogo do Guarda-Redes

Fechada

Saída de Jogo do Guarda-Redes Fechada em Passe Curto Rasteiro
Saída de Jogo do Guarda-Redes Fechada em Passe Longo Aéreo

Assim, uma vez que a saída de jogo aberta, também pode ser realizada em passe longo, e sendo que neste âmbito, a decisão que causa maior impacto no tempo de reorganização da equipa, passará por estruturar um posicionamento inicial aberto ou fechado, sentimos que esse deverá ser o primeiro critério a ter em conta na sua definição e classificação. A partir daí, podemos encontrar as possíveis variações das mesmas e eventualmente novas soluções futuras.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/2472653552753527/

Saída de Jogo do Guarda-Redes Aberta em Passe Curto Rasteiro

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/2123177647972575/

Saída de Jogo do GR Aberta em Passe Longo Rasteiro

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/331721524168705/

Saída de Jogo do GR Aberta em Passe Longo Aéreo

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/708977022855106/

Saída de Jogo do GR fechada em passe curto rasteiro + Saída de Jogo do GR Aberta em Passe Curto Aéreo

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/2759663874075745/

Saída de Jogo do GR fechada em passe Longo Aéreo

Para além das soluções identificadas no quadro e nos vídeos acima, outras possíveis conjugações teóricas, não nos parecem ter grande viabilidade no jogo. Porém, ressalvamos que com a alteração da regra do pontapé de baliza, podendo esta também influenciar a reposição do Guarda-Redes, poderão surgir novas soluções, por exemplo importadas do Futsal, entre as quais, mais situações de saídas de jogo do Guarda-Redes abertas em passe curto aéreo, uma vez que estas são raras no momento actual. Contudo, ilustrámos um exemplo deste, na dupla saída de Manuel Neuer e da Alemanha. E continuando nas possíveis alterações provocadas pela nova regra, poderemos ainda assistir à introdução de um quarto critério para caracterizar este princípio de jogo. A mobilidade. Sendo verdade que a mesma já se encontra parcialmente presente nalgumas soluções de saídas de jogo, não nos parece expressiva essas situações, tendo como comparação o que se faz no Futsal. Isto porque no Futsal, essa mobilidade na saída de jogo, realiza-se com a totalidade ou quase a totalidade dos jogadores de campo. No Futebol isso não fará sentido, mas o princípio de jogo talvez possa evoluir para soluções do género com a totalidade ou quase a totalidade dos atacantes que garantem as linhas de passe mais próximas do Guarda-Redes. O exemplo que trazemos não é o mais feliz equacionando o transfere que terá do Futsal para o Futebol, mas é apenas um exemplo que utiliza a mobilidade.

Finalmente… deixamos um último vídeo como forma de “provocação” e de sentirmos que, por muito completa e complexa que seja uma sistematização ou representação teórica, ela nunca reproduzirá de forma perfeita a totalidade da realidade. Neste contexto, a totalidade da realidade do jogo. É o problema do pensamento analítico e da matemática. Muitas vezes a mesma ignora o detalhe, a ligação, a evolução e o tal todo que é mais que a soma das partes. Se todas as situações anteriores, que representam quase a totalidade deste género de acções encaixam perfeitamente no momento de Organização Ofensiva, a que publicamos a fechar este artigo, pertencerá para nós, ao momento de Transição Ofensiva. O que é perfeitamente equacionável na nossa sistematização do jogo, porém distingue-se então de todas as outras. Relembramos a Transição Ofensiva que propomos:

“Se a equipa conseguiu sair com eficácia e rapidamente da zona de pressão, poderá encontrar espaço e / ou uma relação numérica com o adversário interessante para optar pelo contra-ataque.”

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/408416776555028/

Transição Ofensiva | Recação ao ganho + Contra-ataque | Saída de Jogo do GR fechada em passe Longo Aéreo

“Se nós formos fazer um estudo da quantidade de golos que ocorrem nos últimos 2 anos em Portugal, com a quantidade de bolas que saíram do Guarda-Redes para os Defesas-Centrais, se calhar é… 3000% a mais do que era nos anos anteriores. Porque agora identidade é toda a gente querer sair com os Guarda-Redes a jogar com os Defesas-Centrais, e às vezes não há condições para isso.”

