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O “Aursnes” de Schrödinger. Defender a atacar.

“(…) a consciência de que a expressão tática assume uma importância capital nos jogos desportivos, fez com que, a identificação de regularidades reveladas pelos jogadores e pelas equipas, no quadro das acções colectivas, tivesse despontado enquanto nova tendência de investigação (Gréhaigne, 1989; Lloret, 1994, citado por Garganta, 2001; Hernandez Mendo, 1996, citado por Garganta, 2001; Garganta, 1997). Neste sentido, a maioria dos analistas procuram detectar e interpretar a permanência e / ou ausência de traços comportamentais na variabilidade de acçoes de jogo (McGarry & Franks, 1996, citados por Garganta, 2001).”

(Gil, 2012)

Após o jogo contra o PSG, os elogios ao Benfica de Roger Schmidt foram alargados, em particular à sua estratégia para o jogo, nomeadamente a escolha de Fredrik Aursnes para a função de Médio-Esquerdo. Porém, muitos de nós temos a noção que se o Benfica perdesse, criticas haveriam surgido, porque teria existido medo dos franceses, porque o jogador não teria características para a função, que lhe faltariam argumentos ofensivos para o papel em causa e como tal não iria apresentar o rendimento necessário à função. No entanto, “jogar no Totobola à segunda-feira” é sempre fácil. O sucesso de Rúben Amorim na aposta em Antonio Adán para o jogo no Santa Clara após a infelicidade do espanhol no jogo em Marselha, e em contraposição a situação de Ricardo Esgaio após o jogo contra os franceses em Lisboa, podem ser outros exemplos.

Para quem está de fora do processo, perceber o impacto real que as decisões da equipa técnica terão no resultado de qualquer jogo será sempre um exercício inatingível, tal como o paradoxo do Gato de Schrödinger. Até o observador “abrir a caixa”, ou seja, até ao apito e resultado final, para o espectador o “gato pode estar vivo e morto”, ou seja, o sucesso de qualquer decisão pode ou não acontecer. Um fenómeno complexo e não determinístico como o Futebol trará sempre essa incerteza. Caso contrário não existiriam casas de apostas, e mais importante, as pessoas não sentiriam a atracção que sentem pelo jogo. Sublinhamos… jogo.

À partida e mesmo à posteriori, várias análises referiram o que eventualmente emergiria como mais evidente. Sendo a função original de Aursnes, Médio-Centro e um jogador com maior foco em princípios de cobertura, equilíbrio e concentração, seria expectável defender que ele viria aportar maior qualidade defensiva à equipa, por exemplo, no fecho dos espaços, na agressividade defensiva, no cumprimento das coberturas e compensações, na protecção ao colega de corredor e aos dois médios-centro. Porém, o próprio, em declarações no final do jogo, acrescentou outra perspectiva ao seu papel no jogo. Que o mesmo teria o objectivo de ter um peso ofensivo fundamental, principalmente pela forma como poderia gerir a bola e dar critério à posse do Benfica. Não só como forma de atacar, mas também de defender.

O pensamento reflecte um princípio fundamental da realidade, e como tal, extensível ao jogo de Futebol. O princípio que Vítor Frade denominou como Inteireza Inquebrantável”. Neste caso a inquebrantável relação do todo – jogo de futebol – traduzida nos seus respectivos momentos e sub-momentos. Tal relação deverá ter por base uma visão complexa do jogo de forma a que este seja pensado com uma articulação de sentido, como o próprio Frade e também Jorge Castelo sustentam. Para (Jorge Castelo, 1996) “deriva da concordância organizativa entre o método ofensivo e defensivo e aplicado pela própria equipa. Com efeito, é necessário que os pressupostos fundamentais de um dos métodos não ponha em risco de forma irredutível a aplicação dos pressupostos de eficácia do outro. Neste sentido, a equipa deverá jogar num bloco homogéneo e compacto não só na aplicação isolada de cada um dos métodos pré-estabelecidos, mas também na transição de um para o outro método por forma que não haja quebra na continuidade do processo ofensivo ou defensivo”. Na mesma linha de pensamento surge (Julian Tobar, 2013) sustentando que a articulação de sentido torna-se “um imperativo para o sucesso de uma equipa, visto que se perdermos de vista o “todo” (leia-se o jogar) que se pretende, desarticulando uma “parte” das demais, certamente isso refletir-se-á no jogar da equipa. Portanto o treinador ao modelar o seu jogar deverá ter em conta justamente isso, a interligação e a congruência de tudo para o “todo””. Ainda Tobar, estabelecendo uma comparação e citando “Conde (2010), seria possível dizer que a organização defensiva, a organização ofensiva e as transições são como as rodas de um carro: devem rodar simultaneamente”.

