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O “Aursnes” de Schrödinger. Defender a atacar.

“(…) a consciência de que a expressão tática assume uma importância capital nos jogos desportivos, fez com que, a identificação de regularidades reveladas pelos jogadores e pelas equipas, no quadro das acções colectivas, tivesse despontado enquanto nova tendência de investigação (Gréhaigne, 1989; Lloret, 1994, citado por Garganta, 2001; Hernandez Mendo, 1996, citado por Garganta, 2001; Garganta, 1997). Neste sentido, a maioria dos analistas procuram detectar e interpretar a permanência e / ou ausência de traços comportamentais na variabilidade de acçoes de jogo (McGarry & Franks, 1996, citados por Garganta, 2001).”

(Gil, 2012)

Após o jogo contra o PSG, os elogios ao Benfica de Roger Schmidt foram alargados, em particular à sua estratégia para o jogo, nomeadamente a escolha de Fredrik Aursnes para a função de Médio-Esquerdo. Porém, muitos de nós temos a noção que se o Benfica perdesse, criticas haveriam surgido, porque teria existido medo dos franceses, porque o jogador não teria características para a função, que lhe faltariam argumentos ofensivos para o papel em causa e como tal não iria apresentar o rendimento necessário à função. No entanto, “jogar no Totobola à segunda-feira” é sempre fácil. O sucesso de Rúben Amorim na aposta em Antonio Adán para o jogo no Santa Clara após a infelicidade do espanhol no jogo em Marselha, e em contraposição a situação de Ricardo Esgaio após o jogo contra os franceses em Lisboa, podem ser outros exemplos.

Para quem está de fora do processo, perceber o impacto real que as decisões da equipa técnica terão no resultado de qualquer jogo será sempre um exercício inatingível, tal como o paradoxo do Gato de Schrödinger. Até o observador “abrir a caixa”, ou seja, até ao apito e resultado final, para o espectador o “gato pode estar vivo e morto”, ou seja, o sucesso de qualquer decisão pode ou não acontecer. Um fenómeno complexo e não determinístico como o Futebol trará sempre essa incerteza. Caso contrário não existiriam casas de apostas, e mais importante, as pessoas não sentiriam a atracção que sentem pelo jogo. Sublinhamos… jogo.

À partida e mesmo à posteriori, várias análises referiram o que eventualmente emergiria como mais evidente. Sendo a função original de Aursnes, Médio-Centro e um jogador com maior foco em princípios de cobertura, equilíbrio e concentração, seria expectável defender que ele viria aportar maior qualidade defensiva à equipa, por exemplo, no fecho dos espaços, na agressividade defensiva, no cumprimento das coberturas e compensações, na protecção ao colega de corredor e aos dois médios-centro. Porém, o próprio, em declarações no final do jogo, acrescentou outra perspectiva ao seu papel no jogo. Que o mesmo teria o objectivo de ter um peso ofensivo fundamental, principalmente pela forma como poderia gerir a bola e dar critério à posse do Benfica. Não só como forma de atacar, mas também de defender.

O pensamento reflecte um princípio fundamental da realidade, e como tal, extensível ao jogo de Futebol. O princípio que Vítor Frade denominou como Inteireza Inquebrantável”. Neste caso a inquebrantável relação do todo – jogo de futebol – traduzida nos seus respectivos momentos e sub-momentos. Tal relação deverá ter por base uma visão complexa do jogo de forma a que este seja pensado com uma articulação de sentido, como o próprio Frade e também Jorge Castelo sustentam. Para (Jorge Castelo, 1996) “deriva da concordância organizativa entre o método ofensivo e defensivo e aplicado pela própria equipa. Com efeito, é necessário que os pressupostos fundamentais de um dos métodos não ponha em risco de forma irredutível a aplicação dos pressupostos de eficácia do outro. Neste sentido, a equipa deverá jogar num bloco homogéneo e compacto não só na aplicação isolada de cada um dos métodos pré-estabelecidos, mas também na transição de um para o outro método por forma que não haja quebra na continuidade do processo ofensivo ou defensivo”. Na mesma linha de pensamento surge (Julian Tobar, 2013) sustentando que a articulação de sentido torna-se “um imperativo para o sucesso de uma equipa, visto que se perdermos de vista o “todo” (leia-se o jogar) que se pretende, desarticulando uma “parte” das demais, certamente isso refletir-se-á no jogar da equipa. Portanto o treinador ao modelar o seu jogar deverá ter em conta justamente isso, a interligação e a congruência de tudo para o “todo””. Ainda Tobar, estabelecendo uma comparação e citando “Conde (2010), seria possível dizer que a organização defensiva, a organização ofensiva e as transições são como as rodas de um carro: devem rodar simultaneamente”.

Deste modo, perante uma equipa com jogadores incríveis com bola, retirar-lhes a mesma, seria potencialmente de facto uma boa estratégia para os defender. Para mais quando muitas vezes essa equipa defende com apenas GR+8 e até GR+7 atrás da linha da bola, com uma última linha de 5 jogadores dificultando a pressão e recuperação da bola à segunda linha de apenas 2 médios e ainda quando os que ficam à frente da linha da bola têm pouca disponibilidade para o momento defensivo, nem mesmo para o fecho das coberturas ofensivas do adversário, o que consequentemente permitirá que este circule a bola por trás conseguindo assim tirar com alguma facilidade a bola de zonas de pressão. Juntando-se a não imperativa necessidade do Benfica em vencer o jogo e podendo assim dar maior critério à sua posse no sentido de a manter, arriscando menos a progressão e nos sub-momentos de criação, a escolha de Aursnes, foi deste ponto de vista, uma ideia de facto interessante.

