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Construção pela primeira linha

“Dar protagonismo aos centrais é acreditar que eles são capazes de fazer algo mais, do que um passe de cinco metros para o craque que vem “buscar jogo”.”

(Bruno Fidalgo, 2016)

Cultura de jogo III. “Atrás não se brinca”.

“Atrás não se brinca”. Um dos tantos lugares comuns que fazem parte da cultura de jogo tradicional. Mas na realidade, brinca-se. Brinca-se por todo o campo, porque o futebol, é antes de tudo o resto… prazer… divertimento. A expressão pode no entanto querer identificar zonas, sectores, funções, nas quais os “riscos” das consequências da perda da bola, podem ser mais elevados. Contudo, à imagem da saída curta do Guarda-Redes, tudo depende do contexto. Das ideias… ou qualidade colectiva, da qualidade individual e dos adversários. Assim, uma vez mais não há uma receita. Existem diferentes decisões, perante diferentes contextos.

Johan Cruyff, no momento mais importante até à data do seu país no Futebol – a final do campeonato do Mundo de 1974 na Alemanha, decidiu, logo após o pontapé de saída da sua equipa, na primeira posse de bola que a sua equipa dispunha, enquanto “último homem” da sua equipa, driblar e penetrar no bloco adversário até à grande-área, acabando por sofrer grande penalidade. O penálti, convertido por Neeskens, viria a garantir o primeiro golo do encontro para a Holanda. Cruyff assim o decidiu dada a sua qualidade individual e a mobilidade que a sua equipa protagonizava, que arrastou as marcações individuais alemãs. Decidiu-o em função do contexto, ignorando os preconceitos vigentes, e influenciado pela sua conhecida irreverência.

Quase 50 anos depois, no mesmo país, Frenkie de Jong, aos 20 anos, provavelmente influenciado pelas mesmas ideias de jogo que ainda pairam no Ajax de Amesterdão, apresenta a mesma cultura de jogo. Sem receio, conduz, fixa, dribla e penetra sistematicamente a primeira linha de pressão adversária. Derruba, novamente, preconceitos enraizados na nossa cultura.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1958054910890433/

Segundo video realizado por ty.

O website (Tactic Zone, 2013), cita Josep Guardiola no tempo de treinador do F. C. de Barcelona, que aconselha:gastem dinheiro com os defesas, sobretudo com os centrais!” e justifica: “pode parecer paradoxal, uma equipa com um futebol ofensivo, de posse, de muitos golos e tem que investir em defesas? Claro, é onde tudo começa. Se defesas (e Guarda-Redes dizemos nós) não conseguem construir, todo este conceito se complica e o jogo já não será o mesmo. Nas minhas ideias o Guarda-Redes e defesas centrais são os primeiros avançados. E um central ter a capacidade de construir não é ter boa capacidade técnica. Tem que ter um grande entendimento do jogo ofensivo e ser muito bom na capacidade de decisão. Por isso, é tão difícil encontrar centrais para este tipo de jogo. Por isso, o Barcelona opta muitas vezes por colocar médios na posição de defesa central”.

O autor (Bouças, 2013), sustenta que “ter jogadores capazes de desequilibrar ofensivamente logo desde trás no primeiro momento da construção será cada vez mais decisivo. Feliz de quem pode contar com defesas centrais para desbloquear situações e adversários.  Em equipas que passem demasiado tempo no momento de organização ofensiva, defesas centrais com tamanha qualidade ofensiva são tão importantes para se chegar ao golo, quanto os avançados. É que o jogo começa demasiadas vezes desde trás, e passa garantidamente, mais vezes nos pés dos centrais que nos de qualquer outro jogador”.

“Johan Cruyff dizia: o mais importante no Futebol é que os melhores jogadores sejam os defesas. Se estás com a bola, consegues jogar; se não, não fazes nada. Johan diz que a bola equilibra uma equipa. Se perde a bola, a equipa se desequilibra; se perde pouco, consegue manter o equilíbrio.”

(Gonzalez, 2012)

Compensação. Um comportamento individual que garante uma qualidade colectiva.

Trazemos hoje um comportamento táctico, que sendo um detalhe para muitos, na realidade a sua importância é tremenda em todos os momentos do jogo, pela forma como procura garantir a sua natureza inquebrantável e colectiva. Como tal escolhemos uma situação em que o comportamento em causa surge em organização ofensiva e defensiva, ilustrando a sua importância no jogar da equipa.

Neste excerto de jogo, primeiro em Organização Ofensiva, Otamendi procura conduzir em construção. Depois de soltar a bola, ficando num espaço mais avançado aos seus companheiros de sector, indica a Touré o espaço a ocupar de forma a garantir a sua compensação e apoio interior a Stones, entretanto em posse. Ainda no momento ofensivo, após mobilidade e trocas posicionais dos jogadores mais avançados, Sané, originalmente Médio-Esquerdo, encontra-se no corredor central. Na perda de bola do City, Sané reage de imediato percebendo logo o espaço a fechar, compensando aqui De Bruyne. Será ele, por estar no espaço certo na relação com o resto da equipa, quem irá recuperar a bola. No momento final e após nova transição, a equipa regressa à sua estrutura inicial, com o corredor central a ser ocupado por Touré, De Bruyne e David Silva.

Para (Gomes, 2015), as compensações ou também conhecidas como permutas “são acções efectuadas pelos defesas para cobrir e ocupar espaços e assumir funções de outros companheiros envolvidos momentaneamente na realização de outras funções”. Para o autor, pretende-se com estas acções:

  • “Assegurar a ocupação racional do terreno de jogo;
  • Conferir segurança defensiva;
  • Assegurar a repartição equilibrada do esforço dos jogadores.”

Se bem que a interpretação anterior, provavelmente a mais comum, relaciona a compensação com o momento defensivo, segundo (Leitão, 2010), a mesma é “uma readequação posicional e/ou de operação, que permita, sob o ponto de vista organizacional, manter o equilíbrio da equipa (seja para estruturar o espaço de jogo, seja para fazer valer uma regra de acção)”. Portanto esta ideia é válida para todos os momentos do jogo.

Por outro lado, compensar significa não só promover uma ocupação racional do espaço de jogo, procurando contribuir para a qualidade de cada um dos momentos de organização, mas também antecipar os momentos seguintes, mantendo a equipa equilibrada ora defensiva, ora ofensivamente. O autor (Maciel, 2011) defende que este é “um aspecto também muito importante, e que passa pela coerência e pelo respeito pela inteireza inquebrantável que o jogar deve manifestar de modo a que se expresse de forma fluída, dinâmica, ou seja que revele ao nível da matriz conceptual articulação de sentido com um determinado sentido”.

Podemos ir mais longe e destacar a compensação como um dos comportamentos que defendem um jogo que é colectivo e que por inerência, tem de ser solidário. Quer a defender, quer a atacar. É também uma consequência de uma maior mobilidade que os jogadores ganharam dentro dos modelos, surgindo assim como um tendência evolutiva. O treinador português (Jesus, 2009), vai ao encontro desta ideia, ao referir que “vai ser esse o grande segredo e evolução do Futebol no futuro, em todo o mundo: Vários jogadores com capacidade para actuarem em várias posições.

“O padrão da estrutura aparente

é p’ro século vinte e dois

a face oculta das interacções não mente

p’ra imaginar o que virá depois.”

(Frade, 2014)

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