Um Real engano

“(…) o trabalho sobre a análise do jogo tem-se focado, predominantemente, no uso de descrições simples e associações entre variáveis, levando à investigação do fenómeno sem considerar os aspetos dos sistemas complexos, dinâmicos e interativos, que poderão caracterizar melhor o rendimento num jogo de futebol.”

Hugo Sarmento citado por Luís Cristóvão, 2017

Tem sido constante o ataque ao rendimento de Karim Benzema pela escassez de golos marcados do jogador Francês. O próprio Cristiano Ronaldo também tem sido alvo de criticas similares dado o menor número de golos marcados na presente época desportiva.

“Esta é uma crise sem precedentes dos habituais goleadores do Real Madrid nos últimos anos. Na mesma altura da época passada, Ronaldo e Benzema somavam 12 golos no campeonato. Em 2014/15 já tinham apontado 27 golos no mesmo número de jogos. Agora estão ao nível dos piores da Europa e longe dos melhores. Neymar e Cavani, do PSG, somam 22, enquanto Suárez e Messi, do Barcelona, já marcaram 17.”

“Ronaldo e Benzema são a pior dupla da Europa”

“Quando Ronaldo não se encontra na melhor forma é fácil perceber a má forma do Real Madrid à frente das balizas. No entanto, a seca de golos de CR7 não pode ser o único motivo que explica o mau momento pelo qual passa a equipa de Zidane. (…) Mais que Ronaldo, Benzema está a ser obliterado pelas críticas à maneira como pouco tem contribuído com golos para a equipa. O francês não está a acertar com a baliza e quando o faz, não consegue dar seguimento com boas exibições. Sendo um dos principais elementos da badalada BBC, Benzema tem apenas seis golos marcados esta temporada, o que para um avançado do Real Madrid é um número fraco. O avançado já leva 22 partidas disputadas e conta com apenas três assistências.”

“Um Real Madrid que está em crise e já não consegue disfarçar”

Porém, os que procuram explicar o menor rendimento colectivo do Real Madrid por um fragmento da realidade ignoram outros números. O facto é que o Real Madrid, colectivamente, é a quinta equipa com mais golos marcados na Europa.

Equipas mais goleadoras da Europa – 26 de Fevereiro de 2018 (SportTV, 2018)

Portanto, se os golos marcados pela equipa não são a explicação para o seu menor rendimento global, não serão com certeza os golos, nem as assistências, do ponto de vista individual. O objectivo do artigo não é procurar a explicação para o momento do Real Madrid. Pela análise ao seu jogo, é um exercício sempre interessante, mas difícil. Pior ainda se tivermos em conta a complexidade que envolve a dinâmica de uma equipa de futebol. O dia-a-dia, o treino, o plano individual, as relações internas, externas, etc. O propósito é, uma vez mais, sublinhar como o pensamento reducionista está sempre presente na forma como observamos a realidade. Se tivermos em conta a proposta por nós apresentada, o jogo de futebol acontece em 12 sub-momentos.

Momentos e Sub-Momentos do jogo.

A finalização da equipa só está presente em dois deles, assim como a “assistência”. No que toca ao que é visível no campo, não estarão possíveis explicações para o rendimento do Real Madrid nos outros 10 sub-momentos? E será que os jogadores criticados, não serão importantes noutros sub-momentos do jogo? Por se posicionarem na maior parte do tempo de jogo mais perto da baliza adversária, têm obrigatoriamente que ser os melhores marcadores da equipa?

Parece-nos clara a resposta à última questão. Depende da forma de jogar da equipa. Se a mesma proporcionar situações de finalização a esses jogadores e os mesmos falharem-nas sistematicamente, logicamente que isso é um dado negativo do ponto de vista individual. Porém se a mesma os usar como “um meio para chegar a”, então a crítica individual é absurda. Não tendo oportunidades para marcar, não poderão com certeza somar golos. Voltando ao contexto particular do Real Madrid, talvez Benzema e Ronaldo não estejam no melhor momento no que toca à sua eficácia. Porém, não estarão, mais do que nunca, a dar uma maior importância ao jogo colectivo da equipa? Pelo menos no momento ofensivo? A própria decisão, no passado fim-de-semana, de Cristiano Ronaldo ceder a marcação de uma grande penalidade a Benzema talvez reflicta isso mesmo. E não se tratou de uma assistência. Mas de uma preocupação com o outro. A tal relação interna. O próprio José Mourinho, em 2011, quando treinou o Real Madrid descrevia assim Benzema:

“Karim está a trabalhar mais do que nunca, sobretudo na fase defensiva, e é um jogador nada egoísta e que faz jogar a equipa.”

