E quando a inferioridade numérica não é obstáculo

Escrevíamos no artigo anterior, sobre a má resolução de uma situação de contra-ataque em clara superioridade numérica, que se constituía “como um exemplo de que por vezes, uma maior superioridade numérica pode não tornar a situação mais fácil de resolver. Porém não pelo número de jogadores em si, que por si só é um dado extremamente redutor, mas pelas relações que os jogadores estabelecem – a qualidade colectiva, e restante configuração do jogo.” Referíamos ainda que “isto sucede em contextos de baixo conhecimento do jogo e consequentemente baixa qualidade individual e colectiva“.

Hoje trazemos uma situação oposta. Nova situação de contra-ataque (o vídeo não mostra mas é de facto antecedida de recuperação da bola), o mesmo número de atacantes, mas agora em inferioridade numérica de 3×4+GR. É certo que os defensores não apresentaram boas ideias para defender a situação e isso até poderia ser tema de análise, mas no contexto criado, dado o tema que abordamos, os atacantes mostraram a eficiência desejada. Usamos o plural porque no final a situação foi bem resolvida pelos três, se bem que em determinado momento, Kevin de Bruyne foi decisivo. É que até certa altura, Iheanacho, que parece-nos não se aperceber da presença de David Silva no mesmo corredor, comete o mesmo erro que trouxemos no artigo anterior. No entanto, de Bruyne dá uma ajuda, indicando-lhe o que fazer, abrindo a oportunidade para uma melhor resolução da situação.

Kevin de Bruyne demonstrou, uma vez mais, leitura e conhecimento do jogo, mostrou, qualidade individual. E neste caso, a mesma contribuiu inclusive para que a qualidade colectiva também crescesse. Nos festejos isso parece ser reconhecido por David Silva e Yaya Touré…

Quando a superioridade numérica não ajuda

A situação surge no momento de Transição Ofensiva, no nosso Modelo no sub-momento de Contra-Ataque, situação específica de contra-ataque em 3×1+GR. A questão que se levanta coloca-se na superioridade numérica clara do ataque, que até parece atrapalhar os jogadores em causa na resolução da situação. Lembra-nos o futebol de rua ou o jogo informal, quando uma das equipas tem superioridade numérica, mas não beneficia com isso e até parece sentir que a mesma a prejudica. Isto sucede em contextos de baixo conhecimento do jogo e consequentemente baixa qualidade individual e colectiva, tornando a gestão da maior complexidade, resultante do número elevado de jogadores e falta de espaço, um problema.

Constitui-se então como um exemplo de que por vezes, uma maior superioridade numérica pode não tornar a situação mais fácil de resolver. Porém não pelo número de jogadores em si, que por si só é um dado extremamente redutor, mas pelas relações que os jogadores estabelecem – a qualidade colectiva, e restante configuração do jogo. Como temos insistido, se o Futebol é extremamente complexo, como tal a sua reprodutibilidade teórica será sempre falível, nem que seja pelo mais ínfimo detalhe. Cabe a cada um de nós compreender isso na forma como interpretamos o jogo, ou como interpretamos representações teóricas do mesmo.

Neste caso, um dos atacantes sem bola deveria ter garantido opção à esquerda do companheiro com bola, sugerindo este a conduzir para o corredor central e fixar a o defensor. Deste modo, o portador ficaria com duas soluções de passe, em vez da única que dispôs aqui, dada a presença dos dois companheiros no mesmo espaço, à sua direita.

Exercício gratuito

Publicamos mais um exercício gratuito: Duas situações de criação sobre linhas de finalização.

Desta vez trazemos um exercício colectivo, no nosso entender, principalmente direccionado para o sub-momento ofensivo de criação e para o sub-momento da transição defensiva: a reacção à perda da bola. No entanto, progredindo o exercício e solicitando que mais defensores joguem no seu meio-campo em organização defensiva, o exercício passará a dar foco também a construção. Por outro lado, com uma equipa técnica alargada, numa visão mais complexa do trabalho, poderemos também dar foco ao “contra-exercício” e portanto aos outros momentos: a organização defensiva e transição ofensiva.

Na forma como apresentamos cada exercício no website, não publicamos a classificação que atribuímos aos mesmos. Esta classificação tem para nós em conta critérios que consideramos decisivos, como são a aproximação que o exercício garante à realidade competitiva e a propensão que dá aos objectivos propostos. Isto para dizer que este exercício acaba por não garantir uma grande aproximação no momento de organização ofensiva, uma vez que lhe estão retirados alguns momentos de criação e a finalização. Um elemento fundamental do jogo não está presente: a baliza. Contudo, se é pretendido um foco maior e maior propensão a acções de criação antes da grande-área adversária, pode-se constituir como parte de um caminho. Simultaneamente permite espaço para o trabalho específico dos Guarda-Redes nas grandes-áreas, ou para outras estações de exercícios, como por exemplo de finalização de cruzamentos ou de marcação de pontapés de canto. Assim, uma vez mais emerge como decisivo no trabalho a determinação de um rumo… para nós o Modelo de Jogo Idealizado e os objectivos traçados para cada sessão. Depois, o conhecimento do jogo, a liderança, a criatividade do trabalho, entre outros aspectos, para garantirem uma máxima qualidade.