Deste modo, perante uma equipa com jogadores incríveis com bola, retirar-lhes a mesma, seria potencialmente de facto uma boa estratégia para os defender. Para mais quando muitas vezes essa equipa defende com apenas GR+8 e até GR+7 atrás da linha da bola, com uma última linha de 5 jogadores dificultando a pressão e recuperação da bola à segunda linha de apenas 2 médios e ainda quando os que ficam à frente da linha da bola têm pouca disponibilidade para o momento defensivo, nem mesmo para o fecho das coberturas ofensivas do adversário, o que consequentemente permitirá que este circule a bola por trás conseguindo assim tirar com alguma facilidade a bola de zonas de pressão. Juntando-se a não imperativa necessidade do Benfica em vencer o jogo e podendo assim dar maior critério à sua posse no sentido de a manter, arriscando menos a progressão e nos sub-momentos de criação, a escolha de Aursnes, foi deste ponto de vista, uma ideia de facto interessante.

Importará dizer que nem a equipa técnica conseguirá pré-determinar se o “gato está vivo ou morto no interior da caixa”, ou seja, se a opção tomada irá ou não resultar até o jogo de facto se consumar. No entanto, tendo em conta o seu conhecimento e experiência, nomeadamente a específica relativa à equipa, aos jogadores, às suas características, à sua mentalidade, ao seu momento, à forma como treinam, como estarão as suas vidas pessoais, etc., será com certeza a mesma, quem estará mais perto de se aproximar da predição do resultado da “experiência”. Contando que, surgirão sempre imponderáveis, e irão errar e tomar opções que não irão resultar. Pois recordamos que… estamos perante um acontecimento não determinístico.

Finalizando, o interessante para nós não foi se o “gato viveu ou morreu”, mas sim a lógica da intencionalidade de Roger Schmidt e o que de facto Aursnes provocou ao jogo do Benfica, e em contraposição ao jogo do PSG. Claro que se o jogo se voltasse a repetir, as condições iniciais seriam irrepetíveis e o resultado (do desempenho) individual de Aursnes e colectivo, poderiam ser drásticamente diferentes. Mas interessando-nos encontrar lógicas, e se possível padrões, podemos então ganhar experiência para problemas similares no futuro, tendo sempre a consciência, como sublinhado, que nada se repetirá integralmente. Tendo por base esta consciência, por outro lado encontrar padrões e reforçar a sua bagagem ao nível do Conhecimento do Jogo deverá ser o papel do treinador e dos que queiram analisar o jogo e o desempenho das equipas de forma séria e honesta.

“No nosso entendimento, o jogo de Futebol é fluído na passagem do processo ofensivo para o defensivo e vice-versa, requisitando uma organização de jogo unitária, articulada em função do «todo» que se deseja, pelo que se possa afirmar que “… não há nada mais construído que o jogar. O jogar não é um fenómeno natural, mas construído” (Frade, 2002, in Amieiro, 2004:115). Para uma análise do jogo sem que lhe seja destruída a sua organização dinâmica indissociável, consideramos necessário que se entenda que apesar de serem antagónicos, processo ofensivo e defensivo estão em íntima relação, já que, tal como a luz e a sombra, o preto e o branco, também esses dois processos só podem ser conhecidos um em função do outro (Teodorescu, 1984; Bayer, 1994; Queiroz, 1986; Castelo, 1994; Garganta, 1996).”

(José Laranjeira, 2009)

Exercício 138 [Subscrição Anual]

Publicamos o exercício 138, denominado como Meinho em duplas com baliza e Guarda-Redes. Este exercício encontra-se no nosso arquivo e estará disponível para subscritores.

A identificação meinho, pode sugerir que estamos na presença de um exercício de dimensão mais lúdica, ou de um exercício de complexidade reduzida, no qual no momento da recuperação da bola, o mesmo é interrompido para que os jogadores troquem de função. Não é o caso. Utilizamos a palavra meinho como forma mais fácil e prática de explicar a generalidade do exercício. No fundo trata-se de um exercício de posse de bola que se inicia e se joga em condições muito específicas e que traz características interessantes, não só do jogo, como também do ponto de vista da especificidade de uma determinada ideia de jogo. Aqui destacamos também a oportunidade para uma possível adaptação às novas regras do Pontapé de Baliza.

Dada a sua estrutura mais micro, quer em número, quer em espaço, será apropriado como um exercício introdutório ou complementar durante a Sessão de Treino. Dada a continuidade do jogo, garante ainda a Articulação de Sentido do ponto de vista dos momentos do jogo, pois para quem ataca vivencia, pelo menos, Organização Ofensiva e Transição Defensiva, e quem defende, pelo menos, Organização Defensiva e Transição Ofensiva.

Neste domínio, o exercício também apresenta no seu contra-exercício um estímulo de qualidade, ou seja, para a equipa que se encontra em oposição aos objectivos prioritários, nomeadamente no seu momento de recuperação da bola e consequente decisão sobre o Contra-ataque ou a Valorização da posse de bola. Desta forma, do ponto de vista do planeamento, o exercício poderá então, também servir esses propósitos opostos.