(Silveira Ramos, 2019)

Barcelona de Pep Guardiola (2008-2012)

Sub-tema de Treinadores e equipas históricas e no âmbito da dimensão Modelo de Jogo, publicamos Barcelona de Pep Guardiola (2008-2012)Um tema já publicado no antigo blog Saber Sobre o Saber Treinar, porém apresenta alguns novos conteúdos.

Estrutura actual de Saber Sobre o Saber Treinar.

“No futebol está tudo inventado”

“No futebol está tudo inventado” é uma frase tantas vezes repetida pelas mais diversas personagens com as mais diferentes responsabilidades, marcando uma das expressões do pensamento clássico que manteve uma maior estagnação no jogo e no treino. Contudo, a história fez questão de desmentir este lugar comum, mostrando evolução após evolução.

Javier Mascherano, protagonizou um momento de criatividade, proporcionando uma acção que talvez apenas tenha sido realizada pela selecção Holandesa da década de 70. Na função de Defesa-Central, sob pressão alta adversária, e após dobrar passes com o Defesa-Lateral, ao invés de ajustar o seu posicionamento de forma a garantir uma cobertura ofensiva mais segura, decide realizar uma desmarcação de ruptura, no fundo uma acção típica do Futsal. Se o objectivo foi receber mais à frente ou se foi libertar espaço para o Pivô, Sergio Busquets receber, só Mascherano ou colectivamente a equipa do Barcelona o saberão. Arriscamos que tenha sido uma decisão individual, pois nem Busquets baixou a tempo de receber enquadrado, revelando ter sido surpreendido pela acção do companheiro, nem o Guarda-Redes ter Stegen aproximou para garantir a cobertura ofensiva e consequentemente uma solução alternativa. Deste modo foi de facto um momento de criatividade de Mascherano, porém de alto risco, acabando mesmo por correr mal.

Curiosamente, há pouco tempo, em conversa sobre um trabalho em determinada equipa, recordávamos um Defesa-Central que, para surpresa nossa, realizava acções similares no treino, as quais proibimos não só pelo risco elevado que traziam, mas também por colidirem com outro tipo de soluções de construção que procurávamos nessa altura para a equipa. No entanto será bom reflectir sobre isto, não só do ponto de vista individual, dado estarmos a condicionar a criatividade e não a compreendê-la e a enquadrá-la, e do ponto de vista colectivo por estarmos a rejeitar, pelo menos de forma prematura, mais uma possível solução de construção à equipa. Isto num momento em que a organização defensiva das equipas cresceu de forma exponencial, sendo o pressing cada vez mais alto e mais organizado.

Por fim, o que a selecção Holandesa fez na década de 70, foi talvez muito à frente do seu tempo e mesmo do nosso, pois como vários autores e treinadores antecipam, talvez o futuro da organização das equipas passe mesmo por algumas ideias que já marcam o Futsal há vários anos, potenciando uma maior troca posicional e funcional dos jogadores. O treinador português (Jesus, 2009), vai ao encontro desta ideia ao referir: “penso que vai ser esse o grande segredo e evolução do Futebol no futuro, em todo o mundo: vários jogadores com capacidade para actuarem em várias posições”. Também o treinador brasileiro (Parreira, 2002), baseando-se em Mário Zagallo, citados por (Cerqueira, 2009), sustentam esta posição ao explicar que “com o caminho que o Futebol está a seguir, brevemente chegaremos à formação 4-6-0 e para ser bem sucedido vamos precisar de todos os jogadores em volta que possam defender e atacar quando aconselhado”.

“Só o passado está inventado. Se pretendermos afirmar o presente e conjugar o Futebol no futuro, quase tudo está por inventar.”

Júlio Garganta

“There is only one ball, so you need to have it.”

“In my teams, the goalie is the first attacker, and the striker the first defender.”