José Mourinho, 2011, citado por João Paulo Godinho, 2011

Segundo o autor (Amado, 2010), “o Futebol é tudo menos um jogo simples e um avançado tem mais para fazer em campo do que ser o elemento mais avançado de uma equipa. O Futebol, jogado como um todo, não pode estar refém de jogadores com funções específicas; uma equipa, para fazer golos, não pode estar refém do seu atleta mais adiantado. Tem de ser capaz de tornar complexo o seu jogar a ponto de ser absolutamente indiferente quem faz ou não faz os golos”. O avançado espanhol, Fernando Torres, citado por (Bouças, 2012), a propósito do seu papel na selecção espanhola, descreve que “é preciso ter paciência. É complicado jogar. Deves fixar o central, é um papel secundário, porém é o melhor para a equipa. É um luxo jogar nesta selecção. Aqui pode acontecer que te contenhas mais na partida e não faças golos, mas é o melhor para a equipa. Há dias que pensas: “Que partida fiz! Oxalá jogue assim sempre.” E ouves críticas por todos os lados. E no dia em que estás lento, mal e erras, mas marcas dois golos, aplaudem-te. Aprendi a viver com isto.” Pedro Bouças sustenta que estamos numa era em que perceber o futebol é muito mais complexo que o que na realidade parece. Há onze jogadores, e todos devem ser responsáveis por tudo dentro do campo. Uns dias ganhas notoriedade, noutros parece que o jogo te passa ao lado. Há é que decidir bem a cada instante. Se assim for, a equipa estará sempre mais próxima do sucesso”.

Na sua obra, Edgar Morin, explica que “a palavra compreender vem do latim, “compreendere”, que quer dizer: colocar junto todos os elementos de explicação, ou seja, não ter somente um elemento de explicação, mas diversos. Mas a compreensão humana vai além disso, porque, na realidade, ela comporta uma parte de empatia e identificação. O que faz com que se compreenda alguém que chora, por exemplo, não é analisar as lágrimas no microscópio, mas saber o significado da dor, da emoção. Por isso, é preciso compreender a compaixão, que significa sofrer junto. É isto que permite a verdadeira comunicação humana. A grande inimiga da compreensão é a falta de preocupação em ensiná-la. Na realidade, isto está-se a agravar, já que o individualismo ganha um espaço cada vez maior. Estamos a viver numa sociedade individualista, que favorece o sentido de responsabilidade individual, que desenvolve o egocentrismo, o egoísmo e que, consequentemente, alimenta a autojustificação e a rejeição ao próximo. A redução do outro, a visão unilateral e a falta de percepção sobre a complexidade humana são os grandes empecilhos da compreensão. Outro aspecto da incompreensão é a indiferença. (…) Por isso, é importante este quarto ponto: compreender não só os outros como a si mesmo, a necessidade de se auto-examinar, de analisar a autojustificação, pois o mundo está cada vez mais devastado pela incompreensão, que é o câncer do relacionamento entre os seres humanos.”

“Mourinho dizia-me: Tranquilo, não precisas de marcar golos para ser o homem do jogo.”

Didier Drogba citado por (Bouças, 2013)

“Pergunto-me por exemplo, quantos não serão os “dados” existentes à cerca da pergunta seguinte: Quais são, os elementos estruturais de todo o jogo de futebol? A estrutura de acção não é mecânica, no entanto, o saber compartimentado do “nosso” futebol segregou já demasiadas previsões especializadas. Deve continuar o “futebol”, a deixar-se cegar pelo erudito reducionismo? Para nós, a formulação de MODELOS DE INTELIGIBILIDADE afastados da FRAGMENTARIDADE DOMINANTE, e ajustados à natureza complexa do objecto empírico, parece-nos de premente necessidade.”

Vítor Frade, 1990, no seu projecto de tese de doutoramento, em 1990

“Sem equipa

nenhum jogador cresce,

mas só boa equipa fica

se ser bom jogador acontece.”