Exercício 138 | Meinho em duplas com baliza e Guarda-Redes

Valorização da posse de bola

“(…) é importante para uma equipa SENSÍVEL ter outras formas de criar e explorar espaços. Temporizar a bola e ter a sua posse nas zonas mais recuadas pode ser um meio muito mais fácil de conseguir aquilo que pretende. Trata-se, em suma, de conseguir conter os seus desejos imediatos para os conseguir satisfazer em momentos mais adequados.”
(Marisa Gomes, 2010)

Três ideias (exercícios) para desenvolver a circulação de bola em largura [Subscrição Anual]

Voltamos a publicar ideias, sob forma de exercícios de treino, que têm por objectivo o desenvolvimento do momento de organização ofensiva do jogo. Desta vez, em alternância à profundidade, estaremos à procura de desenvolver a largura no jogo da equipa. Não só ao nível posicional, mas neste caso concreto, pela circulação da bola entre dois ou os três corredores de jogo.

Como temos vindo a referir, a posse e circulação da bola, salvo raras excepções, não pode ser um fim em si mesmo. É no fundo um meio para atingir outros objectivos, quer ofensivos, quer mesmo defensivos. É fundamentalmente por essa razão que Guardiola declarou “odiar o tiki-taka”. É também por essa razão que (Luís Castro, 2017), também afirmou que “a posse de bola não é um objectivo, é uma consequência… do meu jogo”. Do ponto de vista ofensivo, (Pedro Bouças, 2017) dá um exemplo, explicando que “fazer desmoronar um adversário de qualidade tem também muito a ver com o tempo que o fazes correr”, sendo que para tal, é mais fácil consegui-lo pela circulação à largura do que na profundidade. Na sequência do mesmo exemplo, (Azevedo, 2011), explica: imagine-se que um treinador quer implementar na sua equipa a posse e circulação de bola como um comportamento/princípio no momento de organização ofensiva. Ele pretende que essa circulação de bola seja feita em toda a largura do campo, jogando de uma forma apoiada com passe curto e seguro, à procura de espaços para desorganizar a equipa adversária”. Mas o autor vai mais longe e explica que a partir de uma ideia, o jogo da equipa e as características dos jogadores devem permitir que a ideia inicial, ou seja, o Princípio, seja aberto a eventuais novas formas de o atingir. Na mesma linha de pensamento surge a treinadora (Gomes, 2011), sustentando que “com Organizações (entenda-se princípios) diferentes temos equipas diferentes. Contudo, todos percebemos que as características dos jogadores são decisivas na configuração dos princípios de jogo. Não nos princípios mas no modo como esses princípios se desenvolvem e expressam“.

Também o autor (Maciel, 2011) defende que a um nível mais micro, o qual denomina de SubSubPrincípios, surgem “aspectos mais micro, aspectos de pormenor à priori desconhecidos, uma vez que surgem pela dinâmica do processo e emergem sobredeterminados pelos níveis de maior complexidade, ainda que sem perda de identidade ou singularidade. Por serem desconhecidos à priori eu não os posso, nem devo estabelecer previamente, são particularidades que vão surgindo e que eu tenho de saber aproveitar para alimentar e exponenciar o crescimento do meu jogar, que não perdendo as formas do esboço inicial, vai assumindo uma configuração ao nível do pormenor que é única. Tem de haver muita sensibilidade e receptividade da parte do treinador, no sentido de aproveitar estas emergências de pormenor. Quando refiro receptividade quero dizer abertura, pois só isso permite que eu aproveite e tenha disposição, para partindo das minhas ideias rentabilizar e explorar os acrescentos que o envolvimento me trás a tais ideias“.

Deste modo, a criatividade tem aqui um papel preponderante. Quando o jogador, ou a equipa encontra uma nova solução para resolver o problema, que o treinador não antevia quando definiu o Princípio. Regressando ao exemplo, Azevedo descreve que o treinador transmite a ideia, vai trabalhando e percebe que há um jogador que apresenta uma boa leitura/visão de jogo aliada a uma qualidade e precisão no passe longo. Então, o treinador pode aproveitar essa característica porque através dessa precisão no passe longo, o jogo tornar-se-á mais rápido. Por isso, através da alternância entre passe curto e passe longo, a velocidade da circulação de bola pode ser muito maior. Poderá aproveitar toda a largura do terreno e criar maiores desequilíbrios na estrutura defensiva do adversário”.