Johan Cruyff

“A força da Laranja era como o seu Futebol: Total. Uma mecânica colectiva, é certo, mas que não deixava de contemplar diferenças claras entre os protagonistas. Tão claras, que nem as camisolas eram iguais. Isso mesmo! A estrela, Johan Cruyff, tinha menos uma risca preta na camisola laranja. Ele era Puma, os outros Adidas. Foi assim em 1974, com o mundo de olhos postos nesse Futebol revolucionário, dividido entre as proezas de um colectivo e a mestria de uma individualidade”.

(…)

“Aliás, esta é a base de uma filosofia que hoje encanta em Barcelona, onde jogou e treinou Cruyff e onde treinava, também, nesta altura o próprio Rinus Mitchels. A equipa holandesa era formada por um misto das escolas do Ajax, sobretudo, e Feyenoord. Cruyff era a grande estrela, recentemente emigrado para o Barcelona. No papel, Cruyff aparecia como o jogador mais adiantado, o 9, mas na prática não era isso que acontecia. Na realidade, a liberdade de Cruyff fazia dele um jogador diferente em cada momento do jogo. Se a equipa partia em transição, ele era, aí sim, a referência mais adiantada. Se, pelo contrário, a equipa estivesse em organização, ele tornava-se num organizador de jogo. Caprichos tácticos para o jogador mais evoluído entre todos. Cruyff era o que trabalhava menos, mas era aquele que mais rendimento garantia quando a equipa ganhava a posse. Executava com os dois pés, era capaz de acelerar e temporizar, de driblar ou passar. Tudo com uma elegância difícil de igualar num jogo centenário.”

(…) 

“A sua derrota no derradeiro jogo é a evidência de que nem sempre são os melhores a vencer, mas também que nem só os vencedores são recordados como os melhores.”

Sobre Johan Cruyff como jogador e a propósito da derrota da Selecção Holandesa contra a Alemanha na final dos Campeonato do Mundo de 1974, (Sá, 2011)

“(…) cedo criou empatia com a causa catalã, e assumiu ter preferido o Barça ao Real, por não conseguir jogar num clube que estivesse ligado ao ditador Franco. Pela mesma razão não participaria no mundial da Argentina em 1978, porque o país sul-americano era controlado por uma ditadura militar. O ano de estreia foi uma época de sonho. O Barcelona ganhou o primeiro campeonato desde 1960 e Cruyff foi magistral na forma como os catalães esmagaram os rivais no Santiago Bernabéu por 0-5! Como corolário da época em Espanha e do Mundial da Alemanha, recebeu o Balon d´Or, prémio do France Football para o Melhor Jogador do Ano”.

A propósito da chegada de Cruyff a Barcelona, (Silveira, 2011)

Johan Cruyff descreveu Rinus Michels, seu antigo treinador como o seu “primeiro e único mestre do Futebol”. De acordo com (Manna, 2011), “el Ajax de Kovacs, luego el Barcelona a partir de Cruyff, dotaron a sus jugadores con esa técnica y tuvieron una metodología de entrenamiento acorde. No es adaptar un modelo extranjero, es intentar “jugar bien” mediante un camino con critério”. Segundo (Rexach, 2011), depois do legado de Rinus Michels, “hasta que volvió Cruyff en 1988, hicimos foc nou (tabla rasa), y buscamos jugar como queríamos, más o menos. Pero, por encima de todo, nuestro mérito fue demostrar que de esa manera se podía ganar. Porque no todo el mundo nos daba la razón, muchos pensaban que no se podía jugar así. Tuvimos que demostrar que esa filosofía funcionaba y lo conseguimos.

De acordo com (Rexach, 2011),“nuestro éxito fue que empezamos poco a poco. Dijimos dónde jugaba cada número y qué tenían que hacer: ‘Mirad: el 2 hace esto, el 3 esto… Y quietos paraos, cada uno en su sitio y aquí no se mueve ni Dios’. Lo importante no era quién jugaba, sino dónde y a qué. O treinador (Rexach, 2011), explica que num treino, Johan Cruyff colocou o guarda-redes Zubizarreta a avançado, “para dejar claro que más allá de las calidades individuales, que ya las ajustaríamos, lo importante era que todos supieran qué tenían que hacer. Luego empezamos a moverlos. Primero dos: Laudrup se cambiaba con Stoichkov; Laudrup hacía de 9 y Hristo de 11. Luego, tres: incorporabas a Txiki, que era el 10. Entonces giraban tres y cada uno podía hacer lo del otro. Luego el lateral… Ya eran cuatro. Queríamos que cada uno ocupara una parcela del campo e hiciera su trabajo en relación al otro. Pero, para empezar, en vez de eso de tocas y te vas nosotros dijimos lo contrario. En el fondo la idea es sumar la calidad al colectivo”.