Importará dizer que nem a equipa técnica conseguirá pré-determinar se o “gato está vivo ou morto no interior da caixa”, ou seja, se a opção tomada irá ou não resultar até o jogo de facto se consumar. No entanto, tendo em conta o seu conhecimento e experiência, nomeadamente a específica relativa à equipa, aos jogadores, às suas características, à sua mentalidade, ao seu momento, à forma como treinam, como estarão as suas vidas pessoais, etc., será com certeza a mesma, quem estará mais perto de se aproximar da predição do resultado da “experiência”. Contando que, surgirão sempre imponderáveis, e irão errar e tomar opções que não irão resultar. Pois recordamos que… estamos perante um acontecimento não determinístico.

Finalizando, o interessante para nós não foi se o “gato viveu ou morreu”, mas sim a lógica da intencionalidade de Roger Schmidt e o que de facto Aursnes provocou ao jogo do Benfica, e em contraposição ao jogo do PSG. Claro que se o jogo se voltasse a repetir, as condições iniciais seriam irrepetíveis e o resultado (do desempenho) individual de Aursnes e colectivo, poderiam ser drásticamente diferentes. Mas interessando-nos encontrar lógicas, e se possível padrões, podemos então ganhar experiência para problemas similares no futuro, tendo sempre a consciência, como sublinhado, que nada se repetirá integralmente. Tendo por base esta consciência, por outro lado encontrar padrões e reforçar a sua bagagem ao nível do Conhecimento do Jogo deverá ser o papel do treinador e dos que queiram analisar o jogo e o desempenho das equipas de forma séria e honesta.

“No nosso entendimento, o jogo de Futebol é fluído na passagem do processo ofensivo para o defensivo e vice-versa, requisitando uma organização de jogo unitária, articulada em função do «todo» que se deseja, pelo que se possa afirmar que “… não há nada mais construído que o jogar. O jogar não é um fenómeno natural, mas construído” (Frade, 2002, in Amieiro, 2004:115). Para uma análise do jogo sem que lhe seja destruída a sua organização dinâmica indissociável, consideramos necessário que se entenda que apesar de serem antagónicos, processo ofensivo e defensivo estão em íntima relação, já que, tal como a luz e a sombra, o preto e o branco, também esses dois processos só podem ser conhecidos um em função do outro (Teodorescu, 1984; Bayer, 1994; Queiroz, 1986; Castelo, 1994; Garganta, 1996).”

(José Laranjeira, 2009)

Organização Ofensiva [Subscrição Anual]

Publicamos o tema Organização Ofensiva. Importa transmitir que esta publicação, à imagem de outras futuras direcionadas para os outros três momentos de jogo, trará nesta primeira abordagem uma perspectiva eminentemente macro. Trata-se porém, de um tema muito vasto e com tanto potencial para explorar ao nível do detalhe, o que irá suceder no futuro. Deste modo, antecipamos, que a partir deste tema, traremos outros, sub-dividindo-o para esse efeito, nos seus três sub-momentos e a partir daí, a uma escala ainda mais micro, em princípios e sub-princípios.

Contudo, a abordagem que aqui fazemos, ainda que uma “fotografia” ao quadro geral do momento de Organização Ofensiva, tendo em conta o potencial do tema, acabou por necessariamente se tornar extensa e, na nossa opinião, um passo fundamental para compreender não só o momento em si, mas também o jogo no seu todo.

O tema Organização Ofensiva encontra-se enquadrado em:

Por outro lado este tema será constituído pelos seguintes capítulos:

  1. Enquadramento
  2. Um jogo “descerebrado”
  3. Desconstruir e compreender o momento de Organização Ofensiva
  4. Jogar… ofensivamente… “bem”
  5. A dinâmica – tempo, espaço, número e… qualidade
  6. Defender começa quando se ataca e… atacar… começa quando se defende
  7. Traços de qualidade ofensiva
  8. Máxima variabilidade para… máxima adaptabilidade
  9. Situações de bola parada ofensivas

Deixamos alguns excertos do tema Organização Ofensiva. Dada a extensão do tema, partilhamos aqui um pouco mais do que o habitual.

“Sem a bola, não podes vencer.”

(Johan Cruyff)

Parece-nos claro que a grande atracção que o Futebol traz aos seus entusiastas provém de acções elementares do jogo como o drible, o passe que rompe linhas, o último passe que coloca o atacante na cara do guarda-redes adversário, ou aquele seu “descendente”… o cruzamento perfeito que descobre um atacante livre para finalizar. Mas também a difícil recepção, o detalhe técnico invulgar, a simulação que engana toda a equipa adversária, a ideia divergente que ninguém esperava e trouxe sucesso à jogada, etc., etc… Ou ainda por outras um pouco mais complexas como a combinação, mobilidade e permutas entre jogadores, e até do ponto de vista colectivo, a dinâmica que algumas estruturas das equipas trazem ao espectador, jornalista e técnico, tal qual um bando de aves a voar numa sincronia perfeita. Porém, acima de tudo isto, claramente que se posicionam a finalização e o golo. Estes momentos são sem dúvida o epicentro do jogo de Futebol.

O denominador comum entre todas estas acções, manifesta-se em serem as que se enquadram no jogo ofensivo das equipas, independentemente se depois, em função de cada contexto de jogo, sucedam em Transição Ofensiva ou Organização Ofensiva. Por outro lado, sendo verdade que se tem assistido ao longo da evolução do jogo a uma crescente “espectacularidade”, mediatização e valorização das acções realizadas nos momentos defensivos, é no entanto, sem grande dúvida, o ataque e a expectativa em relação à forma como os jogadores dão uso à bola, os comportamentos que ainda promovem a maior atracção à maioria dos apaixonados pelo jogo.