Mas (Maciel, 2011) ressalva que ““importa referir que essas emergências de pormenor não são só aspectos a exponenciar, não raras vezes constituem-se como aspectos a recusar, e eu tenho que ter sensibilidade para perceber que em determinados contextos e situações os princípios têm de ser fins. Como tal poderei ter necessidade de fechar, mas só o devo fazer a partir do que depreendo do processo e dos contornos que este vai assumindo no aqui e agora e não à partida. Se o fizer à partida, corro o perigo de cair na vertigem de treinar sobre carris. Parto do pressuposto que os jogadores me podem dar tudo, em termos de detalhe, o que entendo ser necessário para jogar o meu jogar com qualidade, se verifico que há coisas que tenho de ser eu a regular externamente porque eles não o fazem ou ainda não fazem, ok, aí o princípio (subsub) passa a ser fim, mesmo que possa não ser de forma permanente mas temporária e transitória. Cruyff diz que a melhor forma de ensinar não é proibindo, mas sim guiando, eu concordo totalmente mas acrescento que por vezes para guiar se torna necessário proibir. Mas a regulação do trânsito, que é a funcionalidade da equipa vai se fazendo, sabemos o sentido a dar ao caminho e vamos colocando sinalização conforme para que o caminho permita uma boa fluidez, por vezes colocamos sinais proibidos generalistas, outros só a peões, outros só para bicicletas, outros para pesados… e quando percebemos que o trânsito está a ficar regulado à nossa imagem podemos tirar sinalização, porque pelo hábito já se tornou funcional“.

“Adoro a regra
que calibra a emoção,
apaixona-me a emoção que não se nega
a levar a regra à correcção.”
(Frade, 2014)

Os três exercícios apresentam uma lógica progressiva, nomeadamente na sua dimensão estrutural:

Exercício 130 | Circulação de bola aos dois corredores laterais sem oposição (exercício grupal)

Exercício 128 | Pontuar em variação de corredor (exercício grupal ou intersectorial)

Exercício 129 | Jogo colectivo em variação da metade vertical do campo (exercício intersectorial ou colectivo)

O “espectáculo” e o jogar bem. Novamente o trinómio Estética-Eficácia-Eficiência.

“O Desporto enquanto fenómeno cultural” é o título do segundo capítulo da introdução do projecto Saber Sobre o Saber Treinar. Não é uma opinião é um facto. Idealizado e produzido por homens, o desporto manifesta de forma clara as tendências culturais da sociedade na qual se enquadra. O autor (Neto, 2014) descreve que “na dinâmica do jogo de futebol encontramos uma magia inigualável. Na sua prática é possível condensar várias histórias e reproduzir muitas graças e desgraças da vida. Daí um dos seus principais encantos, uma magnífica construção cultural, uma obra de arte cuja magnitude social ainda não foi entendida por muitos pseudo intelectuais”. Deste modo, a emocionalidade com que é vivido é também fruto do contexto cultural onde se insere. Ao explicar que “o futebol, o jogo e o treino expressam de forma muito clara o modo como o sentimos e consequentemente, como nos enquadramos no que acontece”, (Frade, 2014), confirma precisamente esta ideia.

O treinador Juan Manuel Lillo, citado por (Cabral, 2016) sustenta que “o problema não é só do futebol, mas de uma sociedade em constante mudança, fruto de uma evolução tecnológica que promoveu o imediatismo como norma. A essência pela qual as coisas se faziam perdeu-se. No meu tempo tinha de passar por muitíssimo para ter dinheiro para comprar uma caderneta de futebol. Hoje, compram-se os cromos todos da caderneta de uma vez só, para despachar. Queremos tudo para ontem, sem percorrer o trajecto. A sociedade actual criou outro tipo de homem, e creio que somos actualmente mais filhos da sociedade do que dos nossos pais”. A cultura do instantâneo apoderou-se das nossas decisões e emoções, promove-se a impaciência, mesmo quando o caminho para resolver um problema, está fechado, ou não é evidente. Ir contra o “muro” é preferível do que parar, pensar e procurar outra solução. Castra-se a inteligência e o critério, aplaude-se a emocionalidade e irracionalidade enquanto espectáculo. O Xadrês perde entusiastas, ao contrário dos Shoot ’em up” das consolas que atraem massas. O Barcelona de Guardiola era aborrecido, a Premier League nesse mesmo tempo, em geral, entusiasmante.

Escrevíamos noutro artigo que não só o espectador comum, mas também “muitos treinadores, associam o “jogar bem” como uma preferência por um determinado estilo de jogo, portanto remetendo o jogo para a sua dimensão estética. Da mesma forma que este pensamento separa eficiência de eficácia, a estética surge assim também isolada, como algo que se pode optar por ter ou não, de forma a agradar os espectadores e tornar o jogo um bom ou mau espectáculo. Esta interpretação do jogo como arte, torna-se então subjectiva e relativa à individualidade, cultura e preferência pessoal de cada indivíduo que observa o fenómeno. Nesta perspectiva, o “jogar bem” não é discutível. Torna-se uma preferência pessoal, como alguém que prefere uma pintura impressionista ao invés de outra expressionista. Não é esta a nossa abordagem ao jogo, portanto para nós jogar bem tem um significado muito mais objectivo: o jogo de qualidade, sendo esta qualidade a que aproxime a equipa dos objectivos do jogo: marcar golo e não sofrer. Portanto, remete-nos para a eficiência. Se depois essa qualidade agrada o espectador, será então uma consequência”.