“O que Cruyff instituiu é muito difícil de alterar. Estamos tão habituados a isso! É parte da nossa cultura. Atacar, ser dominador do jogo, optar sempre pelo passe ou por conduzir para provocar o passe, nunca conduzir sem razão… o conceito de dar velocidade ao jogo através do passe, de procurar o um contra um apenas com os atacantes…”

Josep Guardiola, analisando o estilo de jogo do Barcelona, na sua passagem pelo A. S. Roma enquanto jogador. El País, 17 de Setembro de 2002, citado por (Moreno, 2009)

“I’m ex-player, ex-technical director, ex-coach, ex-manager, ex-honorary president. A nice list that once again shows that everything comes to an end.”

“If I wanted you to understand it, I would have explained it better.”

Johan Cruyff

O pós Guardiola

Pep Guardiola e Espanha

Percurso de Guardiola no F. C. Barcelona em comparação com competições ganhas pela Selecção Espanhola (fonte www.zerezero.pt).

Como já foi referido anteriormente este espaço evita particularizar os fenómenos em estudo, nomeadamente nos casos negativos. Porém, e porque já publicámos matéria sobre o trabalho de Josep Guardiola no Barcelona e também as suas consequências na selecção espanhola, este caso parece-nos pertinente.

Para os partidários dos números, quantidades e relações causa-efeito, deixamos o quadro anterior. Porém, pensamos que no Futebol, estes números, são na maior parte das vezes consequência da qualidade. Não menosprezando a complexidade do tema e as suas inúmeras variáveis, o exemplo que a cultura táctica que Guardiola elevou no Barcelona parece dar razão a este pensamento. Antes das conquistas, esteve o desempenho que levou as equipas até às mesmas. Apreciando-se, ou não, a cultura táctica do Barcelona de Guardiola era patente e visível a todos. O transfere para a selecção espanhola também. Hoje vemos vários campeões de outrora jogando de forma diferente. Diferente o suficiente para colocá-los mais longe do sucesso. E isto independentemente do desfecho final do Campeonato do Mundo, porque o sentimento que fica é que a Espanha actual, à imagem do Barcelona actual, não domina mais os seus adversários, de forma a colocar-se sempre, mais próximo da vitória.

Assim, a pergunta não era se Josep Guardiola conseguiria idêntico sucesso noutro contexto. Era sim, o que o Barcelona e consequentemente a selecção Espanhola seriam após a sua passagem pelo Futebol Espanhol.

“Muitas vezes a dinâmica que treinador promove numa equipa é muito abrangente, neste caso específico o Guardiola no Barcelona, que era a base que sustentava esta selecção espanhola. Não sei se a sua saída de Espanha não se sentirá nesta Espanha, neste momento.”

Vítor Pereira, no programa RTP Mundial 2014 de 13 de Junho de 2014

Iniesta e Selecção Espanhola

Plano do detalhe

Uma forma de olhar para os detalhes…

Mais do que perceber a biomecânica, compreender os comportamentos.

Futebol de Formação

Josep Guardiola - no futebol de formação do Barcelona

O segredo do Barcelona “são 25 anos da mesma ideia. Foi a base
que fez mudar a primeira equipa e não o contrário. E hoje há uma comunhão
absoluta. Temos um treinador que chegou ao clube aos 13 anos, ganhou uma Taça
dos Campeões, foi capitão de equipa, passou pelas equipas de formação e
compreende tudo. Temos o círculo fechado.”

Director de formação do Barcelona Albert Puig, citado por (Paralvas, 2011)