(…)

Uma ausência de critério e intencionalidade, o tal jogo “descerebrado” transmite uma ideia de navegação à deriva que só por acidente, trará o sucesso desejado. Sucesso esse que perante tal enquadramento, será muito provavelmente pontual. Com naturalidade, esta era uma característica do jogo das equipas nos primórdios do Futebol, até que as experiências e a reflexão de jogadores e treinadores fizeram-no evoluir para o nível actual. Hoje, no jogo de nível superior, a grande maioria das equipas mostram intencionalidades e ideias, independentemente, depois, da sua maior ou menor qualidade. Que sublinhamos… qualidade essa… ditada pela regularidade da eficácia que tais ideias potenciam, em interacção com a qualidade individual dos jogadores. É sobre essas ideias que nos debruçamos, procurando a provável utopia do melhor caminho para chegar a um sucesso… regular. Mantendo também, sempre a consciência que tal caminho estará sempre em permanente construção e evolução.

(…)

Neste sentido, (José Laranjeira, 2009) conclui que assim é imperioso tornar o processo ofensivo mais objectivo e concretizador, conduzindo à criação de um maior número de oportunidades de golo e correspondente concretização“. Com um pensamento praticamente idêntico, (Pedro Bessa, 2009) também sublinha que “para todos que pretendem ver um Jogo revestido de qualidade e de espectacularidade, existe a necessidade de tornar o processo ofensivo mais objectivo e concretizador, para que se criem mais oportunidades de golo e se atinja uma maior eficácia em jogo (Luhtanen, 1993, cit. por Pereira, 2008)”. No mesmo sentido surge ainda (Pedro Barbosa, 2009), defendendo que perante “a raridade existente de golos num jogo, é provavelmente essencial que as equipas para ter sucesso, necessitem de possuir um processo ofensivo eficaz e eficiente (Yamanaka et al. 1988; Szwarc, 2007)”. Para tal, (José Laranjeira, 2009) acredita que só através da criação de desequilíbrios, por comportamentos individuais e colectivos, se consegue provocar surpresa no adversário“.

Se foi uma realidade, que a determinado momento do jogo a evolução da organização defensiva das equipas se sobrepôs ao investimento na organização ofensiva, por outro lado, como abordamos atrás, tem havido uma confusão entre eficácia, eficiência e estética. Muitas análises e avaliações do jogo, tendo em conta determinados contextos culturais, preferências pessoais e atracção por determinada estética de jogo, que muitas vezes, até está desfasada das próprias regras do jogo, tem levado a que determinadas ideias sejam defendidas e difundidas, mesmo estando pouco relacionadas com a eficiência, consequentemente com a eficácia, e portanto, com o sucesso. Porém, devemos compreender que tal realidade faz parte da evolução natural do jogo, tal como sucedeu, numa perspectiva mais macro, com a espécie humana. Torna-se então fundamental entender o jogo, os potenciais caminhos que geram aproximações à obtenção de sucesso no mesmo, e o consequente trajecto da sua evolução.

(…)

Mais tarde, procurando caracterizar de forma mais específica o momento ofensivo, no qual a equipa já se encontra organizada coletivamente para atacar, no estudo que realizou, (Júlio Garganta, 1997) defende que “no plano da organização ofensiva das equipas de Futebol, não obstante a natureza aleatória e diversificada das acções de jogo, é possível detectar vias e formas preferenciais de acção dos jogadores, expressas na forma como se comportam algumas variáveis e do modo como elas se agrupam para interagir. Ou seja, embora não exista um determinismo absoluto, a análise das sequências de jogo permite apurar regularidades e variações exibidas pelas equipas que exprimem uma lógica observável“. Deste modo, torna-se importante procurar “mapear” o jogo para que seja mais fácil a sua leitura, interpretação, análise, e posterior investimento no trabalho sobre determinadas “regiões” do mesmo.

(…)

Perante estas ideias propomos três sub-momentos para o momento de Organização Ofensiva: a Construção, a Criação e a Finalização com a seguinte lógica:

  1. Construção: quando ambas as equipas se encontram dentro da sua organização para atacar e defender e quando a bola se encontra fora do bloco da equipa que defende.
  2. Criação: quando a equipa que ataca consegue penetrar no bloco da equipa que defende e surge perante a última linha adversária ou a última linha e mais um médio em contenção. A excepção é quando a equipa que ataca procura um jogo mais directo, de ataque à profundidade, ou seja, de passe directo para o espaço entre a última linha de quem defende e o seu Guarda-Redes, o que acaba por se configurar como uma situação de último passe, independentemente do grau de dificuldade superior da acção. Neste sub-momento, integram-se também todas as situações de bola parada ofensivas que poderão permitir um último passe ou cruzamento e finalização. Devemos referir que compreendemos as opiniões que distinguem as situações de bola parada como um quinto momento do jogo, porém a nossa interpretação é que, independentemente do jogo estar parado ou em movimento, se uma equipa está organizada para defender essas situações e a outra para atacar, então estarão dentro da sua Organização Defensiva e Organização Ofensiva, respectivamente.
  3. Finalização: todas as acções que visam o momento final de ataque à baliza adversária, portanto, a acção individual ofensiva de remate, independentemente da superfície corporal envolvida. Aqui também se integram as situações de bola parada ofensivas que poderão permitir um remate directo à baliza. Importa ainda referir que a finalização pode até surgir quando a equipa que ataca tem pela frente todo o bloco adversário ou parte do mesmo. Contudo, se quem ataca conseguiu chegar ao remate, esses momentos de organização defensiva adversários falharam de alguma forma.