Assim, um jogo que agrade, estéticamente, a todos os espectadores, é uma utopia. Um jogo que agrade à maioria torna-se cada vez mais difícil, tendo em conta a cultura que vivemos. Isto se desejamos paralelamente à estética… eficiência e eficácia, tendo naturalmente em conta as regras e características do jogo de Futebol. Caso contrário, a nossa equipa cai por falta de rendimento. O Futebol está então perante uma potencial “crise existencial”.

A situação é clara. Equipa em vantagem, perde a bola, recupera, sai da pressão, não identifica condições para contra-atacar porque há pouco espaço para muitos adversários, decide então valorizar a posse de bola e tão bem o faz que provoca o adversário e leva-o á falta e ao cartão amarelo. A decisão não agradou ao público pois desejava uma decisão mais vertical e que a equipa procurasse a baliza adversária.

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Depois, a equipa em construção, variação longa de corredor lateral, “os adeptos pedem que a equipa carrege… acelere”, o jogador cede à pressão vinda das bancadas, procura o ataque rápido em situação de inferioridade numérica e acaba por perder a bola.

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A bola chega novamente ao corredor lateral. Os adeptos exigem pressa e velocidade a atacar. A equipa, ao contrário, lê que a situação no corredor lateral não é favorável, temporiza, procura solução no corredor central, descobre espaço entre-linhas e solução de finalização.

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Finalmente, antes das três situações anteriores, a construção que permitiu a vantagem no resultado.Circulação curta e apoiada… corredor central… fechado. Circulação curta e apoiada… corredor esquerdo… fechado. Circulação curta e apoiada… corredor direito… fechado. Circulação curta e apoiada… espaço entre-linhas no corredor central, apoio frontal, passe vertical, recepção orientada, novo apoio frontal, fixa, temporiza e espera a superioridade numérica, último passe e… sucesso.

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A estética que envolveu este golo pode ser discutível. Afirmar que alguém tem que ser mais feliz assistindo a isto do que a um pontapé longo do Defesa-Central na profundidade, que é ganho pelo Avançado em velocidade aos adversários que não controlaram bem a sua profundidade… não é uma atitude democrática. Mas não compreender que a eficiência resultante do jogar manifestado nesta situação conduz muitas vezes à eficácia… também não é uma atitude racional. E por fim… como consequência, esta eficiência-eficácia gera “sentimento comum”, gera “sorrisos”, gera um… “namoro”. Produz-se cultura. Produz-se uma estética… apreciada.

“A proximidade

entre cada um

possibilitanto equidade

gera sentimento comum,

permitindo

apoios fáceis, curtos e viáveis

e sorrindo…

Se bem treinados

deles ficam enamorados

sentindo-os facilmente realizáveis.”

(Frade, 2014)

A “carne toda no assador”

A frase do genial Quinito, recentemente também usada por Carlos Carvalhal na Premier League, tornou-se uma das marcas do Futebol Português. Apesar de no sentido lato percebermos o seu contexto, se pensarmos na interpretação e conhecimento do jogo de cada um, no sentido restrito a mesma pode conhecer diferentes expressões. Muito provavelmente, a que mais se generalizou, foi a substituição, de jogadores de outras funções por “avançados”. Outra ideia, directamente associada a esta, é a mudança, na forma de jogar da equipa, de um jogo paciente, criterioso e curto, para um mais vertical, aleatório e directo. Sublinhamos a palavra aleatório, uma vez que um jogo mais vertical e directo, quando treinado, quando crença, e em determinados cenários, também pode ser bem sucedido. A questão aqui residirá… que ideias poderão ter maior probabilidade de sucesso perante o jogo que o futebol é, consequência daquilo que o ser humano também é, nomeadamente em “sociedade”.

Apesar de não encontrarmos notícias sobre razões, que não táctico-estratégicas, para a substituição de Emil Forsberg por Martin Olsson na selecção Sueca no jogo dos quartos de final do Campeonato do Mundo contra a Inglaterra, não conhecendo com exactidão o contexto e não possuindo a real justificação para a substituição, correremos sempre o risco, de errarmos logo à partida na interpretação da decisão. No entanto, para nós o interessante não é a análise desta decisão concreta, mas o que ela pode significar numa perspectiva mais ampla. Precisamente, essa ideia que se generalizou no jogo, que perante um resultado adverso e dificuldades nos sub-momentos ofensivos de Construção e Criação, trocar o tal critério, paciência e criatividade, por aleatoriedade, inquietação, pressa e um jogo desprovido de imaginação, seria a eterna principal solução nesse cenário. Mas mais do que aquilo que a substituição em causa significava, mais importante no fundo foi a forma como influenciou o jogar da Suécia, que defrontava um adversário que manifestava conforto na sua última linha durante o momento defensivo, quer pelo número de jogadores que na situação colocava, como pela significativa qualidade dos seus comportamentos.

Todas as acções ofensivas de Emil Forsberg no Suécia x Inglaterra do Campeonato do Mundo de 2018.

Todas as acções ofensivas de Martin Olsson no Suécia x Inglaterra do Campeonato do Mundo de 2018.

