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“Romário só tinha uma tarefa defensiva”

O erro de Tsimikas e o conhecimento do jogo e liderança de Virgil van Dijk

A situação de Criação surge por duas tentativas sucessivas de intercepção falhadas pelos médios do Liverpool. Pelo menos Endo, dado o insucesso do companheiro, deveria ter garantido contenção e protegido o espaço à frente dos Defesas-Centrais. Não foi a sua decisão e abriu oportunidade para que o adversário, através de um passe vertical, ficasse em situação de ataque rápido, e Criação, perante a última linha do Liverpool. Mas não é sobre essa situação que nos desejamos focar. É para o posterior erro de Tsimikas e a liderança de van Dijk.

Perante a condução do jogador Crystal Palace a última linha do Liverpool, bem, contém, baixa e mantém-se alinhada. Podia no entanto baixar e retirar profundidade mais rapidamente para minimizar o espaço entre si o seu Guarda-Redes. Por outro lado, Quansah, o 78 do Liverpool, deveria ter deixado a contenção ao portador para van Dijk, pois era este que se posicionava no corredor central e assim ficaria com cobertura à sua direita e esquerda.

Mas o maior erro é de Tsimikas. Bem num primeiro momento, porque perante o espaço ainda existente na profundidade acompanha Odsonne, de forma a controlar a desmarcação de ruptura do jogador do Palace, até porque é um movimento pelo lado cego de van Dijk. Contudo, uma vez que o último passe não saiu, até porque a contenção foi eficaz, o grego deveria ter quebrado essa acção mais cedo e regressado rapidamente ao alinhamento com van Dijk, que era nesta situação, a referência para tal.

Tsimikas não só não o fez como tardou a perceber o que tinha que fazer, permitindo uma situação de eventual progressão, finalização, último passe ou cruzamento a Jordan Ayew e obrigando a última linha a posicionar-se já no interior da grande-área, o que possibilitou uma maior aproximação do adversário à sua baliza.

De elogiar Virgil van Dijk, pela sua interpretação e liderança na situação, que por duas vezes solicita a Tsimikas que passe para a sua frente e garanta contenção a Ayew. Podemos ir mais longe falar em liderança Específica. Porque estamos perante uma liderança táctica. E não uma qualquer. A de van Dijk, que supomos estar alinhada com a de Jürgen Klopp.

Uma validação da proposta de análise qualitativa e o todo… sempre diferente da soma das partes. O exemplo do Benfica com Di María, Neres e… Rafa.

“Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do género humano. E por isso não pergunte por quem os sinos dobram; eles dobram por vós”.

(John Donne)

No passado mês de Agosto decidimos finalmente publicar uma proposta de análise qualitativa ao jogo de Futebol, que já vínhamos a desenvolver há alguns anos. Como descrito nesse momento, a mesma pode ser efectuada ao todo (equipa) ou a uma das “partes” (jogadores). Sendo qualitativa, também contemplará a relação infra-equipa e a interação com os adversários, e sendo assim, o termo “partes” acaba por se revelar desadequado. Mas não vamos por aí. No entanto, só procurando compreender essas relações e interações conseguiremos nos aproximar de uma ideia mais real de algo tão complexo como o comportamento táctico em jogo. E relembramos… não o táctico como mais um “factor” do jogo. O verdadeiro táctico enquanto supra-dimensão e que se manifesta pelos comportamentos em jogo da equipa e dos seus jogadores, emergindo da interacção da dimensão técnica, da física-energética, da psicológica-mental e das complementares.

Como exemplo abordámos os jogos que Ángel di María realizou nos jogos de preparação do Benfica. Pelos momentos do jogo chegámos a taxas de eficácia de:

  • Organização Ofensiva: 61%
  • Transição Defensiva: 58%
  • Organização Defensiva: 75%
  • Transição Ofensiva: 78%

Ampliando a escala da análise aos sub-momentos do jogo, o argentino registou as seguintes taxas de eficácia:

  • Construção: 73%
  • Criação: 44%
  • Finalização: 23%
  • Reacção à perda: 75%
  • Recuperação defensiva: 15%
  • Defesa do contra-ataque: Não foram registadas acções neste sub-momento
  • Impedir a construção: 75%
  • Impedir a criação: Não foram registadas acções neste sub-momento
  • Impedir a finalização: Não foram registadas acções neste sub-momento
  • Reacção ao ganho: 82%
  • Contra-ataque: 80%
  • Valorização da posse de bola: Não foram registadas acções neste sub-momento