Organização Ofensiva – Sub-momentos do jogo.

(…)

Regressando a uma perspectiva macro do jogo, na opinião de (Lobo, 2007), citado por (Rodrigo Almeida, 2009), “uma das virtudes das Equipas que jogam bem é a capacidade de criar oportunidade de golo através de jogadas elaboradas”. No entanto, o mesmo autor, recorredo a (Castelo, 1994), também adverte que “há formas de organização incompletas sendo caracterizadas por todas as formas de processo ofensivo que não chegaram a zonas predominantes de finalização”. Por outro lado, (Júlio Garganta, 1997) refere que “Sledziewski & Ksionda (1983a) chamam também à atenção para situações que ocorrem durante um jogo de Futebol, nas quais uma equipa, encontrando-se momentaneamente em posse da bola, não manifesta a intenção de finalizar, nem de se aproximar da baliza adversária. Estes casos surgem, frequentemente, quando uma equipa pretende jogar para manter um resultado que lhe é favorável“. Assim, (Jorge Castelo, 1996) acrescenta que a equipa que “está em posse de bola, para além de poder concretizar o objectivo do jogo – o golo, poderá igualmente:

  • Controlar o ritmo específico do jogo, pois, em função do resultado (numérico) momentâneo é que se poderão contrapor acções técnico-tácticas que acelerem ou diminuam este ritmo;
  • Surpreender a equipa adversária através de mudanças contínuas de orientação das acções técnico-tácticas e atempadamente fazer uma ocupação racional do espaço de jogo em função dos objectivos tácticos da equipa;
  • Obrigar os adversários a passarem por longos períodos sem a posse da bola, levando-os a entrar em crise de raciocínio táctico e, consequentemente, a expô-los a respostas tácticas erradas em função das situações de jogo;
  • Recuperar fisicamente com o mínimo de risco.”

No vídeo, a Croácia decide utilizar a posse e circulação da bola para defender a vantagem nos minutos finais do jogo. Jorge Castelo acrescenta então, que “as equipas ao encontrarem-se em posse de bola, não significa que realizem qualquer acção ofensiva, verificando-se que a finalidade destas situações se resume à “perda de tempo”, “jogar para manter o resultado” ou “quebrar o ritmo ofensivo do adversário””.

No entanto, o autor, adverte que a posse da bola não é um fim em si e torna-se utópico, se não for conscientemente considerada como o primeiro passo indispensável no processo ofensivo, sendo condição “sine qua non” para a concretização dos seus objectivos fundamentais: a progressão / finalização e a manutenção da posse da bola“. Na mesma linha de pensamento surge (Faria, 2003) citado por (Abílio Ramos, 2005) ao defender que “é importante ter a posse de bola se ela tiver um objectivo claro como, por exemplo, atacar. Posse de bola por si só não tem significado absolutamente nenhum se não tiver um objectivo claro“. Também (José Pedro Loureiro, 2022) explica que “um dos exemplos mais recorrentes no futebol de hoje em dia é a posse de bola inconsequente: “muitas vezes, observa-se que a equipa (principalmente no início da fase ofensiva) fica empenhada em passar a bola, sem manifestar qualquer intenção de ataque à baliza adversária” (Araújo & Volossovitch, 2005). Ou seja, a ação de passar a bola enquanto fim, e não enquanto meio, viola o conceito de representatividade da tarefa. Fosse eu um apostador obsessivo e arriscaria todas as minhas fichas como o tiki-taka simplesmente aconteceu (emergiu), não se treinou (propriamente com esse intuito)!”

(…)

(…)

Porém, fundamentalmente as equipas têm de procurar um jogo de qualidade… ou seja… um “jogar bem“. Para tal, o traço principal desse jogo deverá ser o sucesso regular, tendo-se naturalmente em conta o contexto. Deste modo não há sucesso regular sem eficácia… regular. Uma eficácia regular só se atinge fazendo mais vezes bem as coisas, portanto, ao nível do posicionamento, decisão e execução. Falamos assim, da procura da eficiência. No domínio particular da Organização Ofensiva das equipas, o autor (Pedro Barbosa, 2009) sustenta então que as equipas terão que arranjar mecanismos e formas de atingir mais vezes a baliza adversária e se possível com grande eficácia. Esta situação solicita aos investigadores em Futebol a capacidade das suas análises abrangerem, não apenas, os momentos do golo, mas também a análise de todas as oportunidades criadas, de forma a tentar objectivar-se esse mesmo golo (Garganta, 1999; Yiannakos & Armatas, 2006)”.

(…)

Assim, (Rodrigo Almeida, 2009) chama a atenção para que a Objectividade subjacente salientada como uma Intencionalidade não pode ser confundida com “jogo directo”. Objectividade tem duas vias de acordo com o termo, a primeira via é a objectividade do jogo, i.e., destinar-se à baliza [o que leva a muitos ao jogo frenético e directo], jogo vertical, onde o meio campo assume um papel fundamental na recuperação das segundas bolas e no aproveitamento destas em espaços mais profundos (Pedro Sousa, 2009), a segunda via é a objectividade circunstancial, ou seja, ser objectivo, ser oportunista, não perder o momento porém acima de tudo ser experto, não perdendo o foco do principal sabendo que para onde ir e o que fazer. Camacho (2003a; cit. por Amieiro, 2005, p.60) colmata esta opinião ao referir que é preciso «saber-se jogar Futebol». E saber jogar bem não é só dominar a bola, driblar, chutar e marcar um golo. “Saber jogar é perceber o que a Equipa precisa em cada momento do jogo…”“. Na mesma linha, (Pedro Bouças, 2014) defende então que não pode existir um dualismo entre o jogo directo e indirecto. Dando um exemplo, para o autor, ser da boa tomada de decisão não é ser de posse ou de contra-ataque. É ser de posse quando o adversário está organizado e o espaço escasseia e é ser de contra-ataque quando há espaço e situação numérica para tal“. Na mesma linha de pensamento, também relacionando os momentos de Transição Ofensiva e Organização Ofensiva, (Tiago Margarido, 2015) sustenta que “quando não for possível aproveitar a desorganização posicional do adversário devemos ter a capacidade de realizar uma rápida circulação de bola e trocas posicionais eficazes com vista a criar uma forte dinâmica ofensiva de modo a desorganizar a equipa adversária e a criar situações de finalização”.