O número de perdas de bola de Olsson foi muito superior ao de Forsberg, ainda por cima tendo em conta que o último esteve mais tempo em jogo e envolvido em bastantes mais acções com bola. Mas se este pode não ser um dado relevante ao nível individual, uma vez que se torna fundamental compreender o contexto de cada acção e as suas relações com os companheiros e adversários nesses momentos. Um problema tradicional das análises quantitativas. Porém, a quantidade de perdas tem, habitualmente, reflexos mentais e fisiológicos negativos… no todo, que é o desempenho – a qualidade do jogo da equipa e consequentemente do jogador. Aqui nem se trata do bater de asas da borboleta, mas de acontecimentos mais significativos que perturbam os momentos seguintes do jogar da equipa.

Transportar a equipa para um maior caos… será eficaz e a resposta na maioria das situações? No fundo estaremos a trocar a racionalidade pela emocionalidade… a zona de conforto, o trabalho e o entrosamento… por potencial desconforto, improvisação e desorganização.

Porém… “a carne toda no assador”, à imagem da nossa perspectiva do conceito intensidade, pode não passar por fazer mais, de forma mais agressiva, mais directa, se isso significar… fazer pior tendo em conta o jogar da equipa. Deste modo, no contexto de uma cultura que privilegie o critério, “a carne toda no assador” poderá significar, por exemplo, garantir maior velocidade à circulação de bola, maior número de jogadores no interior do bloco adversário, combinações a menos toques e consequentemente mais rápidas, mais soluções de ruptura, decisões de último passe de maior risco de perda da bola e decisões de finalização em condições mais difíceis, excluindo destas as que se incluem nas más decisões. Do ponto de vista individual, poderá não significar a troca de um jogador de uma função por outro de outra, mas sim a aposta em jogadores de maior criatividade, de cariz mais desequilibrador, mas que em contrapartida também fazem crescer o risco de maior acumulação de perdas de bola. Foi, por exemplo, o caso da entrada de Ricardo Quaresma no jogo Portugal x Uruguai.

Se perguntássemos a Quinito o sentido que dava à sua expressão… Quinito o homem que se tivesse dinheiro comprava Pedro Barbosa para o ver a jogar no seu quintal e que se declarava “um amante da arte, da magia e beleza estética”, apostamos que responderia… “é colocar lá dentro os mais talentosos, ofensivos e criativos”.

“É de estética vazia

e o Futebol assim jaz…

Jogo directo nada cria

correm, correm, mas nenhum sabe o que faz.”

(Frade, 2014)

“O risco é não arriscar”

 

“Há um género de pessoas que, em dívida para com uma tradição que os ensinou a respeitar certas leis caducas, não conseguiram nunca perceber, não obstante as lições catalãs e bávaras dos últimos anos, as verdadeiras vantagens que há em procurar sair a jogar desde trás. As mesmas pessoas podem até acreditar que sair a jogar compensa de facto o risco quando os defesas conseguem suplantar a primeira zona de pressão adversária, e podem até reconhecer que a equipa que a isso se propõe acaba por beneficiar desse risco depois de superar esse obstáculo inicial. Não obstante, parece-lhes sempre demasiado arriscado. Na opinião dessas pessoas, o risco de sair a jogar sob pressão é sempre mais elevado do que os eventuais benefícios disso, pelo que, em tais casos, é sempre mais prudente aliviar a bola do que insistir em circulá-la até que estejam criadas as condições para ligar o jogo. Aquilo que não percebem é que os benefícios de sair a jogar não se esgotam na possibilidade de ligar o jogo, de manter a posse de bola ou de preparar um ataque. Sair a jogar é também a maneira mais segura de uma equipa se precaver contra a incerteza das segundas bolas. (…) Aliviar quando se está a ser pressionado parece uma decisão sensata, na medida em que se evita o risco inerente à circulação numa zona defensiva. Mas, na verdade, aliviar envolve sempre a insensatez de deixar o destino do lance entregue ao acaso.”

Nuno Amado, 2016

 

“O maior risco é não arriscar.”

Mark Zuckerberg

Exercício gratuito

Publicamos um novo exercício gratuito: “Posse por zonas“.

O exercício surgiu num caderno de exercícios que José Mourinho terá colocado à disposição do Chelsea F. C. na sua primeira passagem pelo clube.

Na articulação de sentido entre momentos e princípios de jogo, dados os objectivos e características do exercício, o foco deverá estar no momento de transição ofensiva, respectivo sub-momento “Reacção ao ganho da bola”, mas principalmente no momento de organização ofensiva e respectivo sub-momento “Construção”, mas especificamente, na “Posse e circulação de bola”.

Será um trabalho que comportará algum risco de descontextualização pela ausência de alvos, portanto deverá surgir numa fase inicial da sessão de treino e deverá ser seguido de progressão de forma a enquadrar a Posse e os princípios aí treinados numa organização estrutural e noutras fases de construção que tragam o direcionamento do ataque e a procura da baliza adversária. O exercício apresenta-se muito propenso a progressões e adaptações, em função das necessidades de cada equipa.