No intencionalmente breve comentário à análise, procurando abstermo-nos de explicar estes números, escrevemos que “as principais qualidades do Argentino estão intactas. Quer ao nível dos recursos que evidencia, quer em Transição e Organização Ofensiva, mostrando-se ainda particularmente preparado para a Ideia de Jogo de Roger Schmidt e nomeadamente ao papel ofensivo que terá, que poderá potenciar as suas qualidades pelos corredores laterais e central. Parece-nos factual que a análise vai ao encontro do que Di María tem apresentado em competição. Como também nos parece factual que as debilidades que mostra e que têm afectado a equipa e as decisões de Roger Schmidt na escolha do onze também estejam relacionadas com a grande debilidade que apresentou: o momento de Transição Defensiva, em particular, o sub-momento de Recuperação Defensiva. Tal sub-momento apresentou uma taxa de 15% de eficácia nos jogos de treino analisados…

Se um jogador apresentar esta debilidade numa equipa, tal já se torna um problema nos momentos de Transição e Organização Defensiva, contudo, não decisivo e escamoteável na organização geral da equipa. Se em vez que um forem dois ou mesmo três jogadores com debilidades idênticas, já terão efeitos nefastos na mesma perante adversários que as explorem. David Neres, à imagem de Di María, independentemente da sua fenomenal qualidade ofensiva, apresenta os mesmos problemas em Recuperação Defensiva que o argentino. Tal também foi referido noutro artigo sobre as escolhas de Schmidt em determinado momento da época passada. Se bem que estando a jogar noutra função, podemos ainda acrescentar Rafa…

No programa Futebol Total no Canal 11 da passada Terça-Feira, numa brilhante análise, o Pedro não só chegou às mesmas conclusões como explicou tacticamente os porquês destas consequências negativas na equipa. Se uma equipa defender sistematicamente em GR+7 já se torna muito perigoso, que é o que sucede regularmente no Benfica quando João Mário ou Aursnes actuam como “Médios-Laterais”, defendendo em GR+6 torna-se negativamente decisivo contra adversários que atraiam os médios a um dos corredores (nomeadamente aos laterais) para depois explorarem os desequilíbrios criados nos outros corredores.

Se naquele momento, não nos precipitámos em conclusões e deixámos espaço para que Di María actuasse de forma diferente em competições oficiais, a realidade é que isso não aconteceu. Vamos ser sinceros… como seria expectável. Criou-se a ideia no trabalho com as equipas que “o jogo é o espelho do treino”. Se nos parece lógico o conceito, podemos acrescentar que também a competição poderá ser o espelho dos jogos de treino. Os hábitos, o entrosamento e o jogo de qualidade também se criam aí, pois caso contrário não faria sentido serem realizados. Uma vez mais… estamos perante um fenómeno complexo de extrema sensibilidade às condições iniciais. Os jogos de treino, como os treinos no período preparatório, são condições iniciais absolutamente decisivas para o que a equipa e os jogadores irão realizar semanas mais tarde em competição.

Será que mostrar estas análises, em vídeo e depois as taxas de eficácia iria ajudar jogadores como Di María e Neres a crescerem nas suas debilidades? Não temos resposta para isto pois, como o professor Silveira Ramos transmitia nas suas aulas, “cada ser humano é um universo de estudo”. Desta forma, não existindo receitas, pode ser sempre uma ferramenta e um recurso, tal como escrevemos atrás. 

“(…) este modelo também pode ser aplicado a cada jogador à luz da sua actuação individual, tendo por base exactamente as mesmas acções e lógica estrutural de análise. Isto permitirá que a equipa técnica potencie o desenvolvimento individual, ou noutro contexto, que o jogador se consciencialize dos seus erros, lacunas e qualidades, e partir daí, preferencialmente no contexto do clube, mas caso o nível de rendimento em que actua não lhe permita essa possibilidade, que recorra a auxilio de técnicos especializados tendo por objectivo o seu crescimento individual.”