(Frade, 2014)

Cultura de jogo III. “Atrás não se brinca”.

“Atrás não se brinca”. Um dos tantos lugares comuns que fazem parte da cultura de jogo tradicional. Mas na realidade, brinca-se. Brinca-se por todo o campo, porque o futebol, é antes de tudo o resto… prazer… divertimento. A expressão pode no entanto querer identificar zonas, sectores, funções, nas quais os “riscos” das consequências da perda da bola, podem ser mais elevados. Contudo, à imagem da saída curta do Guarda-Redes, tudo depende do contexto. Das ideias… ou qualidade colectiva, da qualidade individual e dos adversários. Assim, uma vez mais não há uma receita. Existem diferentes decisões, perante diferentes contextos.

Johan Cruyff, no momento mais importante até à data do seu país no Futebol – a final do campeonato do Mundo de 1974 na Alemanha, decidiu, logo após o pontapé de saída da sua equipa, na primeira posse de bola que a sua equipa dispunha, enquanto “último homem” da sua equipa, driblar e penetrar no bloco adversário até à grande-área, acabando por sofrer grande penalidade. O penálti, convertido por Neeskens, viria a garantir o primeiro golo do encontro para a Holanda. Cruyff assim o decidiu dada a sua qualidade individual e a mobilidade que a sua equipa protagonizava, que arrastou as marcações individuais alemãs. Decidiu-o em função do contexto, ignorando os preconceitos vigentes, e influenciado pela sua conhecida irreverência.

Quase 50 anos depois, no mesmo país, Frenkie de Jong, aos 20 anos, provavelmente influenciado pelas mesmas ideias de jogo que ainda pairam no Ajax de Amesterdão, apresenta a mesma cultura de jogo. Sem receio, conduz, fixa, dribla e penetra sistematicamente a primeira linha de pressão adversária. Derruba, novamente, preconceitos enraizados na nossa cultura.

https://www.facebook.com/SaberSobreOSaberTreinar/videos/1958054910890433/

Segundo video realizado por ty.

O website (Tactic Zone, 2013), cita Josep Guardiola no tempo de treinador do F. C. de Barcelona, que aconselha:gastem dinheiro com os defesas, sobretudo com os centrais!” e justifica: “pode parecer paradoxal, uma equipa com um futebol ofensivo, de posse, de muitos golos e tem que investir em defesas? Claro, é onde tudo começa. Se defesas (e Guarda-Redes dizemos nós) não conseguem construir, todo este conceito se complica e o jogo já não será o mesmo. Nas minhas ideias o Guarda-Redes e defesas centrais são os primeiros avançados. E um central ter a capacidade de construir não é ter boa capacidade técnica. Tem que ter um grande entendimento do jogo ofensivo e ser muito bom na capacidade de decisão. Por isso, é tão difícil encontrar centrais para este tipo de jogo. Por isso, o Barcelona opta muitas vezes por colocar médios na posição de defesa central”.

O autor (Bouças, 2013), sustenta que “ter jogadores capazes de desequilibrar ofensivamente logo desde trás no primeiro momento da construção será cada vez mais decisivo. Feliz de quem pode contar com defesas centrais para desbloquear situações e adversários.  Em equipas que passem demasiado tempo no momento de organização ofensiva, defesas centrais com tamanha qualidade ofensiva são tão importantes para se chegar ao golo, quanto os avançados. É que o jogo começa demasiadas vezes desde trás, e passa garantidamente, mais vezes nos pés dos centrais que nos de qualquer outro jogador”.

“Johan Cruyff dizia: o mais importante no Futebol é que os melhores jogadores sejam os defesas. Se estás com a bola, consegues jogar; se não, não fazes nada. Johan diz que a bola equilibra uma equipa. Se perde a bola, a equipa se desequilibra; se perde pouco, consegue manter o equilíbrio.”

(Gonzalez, 2012)

“Cada ser humano é um universo de estudo”. O “estranho” caso de Mafalda Mariano.