Do exercício emerge uma necessidade dos atacantes sem bola garantirem várias soluções ao portador da bola, levando-os, entre outros comportamentos, ao Ajuste. O Ajuste, configura-se para nós como um deslocamento / desmarcação mais curto do atacante sem bola, de forma a que lhe garanta continuar a ser opção ao companheiro com bola. Os autores (Correia, et al., 2014), descrevem “o ajustar como a acção em que um jogador se movimenta e / ou orienta no sentido de se posicionar melhor para ser solução de passe. Desde já fica a noção de que os jogadores deverão estar sistematicamente a analisar tudo o que os envolve para que, desta forma, se possam ajustar o melhor possível. Por isso, ter jogadores permanentemente concentrados é absolutamente fundamental. Durante um jogo de futebol, é possível observar várias situações que dizem respeito à questão do ajustar, sendo que nem sempre o contexto é o melhor para a obtenção de sucesso. Por exemplo, há momentos do jogo em que um mau ajustamento por parte de um médio, o obriga a receber a bola de costas para a baliza do adversário, na ligação do sector defensivo com o intermédio, ficando sob pressão. Outra situação onde o ajustar ganha importância refere-se àqueles momentos em que o bloco defensivo adversário acompanha o movimento de circulação de bola. Nestes casos, alguns jogadores da equipa que se encontra de posse de bola estão “escondidos” por detrás de adversários, não podendo ser solução de passe por não se terem ajustado convenientemente”.

“O que faço é procurar espaços. A toda a hora. Estou sempre à procura. (…) Na actualidade, é quem não tem a bola que tem a missão de procurar espaços, de oferecer opções ao portador da bola, para que a equipa vá progredindo no campo. há tantas opções de passe. Às vezes, até penso para comigo: o não-sei-quem vai ficar aborrecido porque fiz três passes e ainda não lhe dei a bola. É melhor dá-la ao Dani Alves, porque ele já subiu pela ala três vezes. Quando o Messi não está envolvido, é como se ficasse aborrecido… e então o próximo passe é para ele.”

Xavi Hernández, 2010

O ajuste, portanto, o “Garantir permanentes apoios ao portador da bola” deve suceder, mesmo que a decisão posterior do companheiro com bola não seja o passe para o jogador que se movimenta sem bola, isto porque aumentará as possibilidades atacantes da equipa, tornando o seu jogo mais imprevisível. A compreensão disto pelos jogadores é fundamental, mas difícil, pois um jogador que realize consecutivos movimentos de desmarcação, e que por alguma razão não foi alvo de nenhum passe, tem alguma tendência a desvalorizar o que fez e a reduzir esses comportamentos. A bola é naturalmente o centro do jogo e a maior fonte de motivação de quem o joga, contudo, compreender a importância do jogo sem ela, quer nos momentos defensivos quer nos ofensivos, torna-se cada vez mais decisivo.

“As melhores equipas são as que conseguem envolver todos os jogadores neste jogo de apoios, de linhas de passe permanentes (sempre à direita, à esquerda, à frente e atrás do portador da bola). Quanto mais opções o portador da bola tiver, maior imprevisibilidade terá o jogo da sua equipa.”

(Bouças, 2011)

Exercício gratuito

Publicamos mais um exercício gratuito: Saída de jogo do Guarda-Redes em “quem perde sai”

Desta vez trazemos um exercício cujo objectivo principal é o sub-momento de construção do momento ofensivo do jogo, especificamente a Saída de jogo do Guarda-Redes, a Construção pela primeira linha e a penetração da primeira linha de pressão adversária. Contudo, tem também uma preocupação com a articulação de sentido para o momento da Transição Defensiva e defesa da baliza após a perda da bola. O exercício aproxima-se de uma fase de consolidação, uma vez que tem um carácter competitivo muito acentuado, o que pode desfocalizar a aquisição destes comportamentos numa primeira fase de trabalho.

O exercício garante propensão aos comportamentos identificados, porém não condiciona para uma forma de jogar específica e sua consequente estrutura. É assim aberto ao modelo idealizado por cada treinador, permitindo diferentes formas de saída do Guarda-Redes, através de passe curto e médio, garantindo também espaço para diferentes ideias para ultrapassar a primeira linha de pressão e nesse seguimento chegar ao interior do bloco adversário, neste caso, a finalização nas balizas sobre o meio-campo. Por outro lado, no contra-exercício, a equipa que inicia o exercício a defender, pode, por sua iniciativa ou por determinação estratégica do treinador, posicionar-se num bloco médio junto ao meio-campo ou num bloco mais alto procurando desde logo condicionar o primeiro passe do Guarda-Redes. Desta forma, o exercício pode ser invertido nos seus objectivos, caso a preocupação seja o momento defensivo do jogo e o condicionamento da construção adversária, caso a mesma seja curta.