Ainda sobre o todo complexo que é o jogo, a informação resultante da análise qualitativa e a análise do Pedro Bouças mostram também, uma vez mais, que o todo não é a soma das partes. O todo é sempre diferente da soma das partes. Para melhor ou para pior. Por muita qualidade individual que Di María e Neres tenham na grande maioria dos sub-momentos do jogo, as suas enormes debilidades actuais em apenas num deles provoca um “efeito borboleta” com grande potencialidade corrosiva no todo. Como foi referido, a equipa até ficará mais fraca nos momentos ofensivos porque, potencialmente, terá menos tempo a bola pois ao defender com menos jogadores, irá recuperá-la menos vezes. A excepção poderá ser uma fenomenal eficiência e eficácia nos sub-momentos de Transição Ofensiva. Deste modo, quando os dois, mais Rafa, coabitam no mesmo onze, esse todo será mesmo… potencialmente inferior à soma das partes…

“É da problemática da complexidade

a natureza do que é nela interacção,

esfacelar tal realidade

é o que promove a mono explicação.”

(Vítor Frade, 2014)

Momentos e Sub-Momentos do jogo… uma proposta

Como prometido no passado, publicamos a nossa interpretação do jogo de futebol e proposta para a sua sistematização.

Em primeiro lugar poder-se-á questionar a relevância de sistematizar o jogo de e interpretá-lo teoricamente. Apesar do próprio jogo mostrar caminhos e promover a auto-aprendizagem, potenciar essa aprendizagem com outras ferramentas, é para nós fundamental, nomeadamente no papel de treinador. Neste sentido, um modelo simples que explique os momentos do jogo e a sua ligação, garantirá uma enorme ajuda à compreensão do jogo e ao seu ensino aos jogadores.

Isto, independentemente da idade e nível de jogo em que trabalhamos, uma vez que vão surgindo diversos exemplos de alto e baixo conhecimento do jogo em todos os escalões etários e níveis competitivos. Porém, o jogador não se constitui como o único destinatário deste trabalho. Todos os que gostam do jogo, e desejam compreender um pouco mais a sua complexidade e dinâmica, acreditamos que vão encontrar nesta sistematização um caminho acessível.

Para o próprio treinador, não só permite, a partir daqui, uma organização mais complexa das suas ideias de jogo (princípios, comportamentos, acções, etc.) dentro de cada sub-momento do jogo, como também lhe permite categorizar exercícios de treino face à interpretação da sua dominância. Consequentemente, esta proposta, possibilita ainda ao treinador ou ao analista catalogar videos de acções de jogo da sua equipa ou de terceiras de forma acessível. Este tem sido um trabalho que temos desenvolvido, o qual já nos possibilitou uma biblioteca que ultrapassou o milhar de vídeos, e que entre outros objectivos, servirá para ilustrar os comportamentos de jogo defendidos no tema do nosso projecto, a publicar futuramente – Ideia de Jogo.

A sistematização do jogo de Futebol já leva uma considerável história. Desde o momento em que outras modalidades contribuíram para o desenvolvimento da teorização do jogo, destacando-se os trabalhos de Friedrich Mahlo,  Leon Teodorescu e Jean-Grancis Grehaigne, passando pelo contributo fundamental em Portugal de Carlos Queiroz e Jesualdo Ferreira, quando em 1983 apresentaram uma proposta de sistematização do jogo de Futebol, à actual visão do jogo sob quatro momentos fundamentais: Organização Ofensiva, Transição Defensiva, Organização Defensiva e Transição Ofensiva, que entretanto se generalizou.

Momentos do jogo

A nossa proposta surge, não só de uma necessidade de desconstruir os momentos de organização para que sejam mais facilmente entendidos e treinados, como principalmente explicar os momentos de transição, os quais, apesar de actualmente aceites e reconhecidos pela sua importância capital no jogo, geram no entanto, ainda muitas dúvidas e por vezes interpretações erradas.

Explicando-a concretamente, a partir dos quatro grandes momentos de jogo, criámos três sub-momentos para cada um deles. Nos momentos de Organização, sentimos que a proposta de Queiroz e Jesualdo continua a garantir resposta para as necessidade desses momentos do jogo. No entanto, necessitámos de distingui-los de forma mais objectiva, uma vez que nos fomos apercebendo de visões muito díspares do que seriam a construção, criação, finalização e em oposição, o impedir a construção, impedir a criação e impedir a finalização.