“Para mim, a expressão “todos os jogadores são iguais” é a maior mentira no desporto. Nem todos são iguais. Nem todos têm de ser tratados de forma igual. Com o mesmo respeito sim… (…) Descobrir cada um é o mais fascinante na nossa função…”

Pep Guardiola citado por (Santos L. , 2013)

Fruto, uma vez mais, do pensamento analítico e cartesiano que se enraizou na nossa cultura e raciocínio, o ser humano continua a ser seriado e catalogado como se de uma peça de mobiliário se tratasse. Não nos estamos a referir à procura de padrões comportamentais. Referimo-nos a identificação de características muito genéricas como a idade, o sexo, a morfologia ou mesmo a fisiologia, e a partir daí colocar adultos e crianças em categorias mais ou menos estanques. No futebol de formação é comum depararmo-nos, com opiniões de responsáveis técnicos, de que por exemplo, “miúdos com determinada idade devem jogar futebol de X” ou “as raparigas devem jogar com raparigas e rapazes com rapazes”. Ignora-se porém, a sua complexidade, e que cada ser humano é possuidor de uma individualidade, passe a redundância… singular, com um particular crescimento e traços exclusivos. Como Yuri Verkhoshansky, citado por (Silveira Ramos, 2004) defendeu, “cada ser humano é um universo de estudo”. Também (Barreiros, 2016) sustenta que “o desenvolvimento é um conceito de raiz biológica que procura exprimir o conjunto dos processos de transformação de um organismo ao longo da sua vida. No caso do desenvolvimento humano, este processo inclui inevitavelmente o conjunto das transformações da vida psíquica e os efeitos de interações sociais constantes. O desenvolvimento humano é, por natureza, biológico, psicológico e social, o que significa também que estas dimensões do desenvolvimento interagem, produzindo uma notável complexidade e individualidade“. Assim sendo, cada indivíduo apresenta as suas necessidades particulares.

Mafalda Mariana, aos 12 anos, teima em provar que o pensamento tradicional está profundamente errado. Há quatro anos a jogar em competições federadas com rapazes, inclusive dois desses anos contra uma maioria de adversários de idade superior. Começou, aos 8 anos, a jogar Futebol de 7, portanto, numa complexidade de jogo acima da regulamentarmente definida para a sua idade, o Futebol de 5. Na presente época deu um semelhante “salto” para o Futebol de 9. Durante este período formou equipa com outros miúdos de enorme talento, que sempre lhe reconheceram o dela, tratando-a como igual. Por vontade e decisão própria tem recusado passar para as competições femininas em clubes de maior dimensão, por sentir que o actual contexto onde treina e compete, é o mais adequado e desafiante à sua qualidade. Naturalmente, também pela amizade que construiu com os companheiros, aspecto que um regulamento competitivo que separa por completo, rapazes de raparigas no futebol de formação a determinado momento, ignora em absoluto.

“Como te sentes a jogar numa equipa de rapazes contra rapazes?

Sinto-me bem, pois os meus colegas receberam e tratam-me como igual. A maioria dos meus adversários respeita-me.”

Mafalda Mariano, 2017 em entrevista ao website www.futebolfemininoportugal.com

Ignora-se também que existem aspectos ainda mais decisivos para a evolução da criança do que a própria complexidade do modelo competitivo. Uma criança, numa equipa de Futebol de 7, à qual seja imposto jogo directo e marcação individual, não terá com certeza mais propensão à sua relação com bola, com o centro de jogo e desafio à inteligência táctica, que o jogo curto e apoiado e a Defesa Zonal potenciam, mesmo quando solicitados num contexto competitivo de Futebol de 11. Neste sentido, (Fábio Ferreira, 2013), descreve que “de acordo com Pacheco (2001), a competição em idades mais jovens depende da qualidade da sua prática e da intervenção por parte dos treinadores, dos dirigentes e dos pais que enquadram a criança na actividade desportiva. Por isso, é extremamente importante que se respeite a individualidade biológica, cognitiva e emocional da criança (Fernandes, 2004). Assim sendo, é fundamental que no futebol de formação as competições estejam ao serviço dos jovens futebolistas, estando adequadas às características das crianças e do seu nível de desenvolvimento (Pacheco, 2001) tornando-se uma ferramenta de auxílio para que os objetivos de formação sejam atingidos. Pacheco (2001) refere ainda que o problema induzido pela competição nos escalões mais jovens são as distorções impostas pelos adultos”.