(…)

Estas ideias sobre a Organização Ofensiva das equipas reflectem uma enorme importância no pensamento relativamente à dimensão espaço. Deste modo, surgem de alguma forma influenciadas por Johan Cruyff e os seus mentores, que apontavam o espaço como elemento decisivo no jogo. O autor (Winner, 2000), descreve que Barry Hulshoff, companheiro de equipa de Cruyff na selecção holandesa de 1970, realatava que discutiam espaço o tempo todo. Cruyff falava muito sobre para onde os jogadores deveriam correr, onde deveriam permanecer e para onde não se deveriam mover. Sempre com a intenção de criar espaço e utilizar esse espaço“. Também o jogador espanhol (Juan Mata, 2016), citado por (Wikiquote, 2018), confessa que considera Cruyff “o pai ideológico do Futebol. Aquele que procura imitar em campo e aquele com quem procuro aprender quando, como espectador, assisto a um jogo. A inteligência na gestão da bola e dos espaços, a importância do talento sobre o físico e o entendimento do Futebol enquanto jogo de equipa, são conceitos que definitivamente eu abracei“.

(…)

A propósito do trabalho marcante de Helenio Herrera no Inter de Milão, e de acordo com (Ignacio Benedetti, 2021), quando lhe perguntavam pelo trabalho dos seus discípulos, ou pelo trabalho dos treinadores que procuravam replicar as suas ideias, o treinador franco-argentino declarava que não os entendia porque apenas haviam tentado copiar “as formas de defender, e não as formas de atacar a partir da forma como se defendia“. De acordo com o autor, este pensamento revela basear-se em aspectos “geográficos“, que se podem isolar, “como defende aquela equipa ou como ataca a outra equipa, porque nos deixamos levar pelas etiquetas. Este é um treinador defensivo e este é um treinador ofensivo”. Porém segundo o mesmo autor na realidade, os grandes treinadores não conceberam o jogo de forma isolada, de forma separada”, mas segundo uma visão global do jogo e da forma como o sentem. Reforçando a ideia, Benedetti acrescenta que “as equipas “defensivas” de Mourinho fizeram uma quantidade impressionante de golos. As equipas “defensivas” de Helenio Herrera fizeram um enorme número de golos. As equipas “ultra-ofensivas” de Guardiola foram equipas que evitaram que os seus adversários pudessem chegar à sua baliza. É aqui que o futebol se torna apaixonante porque nos leva a essa rebeldia de pensar e não nos deixar levar pela imediatez do dos meios de comunicação e de todos os que se querem postular como analistas do jogo, mas que na realidade apenas o pensam de forma superficial. O Futebol é um todo“.

(…)

Para (Vítor Frade, 2013), torna-se então fundamental compreender que “o que nos distingue das outras espécies é de facto… e nós chegamos a esta espécie e chegamos a ser o que somos pela criatividade. Contrariamente ao que se pensa, é a autoengendração que assegura que nós possamos superar as dificuldades, isto num sentido individual. O que acontece por isso, em termos de grupo, hoje fala-se na inteligência de massas, ou não sei o quê, ou da inteligência enxame, mas é de facto uma necessidade imprescindível, mesmo aí, a criatividade. Eu costumo dar uma metáfora que é assim: eles estão perante um tema, mas quem faz a redacção são eles e a redacção é condizente com o contexto, e com o momento, com a capacidade momentânea e muitas coisas, mas essa é deles! E essa muitas das vezes é à la long, e na continuidade da causalidade excepcional repercute-se numa melhoria, na melhoria da coordenação, da organização da própria equipa. Uma condição da existência das pessoas é serem criativas!“.

(…)

Também citado por (Pedro Bessa, 2009), outro treinador português, José Gomes, afirma que estas situações de jogo “podem ser aproveitados para tornar determinado momento de transição de uma ou de outra forma” (Anexo III)”. Assim, no pensamento do treinador, as situações de bola parada sãomomentos de jogo que são ofensivos e defensivos e que estão incluídos nestes” (Anexo III)”. Portanto, de acordo com (Pedro Bessa, 2009) para José Gomes, tal como de Carlos Carvalhal, as situações de bola parada estão incluídas “nos momentos ofensivos e defensivos, como todos os outros momentos destas fases, não fazendo sentido falar em momento alternativo de jogo”. Contudo, importa perceber que estas situações não estão apenas incluídas nos momentos de Organização. Como é facilmente entendível, por exemplo, um livre, lançamento lateral e até canto ou mesmo pontapé de baliza, nos quais a equipa que defende ainda não recuperou a sua Organização Defensiva, estará então no sub-momento Recuperação Defensiva da Transição Defensiva e quem ataca estará em condições de explorar o sub-momento contra-ataque da Transição Ofensiva. Se efectivamente o fará já será depois uma decisão a tomar.