Assim, no momento de Organização Ofensiva, identificado pela cor verde, entendemos os três sub-momentos:

  1. Construção: quando ambas as equipas se encontram dentro da sua organização para atacar e defender e quando a bola se encontra fora do bloco da equipa que defende.
  2. Criação: quando a equipa que ataca consegue penetrar no bloco da equipa que defende e surge perante a última linha adversária ou a última linha e mais um médio em contenção. A excepção é quando a equipa que ataca procura um jogo mais directo, de ataque à profundidade, ou seja, de passe directo para o espaço entre a última linha de quem defende e o seu Guarda-Redes, o que acaba por se configurar como uma situação de último passe, independentemente do grau de dificuldade superior da acção. Neste sub-momento, integram-se também todas as situações de bola parada ofensivas que poderão permitir um último passe ou cruzamento e finalização. Devemos referir que compreendemos as opiniões que distinguem as situações de bola parada como um quinto momento do jogo, porém a nossa interpretação é que, independentemente do jogo estar parado ou em movimento, se uma equipa está organizada para defender essas situações e a outra para atacar, então estarão dentro da sua Organização Defensiva e Organização Ofensiva, respectivamente.
  3. Finalização: todas as acções que visam o momento final de ataque à baliza adversária, portanto, a acção individual ofensiva de remate, independentemente da superfície corporal envolvida. Aqui também se integram as situações de bola parada ofensivas que poderão permitir um remate directo à baliza. Importa ainda referir que a finalização pode até surgir quando a equipa que ataca tem pela frente todo o bloco adversário ou parte do mesmo. Contudo, se quem ataca conseguiu chegar ao remate, esses momentos de organização defensiva adversários falharam de alguma forma.

Em oposição o momento de Organização Defensiva, identificado pela cor vermelha, sub-divide-se em três sub-momentos que irão procurar garantir oposição aos anteriores comportamentos ofensivos:

  1. Impedir a construção: os momentos em que a equipa que defende procura não permitir a entrada da bola no interior do seu bloco. Os comportamentos de pressing, quer seja alto, médio ou baixo, são um bom exemplo para este sub-momento defensivo.
  2. Impedir a criação: quando a equipa que defende não consegue impedir que a bola entre no interior do seu bloco e a sua última linha é a penúltima barreira entre si e a sua baliza. Ou então as acções que visem impedir ou interceptar um passe longo e directo para o espaço entre a última linha da equipa e o seu Guarda-Redes.
  3. Impedir a finalização: quando toda a equipa, menos o Guarda-Redes, foi ultrapassada. Portanto, contrapondo ao sub-momento ofensivo de Finalização, aqui, a última barreira é o Guarda-Redes e os seus comportamentos de defesa da baliza.

Esta proposta de distinção entre os momentos de construção e criação, parece-nos altamente pertinente. Durante muito tempo apercebemo-nos que muitos autores e treinadores identificavam estes sub-momentos / fases pelo espaço do campo onde as equipas atacavam e defendiam. Essa interpretação parece-nos errada, uma vez que uma equipa pode estar em construção junto à sua área ou perto da área adversária, pois nos dois casos, perante por exemplo adversários que respectivamente defendam com o seu bloco, posicionado alto ou baixo no campo, poderá estar com todos os jogadores adversários ainda por bater. Por outro lado, uma equipa que posicione a sua última linha alta no campo, um momento de ruptura ou último passe de quem ataca pode surgir ainda no meio-campo de quem ataca. Deste modo, a correlação dos sub-momentos ofensivos e defensivos com espaços no campo está para nós desfasada da realidade que é o jogo. Então, a relação entre as duas equipas, e se quem defende ainda está usar toda a sua organização defensiva ou apenas parte da equipa, e se ao contrário, quem ataca ainda tem duas / três linhas adversárias para ultrapassar ou apenas uma, parece-nos uma visão mais aproximada da interacção e realidade dinâmica que o jogo promove, e assim um melhor caminho para distinguir esses sub-momentos ofensivos e defensivos do jogo.

Mas será nos momentos de transição que a nossa proposta pretende ir mais longe. Independentemente da interpretação dos sub-momentos / fases, da Organização Ofensiva e Defensiva, já Carlos Queiroz e Jesualdo Ferreira procuraram sistematizar essas estruturas complexas do jogo. Há cerca de 15 anos atrás, com a difusão e aceitação dos momentos de transição, surgiram então mais dois momentos do jogo para compreender. Neste âmbito tem surgido alguma confusão de conceitos, e simultaneamente sentimos a necessidade de interpretar a Transição Defensiva e a Transição Ofensiva de forma a encaixar-lhes comportamentos e acções, para posteriormente explicar a sua lógica aos jogadores e trabalhá-los pelo Modelo de Jogo que cada treinador idealiza. Neste sentido, sentimos ainda a necessidade de lhes atribuirmos uma lógica sequencial teórica, tal como sucede nos dois momentos de Organização.