De acordo com (Manna, 2009), “sair jogando é dar prioridade ao passe desde o início da construção de jogo. O pontapé de baliza ou a participação dos defesas na construção ofensiva torna-se fundamental. Uma perda de bola na zona dos defesas centrais pode ser terrível. Todos evitam realizar o que Pep dá prioridade. Riscos que permitem, facilitar o ciclo de jogo, no qual Pep irá sempre tentar construir desde a sua baliza”. Guardiola sublinha que saindo a jogar bem, podemos chegar ao alvo jogando bem, ao contrário de um mau início de construção que torna tudo mais difícil e aleatório. E lembra que se o primeiro passe é bom, tudo é mais fácil a seguir.

“É de estética vazia

e o Futebol assim jaz…

Jogo directo nada cria

correm, correm, mas nenhum sabe o que faz.”

(Frade, 2014)

Francisco Silveira Ramos

Para os menos conhecedores do futebol português e da evolução metodológica vivenciada, o professor Francisco Silveira Ramos é sem dúvida uma figura incontornável do jogo. Durante os anos 90 e princípio do século XXI, momento em que o treino era determinado pela dimensão física, no qual quem pensava “fora da caixa” era hostilizado pelo pensamento vigente, Silveira Ramos foi um dos poucos, que com coragem, assumiu que a preocupação central do treino deveria ser o cérebro e a decisão táctica. Defendendo a “integração dos factores do rendimento”, a sua visão diferia de forma abissal do “treino integrado” muito típico no Futebol Espanhol, mas também com expressões no Futebol Português. Como sustentámos no tema de Saber Sobre o Saber Treinar, “O treino integrado e sintético” tinha na mesma como preocupação central a dimensão física, porém aqui camuflada por exercícios com bola e acções do jogo. Silveira Ramos não só anteviu outro rumo que hoje se concretiza, como formou muitos técnicos em cursos de treinadores e licenciaturas, e ainda ajudou a crescer, nas selecções jovens portuguesas alguns dos maiores talentos do futebol português. Finalmente, revelou ainda grandes preocupações com o Futebol de Formação e o desaparecimento do Futebol de Rua.

Assumimos que o professor Francisco Silveira Ramos foi decisivo na forma como hoje vemos o jogo e o treino e dos que mais nos inspiraram a criar este espaço. Apesar do facto passar despercebido à maioria da comunicação social, Portugal pode-se orgulhar em contar com alguns dos maiores pensadores deste jogo, que contribuíram para a tal ruptura de conhecimento que já descrevemos. E sem dúvida que Silveira Ramos é um deles. Deixamos várias ideias do professor num recente programa televisivo, que dado o conhecimento dos intervenientes e das ideias abordadas, fugiu à norma do panorama televisivo português.

O Treinador Português:

A dimensão estratégica:

O treinador de “formação”:

O jogo mecânico e a música:

A crescente riqueza comportamental de cada função e a repercursão na dimensão física:

A era das dinâmicas:

Jogo curto e apoiado:

Criatividade defensiva:

Individualização do treino:

“Cabe-nos encontrar as metodologias que permitam que o processo de treino se adapte a essa realidade, adaptando os praticantes às exigências da competição.

Francisco Silveira Ramos, 2003

Coragem… Específica II

Deixámos propositadamente o som dos comentários. Jornalistas, adeptos, pais, dirigentes, na sua grande maioria transmitem uma enorme falta de coragem na forma como sentem e pensam o jogo. Isto obviamente tem consequências em quem o treina e em quem o joga, porque o “nadar contra a maré” não é fácil. Neste contexto, devemos aplaudir uma equipa de escalão inferior, que a jogar no campo do campeão nacional e líder da primeira liga, a perder 3-0, procura a qualidade no seu jogo.

Há pouco tempo, num artigo publicado no Lateral Esquerdo, Nuno Amado ia na mesma direcção: “há um género de pessoas que, em dívida para com uma tradição que os ensinou a respeitar certas leis caducas, não conseguiram nunca perceber, não obstante as lições catalãs e bávaras dos últimos anos, as verdadeiras vantagens que há em procurar sair a jogar desde trás. As mesmas pessoas podem até acreditar que sair a jogar compensa de facto o risco quando os defesas conseguem suplantar a primeira zona de pressão adversária, e podem até reconhecer que a equipa que a isso se propõe acaba por beneficiar desse risco depois de superar esse obstáculo inicial. Não obstante, parece-lhes sempre demasiado arriscado.”

De acordo com (Manna, 2009), “sair jogando é dar prioridade ao passe desde o início da construção de jogo. O pontapé de baliza ou a participação dos defesas na construção ofensiva torna-se fundamental. Uma perda de bola na zona dos defesas centrais pode ser terrível. Todos evitam realizar o que Pep dá prioridade. Riscos que permitem, facilitar o ciclo de jogo, no qual Pep irá sempre tentar construir desde a sua baliza”. Guardiola sublinha que saindo a jogar bem, podemos chegar ao alvo jogando bem, ao contrário de um mau início de construção que torna tudo mais difícil e aleatório. E lembra que se o primeiro passe é bom, tudo é mais fácil a seguir.

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