(…)

“(…) não existe treinador que no seu íntimo não pretenda ser o “deus de Laplace” – conseguir prever com uma certeza infinitésimal a evolução do jogo, controlar esse sistema multivariável. Por isso, talvez ele preferisse substituir a variabilidade pela estereotipia na expectativa de que as atitudes dos seus jogadores fossem previstas e articuladas com a máxima certeza, de que as propriedades topológicas do movimento que eles manifestam fossem as menos variáveis. Ele deve, no entanto, aperceber-se que a máxima estereotipia, correspondendo à mínima variabilidade, corresponde, também, à mínima adaptabilidade…”

P. Cunha e Silva (1995) citado por (Júlio Garganta, 1997)

 

Três ideias (exercícios) para desenvolver a circulação de bola em largura [Subscrição Anual]

Voltamos a publicar ideias, sob forma de exercícios de treino, que têm por objectivo o desenvolvimento do momento de organização ofensiva do jogo. Desta vez, em alternância à profundidade, estaremos à procura de desenvolver a largura no jogo da equipa. Não só ao nível posicional, mas neste caso concreto, pela circulação da bola entre dois ou os três corredores de jogo.

Como temos vindo a referir, a posse e circulação da bola, salvo raras excepções, não pode ser um fim em si mesmo. É no fundo um meio para atingir outros objectivos, quer ofensivos, quer mesmo defensivos. É fundamentalmente por essa razão que Guardiola declarou “odiar o tiki-taka”. É também por essa razão que (Luís Castro, 2017), também afirmou que “a posse de bola não é um objectivo, é uma consequência… do meu jogo”. Do ponto de vista ofensivo, (Pedro Bouças, 2017) dá um exemplo, explicando que “fazer desmoronar um adversário de qualidade tem também muito a ver com o tempo que o fazes correr”, sendo que para tal, é mais fácil consegui-lo pela circulação à largura do que na profundidade. Na sequência do mesmo exemplo, (Azevedo, 2011), explica: imagine-se que um treinador quer implementar na sua equipa a posse e circulação de bola como um comportamento/princípio no momento de organização ofensiva. Ele pretende que essa circulação de bola seja feita em toda a largura do campo, jogando de uma forma apoiada com passe curto e seguro, à procura de espaços para desorganizar a equipa adversária”. Mas o autor vai mais longe e explica que a partir de uma ideia, o jogo da equipa e as características dos jogadores devem permitir que a ideia inicial, ou seja, o Princípio, seja aberto a eventuais novas formas de o atingir. Na mesma linha de pensamento surge a treinadora (Gomes, 2011), sustentando que “com Organizações (entenda-se princípios) diferentes temos equipas diferentes. Contudo, todos percebemos que as características dos jogadores são decisivas na configuração dos princípios de jogo. Não nos princípios mas no modo como esses princípios se desenvolvem e expressam“.

Também o autor (Maciel, 2011) defende que a um nível mais micro, o qual denomina de SubSubPrincípios, surgem “aspectos mais micro, aspectos de pormenor à priori desconhecidos, uma vez que surgem pela dinâmica do processo e emergem sobredeterminados pelos níveis de maior complexidade, ainda que sem perda de identidade ou singularidade. Por serem desconhecidos à priori eu não os posso, nem devo estabelecer previamente, são particularidades que vão surgindo e que eu tenho de saber aproveitar para alimentar e exponenciar o crescimento do meu jogar, que não perdendo as formas do esboço inicial, vai assumindo uma configuração ao nível do pormenor que é única. Tem de haver muita sensibilidade e receptividade da parte do treinador, no sentido de aproveitar estas emergências de pormenor. Quando refiro receptividade quero dizer abertura, pois só isso permite que eu aproveite e tenha disposição, para partindo das minhas ideias rentabilizar e explorar os acrescentos que o envolvimento me trás a tais ideias“.

Deste modo, a criatividade tem aqui um papel preponderante. Quando o jogador, ou a equipa encontra uma nova solução para resolver o problema, que o treinador não antevia quando definiu o Princípio. Regressando ao exemplo, Azevedo descreve que o treinador transmite a ideia, vai trabalhando e percebe que há um jogador que apresenta uma boa leitura/visão de jogo aliada a uma qualidade e precisão no passe longo. Então, o treinador pode aproveitar essa característica porque através dessa precisão no passe longo, o jogo tornar-se-á mais rápido. Por isso, através da alternância entre passe curto e passe longo, a velocidade da circulação de bola pode ser muito maior. Poderá aproveitar toda a largura do terreno e criar maiores desequilíbrios na estrutura defensiva do adversário”.

Mas (Maciel, 2011) ressalva que ““importa referir que essas emergências de pormenor não são só aspectos a exponenciar, não raras vezes constituem-se como aspectos a recusar, e eu tenho que ter sensibilidade para perceber que em determinados contextos e situações os princípios têm de ser fins. Como tal poderei ter necessidade de fechar, mas só o devo fazer a partir do que depreendo do processo e dos contornos que este vai assumindo no aqui e agora e não à partida. Se o fizer à partida, corro o perigo de cair na vertigem de treinar sobre carris. Parto do pressuposto que os jogadores me podem dar tudo, em termos de detalhe, o que entendo ser necessário para jogar o meu jogar com qualidade, se verifico que há coisas que tenho de ser eu a regular externamente porque eles não o fazem ou ainda não fazem, ok, aí o princípio (subsub) passa a ser fim, mesmo que possa não ser de forma permanente mas temporária e transitória. Cruyff diz que a melhor forma de ensinar não é proibindo, mas sim guiando, eu concordo totalmente mas acrescento que por vezes para guiar se torna necessário proibir. Mas a regulação do trânsito, que é a funcionalidade da equipa vai se fazendo, sabemos o sentido a dar ao caminho e vamos colocando sinalização conforme para que o caminho permita uma boa fluidez, por vezes colocamos sinais proibidos generalistas, outros só a peões, outros só para bicicletas, outros para pesados… e quando percebemos que o trânsito está a ficar regulado à nossa imagem podemos tirar sinalização, porque pelo hábito já se tornou funcional“.