Desta forma, para o momento de Transição Defensiva, para nós representado pela cor amarela, propomos os três sub-momentos:

  1. Reacção à perda da bola: os instantes, ainda no centro de jogo, imediatos à perda da bola. Os comportamentos defensivos a adoptar nessa situação. Para a maioria dos treinadores, o objectivo fundamental será não só tentar de imediato a recuperação da bola, mas não permitir ao adversário a possibilidade de contra-atacar. Portanto, impossibiltá-lo ou atrasá-lo em sair com a bola dessa zona de pressão e procurar espaços para desenvolver o contra-ataque.
  2. Recuperação defensiva: na tal lógica sequencial, se o adversário conseguiu sair da zona de pressão, independentemente dos jogadores fora do centro de jogo (primeira zona de pressão) já deverem está a fechar a equipa e a recuperar o seu posicionamento defensivo, neste sub-momento, torna-se ainda mais importante a recuperação do máximo número de jogadores, contemplados pela organização defensiva da equipa, para trás da linha da bola. Alguns poderão até estar a compensar companheiros, mas a urgência é não permitir espaço nem número vantajoso ao adversário para desenvolver situações de contra-ataque. A própria falta táctica pode ser contemplada neste sub-momento do jogo.
  3. Defesa do contra-ataque: se ambos os sub-momentos anteriores da transição defensiva falharam, então, antes das acções de defesa da baliza do Guarda-Redes, a equipa tem ainda a possibilidade de defender o contra-ataque adversário. Perante relações numéricas diferentes, poderão ser adoptados comportamentos que poderão reduzir as possibilidades de sucesso de quem ataca. Tal como, em oposição, o contra-ataque, estas são situações muito trabalhadas no Futsal, dada a quantidade de situações deste género que surgem nesse jogo. Porém, se no Futebol elas não só surgem, como são decisivas nos desfechos dos jogos, porque não devem também ser alvo de treino?

Em oposição ao momento de Transição Defensiva, surge então o momento de Transição Ofensiva, para nós representado pela cor azul, e ao qual propomos três sub-momentos:

  1. Reacção ao ganho da bola: em oposição à reacção à perda da bola, surgem neste sub-momento os comportamentos e acções de quem recuperou a bola, e a procura de sair da primeira zona de pressão adversária. Seja ela realizada por um jogador ou por mais. Se possível, alcançá-la no sentido da baliza adversária, porém, em muitos momentos, esses espaços encontram-se fechados e portanto será necessário garantir outras soluções e uma boa decisão do jogador com bola. A eficácia na reação ao ganho da bola e na saída da zona de pressão influenciará os sub-momentos seguintes da transição ofensiva, que aqui, provavelmente, já não surgem numa lógica sequencial, mas sim como alternativas de decisão.
  2. Contra-ataque: se a equipa conseguiu sair com eficácia e rapidamente da zona de pressão, poderá encontrar espaço e / ou uma relação numérica com o adversário interessante para optar pelo contra-ataque. Nesse caso, é nosso entender que deverá explorá-lo na larga maioria das situações, procurando as suas vantagens, pois parece-nos mais difícil ultrapassar uma boa organização defensiva adversária. As excepções irão surgir por influência da dimensão estratégica. Neste caso, por exemplo, quando uma equipa se encontra com uma vantagem mínima no resultado ou numa eliminatória, está a poucos minutos do final do jogo, e não lhe interessa explorar uma situação de contra-ataque, que em caso de insucesso irá, provavelmente, lhe retirar na resposta do adversário alguns jogadores da sua organização defensiva, e mais importante, porque privilegiando a posse de bola, não só poderá descansará com bola, como retirará a possibilidade de atacar ao adversário.
  3. Valorização da posse de bola: se após a saída da zona de pressão a equipa não encontrar espaço e / ou uma relação numérica interessante para atacar a baliza adversária, deverá evitar a decisão de contra-atacar numa situação desvantajosa e possivelmente perder a bola. Ao invés, deve assim garantir a sua posse, ganhando tempo para se reorganizar para atacar, procurando esse momento seguinte do jogo para criar desequilíbrios na organização adversária.

Pelas ideias apresentadas, propomos a seguinte representação gráfica dos momentos e sub-momentos do jogo:

Momentos e Sub-Momentos do jogo.