Em entrevista a (Xavier Tamarit, 2013), o professor Vítor Frade questiona: “você já viu ou acha que o gajo que vai tocar piano, primeiro vai andar a correr à volta do piano ou fazer elevações ou flexões?! Não. Os putos vão, se tiverem dois, «olha, joga tu ali e eu ali», se tiverem onze, «seis para aqui e cinco para acolá». É isso que eles fazem, é Futebol com bola!” No entanto, condicionados pelas ideias, preconceitos e receios dos adultos, o autor (Carlos Neto, 2017) deixa a pertinente questão: “qual é o nível de participação das crianças na sua formação desportiva?” E responde. É tudo imposto. Tal e qual como nas escolas, onde têm de estar sentadas, quietas e a ouvir professores cansados, velhos e chatos. O que é que elas gostariam de fazer no treino? Algumas vez os treinadores ouvem as crianças? Os pais ouvem os próprios filhos? A formação de crianças e jovens em Portugal é de uma visão autocrática e isto é mau, porque as crianças do século XXI mereciam outro respeito e um processo mais democrático. Haveria mais participação, um melhor ambiente, mais entreajuda… como acontece nos países que já o fazem de forma mais adequada, como o Canadá e alguns países nórdicos. As crianças não são atletas em miniatura. Eu posso fazer um campeão à martelada. Se repetir exaustivamente, eu chego lá. Só que ele não vai ser criativo, não se vai adaptar, vai morrer cedo. Se eu fizer um atleta inteligente, dinâmico, com capacidade adaptativa, esse é que vai ser um bom atleta, e quero na formação um modelo que forme estes atletas”.

Por outro lado, autor (Esteves, 2010), partilha a visão de Vítor Frade ao distinguir especificidade precoce e especialização precoce. Segundo Frade as melhores equipas na formação, treinam sob a especificidade precoce, evitando os problemas causados pela especialização precoce. Para Esteves “quando treino em especificidade precoce, desde cedo, com diferentes graus de complexidade numa progressão complexa de muitos anos, consigo um jogador muito mais evoluído, pelo simples factor confiança. A repetição constante leva a sistematização, ao hábito e isso com o passar dos anos leva à «expertise». As grandes mentes, em diferentes sectores da história da humanidade, dificilmente iniciaram as suas trajectórias em fase adulta. Grandes lutadores iniciam as suas lutas muito cedo, entre 6 a 8 anos, grandes pianistas idem, grandes jogadores iniciam suas trajectórias no Futebol de rua, na escola, nos campos de praça, logo aos 5, 6 anos”. Por outro lado o autor defende que a “especialização precoce é a maior negação do princípio da individualidade biológica. Não é possível aceitar que todos os seres humanos são diferentes e que a qualquer momento pode surgir um novo Pelé ou Maradona se logo ao se iniciar um treino podamos todas as possibilidades de gerar este comportamento, criando uma espécie de fábrica de jogadores, fazendo tudo igual, sendo que a grande graça está em quem faz o diferente”. 

Neste sentido, o treinador português (Carlos Carvalhal, 2010) destaca a “importância de desenvolver os sentidos e de experimentar as sensações em contacto com o meio (perspectiva ecológica) de forma a testarmos todas as nossas capacidades fazendo do ensaio / erro uma autodescoberta. A individualidade é assim um conceito obrigatoriamente agregada à noção de criatividade: o que vivencio enquanto jogador potencia as minhas qualidades, exponenciando-as; faz com que codifique de determinada forma o significado do que vivi, determinando também a conexão que farei com episódios semelhantes no futuro”. O professor (Francisco Silveira Ramos, 2013), conclui que “o futebol é um jogo coletivo, mas é feito de individualidades e temos até que fomentar essas individualidades”. O autor sustenta ainda que é necessário “que o trabalho para eles seja rico e criativo”. Rico e criativo, implica experimentar diferentes contextos e desafios, e garantir uma maior propensão do mais favorável ao estágio de desenvolvimento individual e desejos de cada criança. No fundo, o caminho trilhado autonomamente por cada criança no Futebol de Rua, em regime de auto-descoberta e longe da intervenção do adulto.

“O possível

é o futuro do impossível

o padrão de problemas

não se acorrenta por esquemas,

nenhuma impossibilidade

é impossível…

Não tendo na robotização a verdade

a complexidade é exequível.”

(Frade, 2014)