“Adoro a regra
que calibra a emoção,
apaixona-me a emoção que não se nega
a levar a regra à correcção.”
(Frade, 2014)

Os três exercícios apresentam uma lógica progressiva, nomeadamente na sua dimensão estrutural:

Exercício 130 | Circulação de bola aos dois corredores laterais sem oposição (exercício grupal)

Exercício 128 | Pontuar em variação de corredor (exercício grupal ou intersectorial)

Exercício 129 | Jogo colectivo em variação da metade vertical do campo (exercício intersectorial ou colectivo)

A “posse de bola” e os números

O autor desta opinião, e o seu nível de conhecimento, não são importantes para o caso. O conteúdo, como milhões de outros, também poderia não ser. Torna-se relevante, para nós, porque é um género de opinião que tende a generalizar-se, consoante… os resultados. Agora, no passado e com certeza, no futuro.

Se o que influencia este género de opinião são preferências por uma “estética” de jogo diferente, a crença em ideias menos pacientes e mais directas no momento ofensivo, ou até a hostilização das equipas que se tornam dominadoras no jogo e a consequente menor imprevisibilidade e emocionalidade que isso traz ao espectador, não podemos saber. O que sabemos é que defendê-la com premissas, para nós, tão irrelevantes como as apresentadas, são autênticos atestados de ignorância… no mínimo… táctica. É também por isto que é extremamente difícil construir uma equipa que assente a sua qualidade de jogo, não na posse bola… mas na qualidade da sua posse de bola. Pegando no exemplo do Barcelona de Guardiola, a autora (Gomes, 2012) sustenta que a sua qualidade na posse “só é possível quando realmente se gosta muito da bola e faz com que o valor da bola seja superior à precipitação do adepto, à pressa do adversário e à ânsia em fazer a bola andar pelos espaços em disputas”.

Estamos perante mais um bom exemplo, no qual, os números e a estatística na análise do jogo, continuam, como tantas outras áreas, impregnadas pelo pensamento mecânico e analítico. Impregnada, e não completamente irrelevante, porque a estatística, aliada ao conhecimento do jogo, nomeadamente na identificação de regularidades comportamentais, pode ter um papel útil ao treinador, ajudando-o no construção do jogo que idealiza para a equipa. Por exemplo, num artigo anterior, defendemos que a perda de bola será um dado estatístico no jogo, muito interessante.

Não é difícil entender que uma média elevada de posse de bola não é sinal de controlo do jogo, portanto, de qualidade de jogo. O controlo do jogo pode ser obtido de diferentes formas, em função de diferentes ideias, crenças e consequentemente, formas de jogar. Recordamos as equipas italianas, na década de 90, que naquele momento da evolução do jogo, o controlavam os jogos de forma exímia pela sua Organização Defensiva e Transição Ofensiva, e emocionalmente sentiam-se extremamente confortáveis nessas ideias. Portanto, claramente abdicando de possuírem a bola na maior parte do tempo de jogo. Porém, hoje, ter qualidade no momento ofensivo, tornou-se impreterível. Assim, possuir a bola, mas fora do bloco adversário, portanto, estar a maior parte do tempo na Fase I do momento ofensivo, chegando poucas vezes à Fase II e praticamente nunca à Fase III com certeza que não ameaçará o adversário, aumentando-lhe o conforto e a confiança. Uma excepção, poderá ser fazê-lo, perante uma equipa que, precisamente e, devemos dizer, perigosamente, as suas ideias passam apenas pelo momento ofensivo do jogo e assim se desorganiza quando não a tem. No resto dos casos, ter mais posse de bola não significa, por si só, ser-se melhor no jogo. É um dos passos nesse propósito, o segundo é saber… o que fazer com ela. Johan Cruyff, citado por (Amieiro, 2009), explica que “ter a bola não significa tê-la e pronto. Há que saber o que fazer com ela. Quando eu digo que enquanto nós temos a bola o adversário não a tem e, portanto, não pode marcar, o que quero dizer é que nós mandamos e temos a iniciativa do jogo. E como tenho a bola, eles têm que a tentar roubar e, com isso, consigo criar espaço”. Também para o treinador português (Luís Castro, 2017), “a posse de bola não é um objectivo, é uma consequência… do meu jogo”.

Portanto, circular a bola pela primeira linha, mesmo que já no meio-campo adversário, sem ideias, mobilidade, mudanças de velocidade, agressividade e criatividade, é totalmente diferente do que tê-la, com essas qualidades todas, e conseguir ainda penetrar diversas vezes no interior do bloco adversário e / ou ameaçando também, com critério e regularidade, a sua profundidade. Este segundo cenário, consequentemente, levará a equipa a poder criar situações de finalização, não permitindo que a equipa adversária esteja tranquila, confiante, portanto, emocionalmente estável no jogo.

Todavia, num segundo pensamento sobre os dados apresentados, seria para nós muito mais interessante perceber quem é que treinava, num dos maiores clubes desse país, os jogadores mais influentes no jogo da Espanha, campeã do mundo em 2010, e da Alemanha, campeã do mundo em 2014. E perceber, depois disso, o declínio do seu jogo. Por outro lado, podemos também tentar compreender a forma como Pep Guardiola está a influenciar a cultura inglesa. Depois, se pensarmos ainda no papel decisivo que o trabalho de José Mourinho no F. C. do Porto teve, na qualidade de jogo e no rendimento da selecção Portuguesa no Europeu de 2004, e noutros exemplos similares, também podemos questionar que margem de intervenção e que papel terá um seleccionador / treinador nacional.