Interpretando o jogo desta forma, para nós não faz sentido catalogar uma equipa como “uma equipa de contra-ataque” ou uma “equipa de ataque organizado“. Todas as equipas têm de saber jogar em todos os momentos e sub-momentos, para que possam responder às necessidades circunstanciais que o jogo lhes vai apresentando. Contudo, partindo deste modelo, cada treinador, acreditando nas suas ideias, procurando uma adaptação à qualidade, cultura e características individuais dos jogadores com quem irá trabalhar, poderá desenvolver o jogo idealizado, de forma a responder a estes momentos e sub-momentos, o que consequentemente potenciará o seu jogo para mais ou menos tempo nalguns destes momentos e sub-momentos. Assim, procurando ir aos extremos, acreditando num jogo curto e apoiado ou longo e directo, na defesa zona ou na defesa individual, todas as ideias podem ser concebidas a partir deste modelo.

Sentimos ainda que a nossa proposta não se esgota no jogo de Futebol e que poderá ter transfer para outros desportos colectivos, nomeadamente os com características de invasão do meio-campo adversário.

Deixamos ainda um video que procura ilustrar diferentes comportamentos, identificando os momentos e sub-momentos do jogo propostos:

 

Exercício gratuito

Publicamos um novo exercício gratuito: “Impedir o último passe para diferentes objectivos“.

Desta vez trazemos uma adaptação de um exercício de um conhecido treinador português. O exercício original mostrou-se desde logo extremamente rico em comportamentos, porém, sentimos a necessidade de torná-lo mais específico a determinados objectivos e momentos de jogo.

Interpretando-lhe, dadas as suas condicionantes, uma grande propensão para o ataque à profundidade através do passe de ruptura para as costas da última linha da equipa que defende, foi nossa opção dirigi-lo principalmente para os momentos de Organização Defensiva, nomeadamente para a pressão permanente no portador da bolaposicionamento e alinhamento das linhas, concentração defensiva controlo da profundidade. Contudo, uma vez que o exercício reinicia-se com uma bola aleatória, procurando a articulação de sentido entre momentos de jogo, focamos também, para a equipa que não ganha essa primeira bola, a sua Transição Defensiva, particularmente o sub-momento de reacção à perda, no qual emergem os comportamentos de pressão imediata na bola fechar os espaços vitais à progressão adversária.

“É isto que faz a diferença. É perceber o momento em que a bola está sem pressão e está em condições de entrar na profundidade. Esse é que é o momento de controlar a profundidade. Porque antes disso tem de ser de redução da profundidade, tem de ser de ganho da bola, tem que ser de ataque à zona da bola para ganhar.”

Vítor Pereira (2016)

Acrescentamos que sendo um exercício rico em comportamentos, principalmente pela sua estrutura colectiva, é-lhe consequentemente conferido um nível de complexidade elevado, portanto será aconselhado no único dia do Morfociclo que poderá contemplar uma sessão de máxima exigência: a Quinta-Feira num ciclo competitivo de Domingo a Domingo. A este propósito, (Tamarit, 2013) esclarece que “trata-se de compreender que só existe uma sessão de treino de máxima exigência – Quinta-Feira, no Morfociclo Padrão do jogo de Domingo a Domingo, e que consequentemente deverá contemplar a aquisição num plano mais Macro. Nos outros dias chamados aquisitivos – Quarta-Feira e Sexta-Feira, dever-se-á contemplar a recuperação. Estes deverão incidir na melhoria individual, assim num plano mais Micro.”

” (…) aquilo que acontece é que a tua exigência baseia-se na concentração na perspectiva da organização e do grande princípio onde a complexidade solicitada ao jogador é muito maior como o número de comportamentos exigidos é superior. É onde tu, no fundo, procuras expressar a tua complexidade em termos de jogo. A complexidade total, digamos. É no fundo o dia onde fazes os treinos de grandes princípios.”

Rui Faria citado por (Sousa, 2007)

Organização Defensiva | Impedir a criação | ERRO | Controlo da profundidade

Num jogo fantástico, os golos, a competitividade, as diferentes incidências e a qualidade individual, que tanta atracção geram no espectador, foram o tom dominante. Porém, fica uma vez mais provado que a isto podem estar acopladas boas ideias, organização e consequentemente qualidade colectiva. Não procurando o “copo meio-cheio”, mas num jogo tão rico, as duas equipas também apresentaram debilidades. O controlo da profundidade em Organização Defensiva, foi uma delas.

 

Organização Defensiva | Impedir a criação | ERRO | Defesa individual

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