“Por muito que nos vendam estatísticas que queiram quantificar performances individuais, o jogo, o bom jogo, está completamente longe de poder ser interpretado ou quantificado por números que queiram trazer avaliações qualitativas. Porque não se pode quantificar a qualidade do que mais importa! As decisões!”

Pedro Bouças, 2017

“Odeio o “tiki-taka”. A posse de bola é apenas um método para organizar a equipa e desmontar o adversário…”

Pep Guardiola, 2014

“De Guardiola
p’ro Barcelona e selecção espanhola
do Bayern à selecção d’Alemanha,
e Guardiola sempre ganha
continuando a revolucionar,
o jogar…
Quem gosta de jogar à bola
Quem gosta de ir ver jogar,
Só pode reconhecer em Guardiola
O melhor p’ra tudo isto melhorar.”
(Frade, 2014)

Exercício gratuito

Publicamos um novo exercício gratuito: “Posse por zonas“.

O exercício surgiu num caderno de exercícios que José Mourinho terá colocado à disposição do Chelsea F. C. na sua primeira passagem pelo clube.

Na articulação de sentido entre momentos e princípios de jogo, dados os objectivos e características do exercício, o foco deverá estar no momento de transição ofensiva, respectivo sub-momento “Reacção ao ganho da bola”, mas principalmente no momento de organização ofensiva e respectivo sub-momento “Construção”, mas especificamente, na “Posse e circulação de bola”.

Será um trabalho que comportará algum risco de descontextualização pela ausência de alvos, portanto deverá surgir numa fase inicial da sessão de treino e deverá ser seguido de progressão de forma a enquadrar a Posse e os princípios aí treinados numa organização estrutural e noutras fases de construção que tragam o direcionamento do ataque e a procura da baliza adversária. O exercício apresenta-se muito propenso a progressões e adaptações, em função das necessidades de cada equipa.

Do exercício emerge uma necessidade dos atacantes sem bola garantirem várias soluções ao portador da bola, levando-os, entre outros comportamentos, ao Ajuste. O Ajuste, configura-se para nós como um deslocamento / desmarcação mais curto do atacante sem bola, de forma a que lhe garanta continuar a ser opção ao companheiro com bola. Os autores (Correia, et al., 2014), descrevem “o ajustar como a acção em que um jogador se movimenta e / ou orienta no sentido de se posicionar melhor para ser solução de passe. Desde já fica a noção de que os jogadores deverão estar sistematicamente a analisar tudo o que os envolve para que, desta forma, se possam ajustar o melhor possível. Por isso, ter jogadores permanentemente concentrados é absolutamente fundamental. Durante um jogo de futebol, é possível observar várias situações que dizem respeito à questão do ajustar, sendo que nem sempre o contexto é o melhor para a obtenção de sucesso. Por exemplo, há momentos do jogo em que um mau ajustamento por parte de um médio, o obriga a receber a bola de costas para a baliza do adversário, na ligação do sector defensivo com o intermédio, ficando sob pressão. Outra situação onde o ajustar ganha importância refere-se àqueles momentos em que o bloco defensivo adversário acompanha o movimento de circulação de bola. Nestes casos, alguns jogadores da equipa que se encontra de posse de bola estão “escondidos” por detrás de adversários, não podendo ser solução de passe por não se terem ajustado convenientemente”.

“O que faço é procurar espaços. A toda a hora. Estou sempre à procura. (…) Na actualidade, é quem não tem a bola que tem a missão de procurar espaços, de oferecer opções ao portador da bola, para que a equipa vá progredindo no campo. há tantas opções de passe. Às vezes, até penso para comigo: o não-sei-quem vai ficar aborrecido porque fiz três passes e ainda não lhe dei a bola. É melhor dá-la ao Dani Alves, porque ele já subiu pela ala três vezes. Quando o Messi não está envolvido, é como se ficasse aborrecido… e então o próximo passe é para ele.”

Xavi Hernández, 2010

O ajuste, portanto, o “Garantir permanentes apoios ao portador da bola” deve suceder, mesmo que a decisão posterior do companheiro com bola não seja o passe para o jogador que se movimenta sem bola, isto porque aumentará as possibilidades atacantes da equipa, tornando o seu jogo mais imprevisível. A compreensão disto pelos jogadores é fundamental, mas difícil, pois um jogador que realize consecutivos movimentos de desmarcação, e que por alguma razão não foi alvo de nenhum passe, tem alguma tendência a desvalorizar o que fez e a reduzir esses comportamentos. A bola é naturalmente o centro do jogo e a maior fonte de motivação de quem o joga, contudo, compreender a importância do jogo sem ela, quer nos momentos defensivos quer nos ofensivos, torna-se cada vez mais decisivo.

“As melhores equipas são as que conseguem envolver todos os jogadores neste jogo de apoios, de linhas de passe permanentes (sempre à direita, à esquerda, à frente e atrás do portador da bola). Quanto mais opções o portador da bola tiver, maior imprevisibilidade terá o jogo da sua equipa.”

(Bouças, 2011)

Saber sobre o saber jogar

Pablo Aimar - 1

“Não me senti muito bem, uma vez que não jogava há muitos encontros.”

“Creio que se impusermos o nosso futebol em Lisboa temos condições de passar. Mas temos de ter mais posse de bola, como, aliás, acontece habitualmente em quase todos os jogos.”

Pablo Aimar

http://www.abola.pt/nnh/ver.aspx?id=397783

 

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